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?Isso nunca vai acontecer comigo?

Opinião: Cada marca tem sua vocação e cada profissional também. O que devemos evitar é o que alguns chamam de soberba e outros de miopia


8 de abril de 2015 - 11h48

(*) Por Eduardo Tracanella

Outro dia me peguei pensando na minha filha Maria. Não que isso seja novidade. Eu, vira e mexe, estou pensando nela. Mas, dessa vez, me peguei pensando em como ela, no auge dos seus dois anos e três meses, já tem tanta história para contar. São muitas mudanças. Do conforto da barriga da Lú, até hoje, muita coisa mudou na vida dela. Só nos últimos meses, entrou na escola, tirou a fralda e, recentemente, corajosamente prometeu dar seu arsenal de chupetas para o coelhinho da Páscoa.

No começo, confesso, isso tudo me dava um tremendo aperto no coração. Mas ela me ensina, dia após dia, que está pronta. Que gosta, se sente desafiada e vibra a cada conquista. Nasceu pronta para mudar. Aliás, todos nós. Se tem algo que faz parte da nossa vida são as mudanças. As inevitáveis, as evitáveis, as improváveis. As que tornam as coisas piores ou melhores. Das para sempre ou temporárias. Mudança faz parte da nossa natureza. E como lidar com ela é o que faz a diferença.

Nós, que estamos do outro lado do balcão, cuidando das marcas, temos a escolha: ignorar, seguir ou ser a mudança. E aqui, não tem certo nem errado. Cada marca tem sua vocação e cada profissional também. O que devemos evitar é o que alguns chamam de soberba e outros de miopia. O mundo está mudando muito e muito rápido. As pessoas também. E ponto. O nunca vai acontecer comigo virou retórica de insucesso.

Cerca de 90% dos dados de hoje foram criados apenas nos dois últimos anos. 10% de todas as fotos do mundo foram tiradas nos últimos 45 dias. Hoje, 16 bilhões de devices estão conectados à internet por wi-fi. Para 80% dos millennials, ver o smartphone é a primeira coisa a se fazer pela manhã. E 33% deles acreditam que, em cinco anos, não vão precisar de um banco.

E o desafio aqui não é tão simples. A meu ver, não se trata de um exercício de digitalização de tudo e de todos. Mas sim, de se pensar de forma digital, mesmo que se atue de forma analógica.

A tecnologia não é nada sem as pessoas. A questão não está mais na plataforma, no on ou off-line. Isso está superado. O desafio está em se tornar relevante em nossa cultura popular, que se recria cada vez mais rápido. O álbum novo da Beyoncé envelhece em um mês. As campanhas publicitárias demoram tanto tempo entre a concepção criativa e o ir pra rua, que nascem velhas. Produzir este ano para veicular ano que vem? Esquece.

Construir uma comunicação eficiente daqui para frente significa também entender que as marcas disputam espaço com os memes e com as conversas que rodam os grupos de WhatsApp. E, nesse contexto, bendita a marca que virar bordão. Que virar meme. Que souber conversar e não se levar tão a sério. Que não calibra a história ruim na produção cara.

Nos dias de hoje, ser uma marca com verba astronômica, que investe muito e tem a seu favor um enorme arsenal de mídia, não é garantia de visibilidade. Pelo contrário. Quem começa a fazer a diferença são marcas menores, aquelas de pequeno bolso, que realmente inovam porque a inovação é o único caminho para existirem. Inovar ou sumir.

E se tudo isso fizer mesmo sentido, como inovar sem mudar? Dá para construir esse novo ciclo fazendo tudo como sempre foi feito? A partir de um modelo de pensamento e de negócio baseado nas mesmas premissas? Acredite, camarão que dorme, a onda leva. E não é uma onda, é um tsunami.

Alguns paradigmas, até mesmo clichês da velha propaganda, vão cair por terra. Entender do negócio do cliente é premissa. Entender sobre publicidade também. Precisamos de pessoas que entendam sobre esse novo jogo, sobre o mundo, sobre as pessoas. Foi-se o tempo onde se media empenho em horas. Onde morar na empresa era sinal de que as coisas dariam certo. Precisamos de pessoas que transformem hora-extra em hora útil, repertório em oxigênio.

Tudo vai mudar mesmo. Está mudando. Vai se transformar. É fato. É o ciclo natural da vida. E, nesse turbilhão de conceitos, de previsões, de neologismos, temos uma possibilidade única de nos reconectar com a essência da nossa profissão. Porque, de tudo, uma coisa nunca foi tão importante e fundamental como nos dias de hoje: a boa ideia.

Bem-aventurado aquele que perceber a tempo que a zona de conforto está desconfortável. Fico aqui pensando no diálogo entre os dinossauros, momentos antes daqueles ditos asteroides colidirem com a terra:

— “É com a gente?”
— “Não, só estão de passagem”
— “Isso nunca vai acontecer com a gente”.

Eduardo Tracanella é superintendente de marketing institucional do Itaú-Unibanco

Esse artigo foi publicado originalmente na edição 1654, de 6 de abril de 2015, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets de Meio & Mensagem. Nos tablets, para acessar a edição, basta baixar o aplicativo nos sistemas iOS ou Android.

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