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Letícia Guedes, Vagner Soares, a capa histórica do Meio & Mensagem e o papel das lideranças


5 de setembro de 2017 - 11h49

Aqui no Brasil, temos muito orgulho da nossa miscigenação e nos autoentitulamos uma democracia racial, mas, em alguns momentos, penso que talvez acreditemos que a função primordial da miscigenação seja nos deixar mais brancos. Minha avó pensava assim por exemplo. Ela acreditava que embranquecer silenciava a dor.

Uma miscigenação que embranquece ajudaria a explicar por que não estranhamos, nem nos sentimos menos miscigenados, ao nos deparar com a quase inexistência de pessoas negras na liderança das empresas, nos grupos e encontros de mulheres executivas, no empreendedorismo, nos maiores anunciantes, nas maiores plataformas de tecnologia do País, no palco dos eventos ou nas listas de pessoas mais inovadoras, influentes, revolucionárias ou agitadoras.

Uma boa parte das pessoas que eu conheço acha natural quase não ver pretos nos lugares onde trabalham, estudam ou se divertem e, quase sempre, percebem quando eles estão: “Olha! Você viu? O cara que vai falar é preto”. Em 22 de junho de 2015, o El Pais publicou o artigo “Mãe, onde dormem as pessoas marrons?” Nele, a jornalista Eliane Brum conta um episódio onde uma amiga, moradora de um condomínio fechado em São Paulo, “ficou sem resposta diante de duas perguntas do filho pequeno: ‘Mãe, por que ela é marrom?,’ o menino perguntou, referindo-se à empregada. E, logo em seguida: ‘Onde dormem as pessoas marrons?’”, ele queria saber para onde iam as pessoas que deixavam a sua casa, a casa dos amigos e os muros do condomínio no final do dia.

Não assumir a existência do racismo impede que ele seja enfrentado e nos torna cúmplices e corresponsáveis por todas as suas consequências.

Em uma edição histórica, o Meio & Mensagem de 21 de agosto assumiu a existência do racismo no nosso mercado e falou sobre a ausência de negros em funções estratégicas no marketing e na publicidade. É importante dizer que precisamos de mais capas; mais executivos negros expondo seus pontos de vista e assinando artigos; mais jornalistas e repórteres negros assinando matérias e mais exemplos de pessoas e empresas fazendo alguma coisa para mudar a realidade. Precisamos de tudo isso continuamente até que a dissonância causada pelo encontro de pessoas que se consideram inteligentes, bem informadas e modernas com a consciência de que elas também são racistas pare de ser resolvida com a manutenção do status quo e com a apatia.

Não é só que precisamos mudar a forma como temos agido, precisamos fazer isso rápido. Por não pensar muito, apenas por repetirmos modelos, todos nós temos sido cúmplices de um sistema excludente, que não estimula a diversidade. Precisamos começar a mudar isso com programas abrangentes. No Twitter, por exemplo, Francine Mazzafero, head of Talent Latam, eliminou a exigência de inglês e abriu a restrita lista de faculdades (aquelas que todos sabemos quais são) comumente usada para recrutar trainees. O objetivo é abrir espaço para profissionais formados em um maior número de faculdades e que nem sempre tiveram dinheiro ou oportunidade de aprender outro idioma. O Twitter não está só em busca de talentos, está em busca do resultado positivo que o encontro de diferentes origens, vivências, crenças, formações e histórias pode gerar.

Na mesma semana em que o Meio & Mensagem publicou a reportagem de capa sobre a questão racial, circulou o keynote Dear Publicidade People, onde dois jovens publicitários negros, Letícia Guedes, analista de mídia, e Vagner Soares, assistente de arte, ambos da Artplan, pedem respeito, assumem seu lugar de fala e perguntam: por que ninguém está fazendo o que precisa ser feito? O keynote está disponível no slideshare para quem quiser aprender um pouco ou para quem tiver a resposta.

É verdade. Demorou para alguém falar sobre esse assunto, o que é bem difícil de entender por um lado. Mas agora é hora de pensar apenas que o dia chegou e que isso ter acontecido não vai mudar nada se o assunto não virar pauta nas agências, nos anunciantes, nas plataformas tecnológicas, nas associações, nos grupos de mulheres executivas, na organização dos eventos, nos grupos de empreendedores.

Estamos aumentando nossa capacidade de ver e criamos tecnologias que nos ajudam a perceber e explorar mais profundamente mais camadas. É fato que isso também significa mais fricção e, potencialmente, mais confrontos, mais resistências, mais insegurança e menos disposição à mudança. Não tenha medo. Nunca fomos tão desafiados a expandir nossa percepção, nossa consciência, nosso conhecimento e não tem como isso ser ruim mesmo que muitas pessoas façam algo ruim com isso.

A não ser que não estejamos dispostos a aprender, acredite, podemos ajudar a construir uma nova episteme, um novo paradigma sobre o qual novos saberes serão estruturados. As pessoas que lideram o mundo não têm o poder de influenciar isso?

Então, nós somos os líderes.

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