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Opinião

Keep it simple

Parece óbvio, mas a complexidade tem sido uma característica danosa, cara e luxuosa em muitas das nossas atividades


23 de abril de 2018 - 10h04

Soichiro Honda era mais um pequeno empresário no Japão da década de 1940. Produzia anéis, recondicionava motores. Quando a guerra acabou, Soichiro se viu em um país semidestruído, empobrecido e com medo de seu futuro. Os japoneses precisavam de transporte, mas os preços dos automóveis, o racionamento de combustíveis e os débitos de guerra faziam da mobilidade um desafio. A primeira ideia de Soichiro foi lançar uma motocicleta. Mas não havia tempo: desenhar, desenvolver, testar, montar rede para uma indústria de motos era tarefa de maturação mais longa. O Japão não podia esperar, e o espírito inquieto de Soichiro também não.

Foi nesse momento que o empresário teve uma visão que mudou várias histórias. No Japão do pós-guerra, poucos tinham recursos para comprar um carro ou uma moto importada, mas todas as famílias tinham ao menos uma bicicleta em casa. Sua empresa então desenvolveu o Cub, um pequeno motor de baixa cilindragem, com um pequeno tanque de combustível e um sistema de transmissão muito simples, que qualquer pessoa podia acoplar em sua bicicleta e transformá-la em uma protomotocicleta. Soichiro testou na sua própria magrela, e logo fez as melhorias necessárias para ganhar o mercado.

No final das contas, as pessoas ainda vão se apaixonar por pequenas e simples frases, personagens, conceitos, sons e tons, que embalem uma visão interessante de mundo ou uma ideia extremamente útil

O Cub era bonito, bem-desenhado, leve e chegava embalado cuidadosamente em uma caixa, numa antecipação do hoje conhecido fenômeno do unpacking. Um pouco mais tarde, Soichiro produzia sua primeira motocicleta. Esta inovação deu origem à Honda atual, que produz de motos a aviões, de automóveis a robôs, de motores para irrigação a tecnologia de corridas. Interessante observar o caráter da revolução do Cub: uma ideia simples, feita com o que já estava disponível, que pudesse ser produzida confiavelmente, que oferecesse um produto acessível e que fizesse muita diferença na vida das pessoas. Só para dramatizar, o contrário disso seria uma ideia de produção extremamente complexa, difícil de explicar, que custasse caro e fizesse pouca diferença no mundo.

Parece óbvio, mas a complexidade tem sido uma característica danosa, cara e luxuosa em muitas das nossas atividades. As organizações devem se simplificar. As megaestruturas, multicamadas e multicargos honrosos estão aí para disfarçar a falta de ideias fortes e úteis. O excesso de tabulação de dados pode se transformar em justificativa científica para o não agir, o não propor, o não inovar. Alguns palestrantes pós-modernos encantam o público com seus jargões, como se rezassem uma missa em latim, mas não voltam para falar na próxima edição do evento, para fazer o choque de realidade. No mundo da publicidade, o CMO de uma famosa megacorporação reclamou que seus interlocutores estavam muito preocupados em sofisticar e pouco ocupados em resolver. Felizmente, acho que a era da supercomplicação da comunicação está acabando.

Não se discute que a multiplicação de plataformas tecnológicas e de mídia nos trouxe milhares de novas possibilidades de contato com seja lá quem precisemos falar, mas a falta de síntese, elegância e unidade tem um efeito de confundir um consumidor já entulhado de informação. No final das contas, as pessoas ainda vão se apaixonar por pequenas e simples frases, personagens, conceitos, sons e tons, que embalem uma visão interessante de mundo ou uma ideia extremamente útil. Aí está o começo de tudo o que é duradouro e engajador. Este é o motorzinho que faz a comunicação de uma empresa se transformar de bicicleta em moto.

 

*Crédito da imagem no topo: Toa55/iStock

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