A triste história da ideia errada

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A triste história da ideia errada

Ela nunca nasce ruim na cabeça de quem a cria, se torna errada na medida em que vai encontrando seu lugar na realidade


4 de novembro de 2015 - 9h01

*Mauro Cavalletti

O mundo está cheio de ideias erradas, todos sabemos. Das guerras às ciclovias, não nos faltam exemplos. O que varia muito é o ponto de vista de quem as avalia e a mentalidade de quem as cria. Eu, por exemplo, não uso, mas adoro as ciclovias. As ideias nunca nascem ruins nas cabeças de quem as criam; elas se tornam erradas na medida em que vão encontrando seu lugar na realidade.

Nunca ninguém dirá: “Veja que ideia horrível eu tive hoje!” Elas nascem perfeitas, maravilhosas. É quando ganham vida, quando entram em uso, em verificação, que a coisa pega. De certa maneira, o fracasso de uma ideia tem tudo a ver com o seu sucesso — quanto mais conhecida, mais expostas estão suas falhas. Do mesmo jeito, algumas ideias parecem nascer erradas e vão ganhando força na medida em que nos aproximamos delas e aceitamos pensar diferente. Por isso não deixamos de criar sem parar.

Como bem já disse o designer canadense Bruce Mau, a vida não acontece simplesmente para nós, não a recebemos passivamente, nós a produzimos. Desenhamos a vida como ela deve ser. E como não conseguimos parar de criar, vamos tentando alcançar notoriedade por nossas ideias.

Há quem defenda que as ideias, certas ou erradas, têm vida própria e vão se reproduzindo, se alimentando, competindo e prevalecendo sobre outras ideias. Evoluem com alguma autonomia em relação aos humanos, portadores que as transportam e as difundem. Na origem das memes, antes que elas virassem sinônimo das imagens mais engraçadas e virais da internet, cientistas as definiam como as menores unidades de uma ideia, um relativo cultural aos genes que respondia igualmente a um processo de seleção natural. Quer dizer que elas nascem sozinhas? Eu não sou o autor das minhas ideias? Um pensamento perturbador para quem vive numa indústria criativa, como nós. O escritor beat William Burroughs, um dos maiores do século passado, disse há muito tempo que a linguagem é um vírus que veio do espaço. Definição fantástica por um cara que escrevia e falava coisas incríveis compulsivamente.

Também há quem defenda que agrupamentos dessas memes podem se tornar tão poderosos e significativos que têm a capacidade de mudar paradigmas — os sistemas de normas pelos quais uma cultura opera. Embates da luta pela evolução, a sobrevivência do mais adaptado em escala. No paradigma de um mundo mais conectado que estamos vivendo, ideias erradas que antes funcionavam em sistemas controlados, agora escapam para o mundo e ganham novo significado. Ganham notoriedade de um jeito imprevisível. Um ambiente interessante para o qual temos de nos adaptar. Enquanto isso, ou cada vez mais, continuamos responsáveis pelas nossas ideias na mesma medida em que lucramos com elas.

Com tudo isso, como saber se estamos diante de uma grande ideia errada? O genial Steve Jobs entregou um truque perfeito no seu famoso discurso em Stanford — para saber, só olhando de trás para frente. Avaliando uma ideia do final para o principio, tudo faz sentido. Como filtrar lá no começo de tudo, quando quase nada faz sentido e toda ideia parece perfeita, ele não conta. Jobs era dono de uma intuição fantástica e comprou brigas homéricas em sua carreira.

E aí preciso contar que assisti a Jurassic Park com as crianças, sonhei com dinossauros. Vi um tiranossauro rex reinando em uma vasta região, devorando ferozmente seus vizinhos herbívoros com prazer ancestral. Nada podia com ele na satisfação de seus instintos. Estava no topo da cadeia alimentar, tinha sua vida de predador garantida. De repente, surgiram hordas de velociraptors vorazes com a ideia errada de atacar o gigante em bando. Embora muito menores, eram mais ágeis e muito mais numerosos, iniciando uma batalha sangrenta. Meu sonho tinha efeitos especiais de grande violência gráfica, que eu assistia do sofá. No ápice da batalha, a coisa estava feia para todo mundo, eram rugidos e destroços demais e eu já não estava gostando tanto assim do que via. Então caiu um meteoro e acabou a diversão de todo mundo. Para sempre. Acordei com fome, mas meu café da manhã foi vegetariano.

*Mauro Cavalletti é Head of creative shop do Facebook e escreveu na edição 1684 de Meio & Mensagem, veiculada dia 2 de novembro de 2015.

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