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Opinião

Vende-se

Por que não estamos valorizando as ideias que temos para vender marcas, experiências e produtos?


11 de fevereiro de 2019 - 18h04

 

(Crédito: Alberto Chagas/iStock)

Morei em Londres durante um ano antes de trabalhar em publicidade. Na verdade, já tinha feito um primeiro estágio em São Paulo e queria muito, muito mesmo, conseguir um estágio na terra da melhor publicidade do mundo. E foi então que aconteceu. Eu, no ponto de ônibus, e uma moça inglesa me fala: — Você não é daqui…

— Não, sou do Brasil.

— Nossa, veio fazer o quê?

— Vim estudar publicidade…

— Eita! Então somos da mesma área!!!

Para tudo! Naquele momento eu vi meu estágio em Londres acontecendo na agência onde trabalhava aquela simpatia. Então, ela me deu a maior lição desde que entrei nessa profissão, dizendo:

— Eu também sou vendedora! Trabalho em uma loja!

É isso: ela tinha razão, somos vendedores. A gente tem ideias para vender marcas, experiências e produtos. Depois a gente tem de vender na agência, para vender ao cliente que quer vender uma marca, uma experiência, um produto. Desde então, sempre tive adoração por vendedores. Todos. Os caras do argumento, da sedução, da história. E embora não faltem no Brasil histórias deliciosas de vendedores incríveis, esse texto é para falar sobre como os danados dos gringos conseguem vender piabas como peixes-espadas. Como eles transformam o comum em extraordinário. O jeito como eles vendem e por que a gente compra têm me deixado encasquetada já faz um tempo.

Imagine que uma vez, no Canadá, tive uma aula/ tour sobre diferentes grafites nos muros da cidade. Ouvia as histórias e olhava “os mais diferentes estilos de maravilhosos grafites” enquanto pensava no Beco do Batman, nos Gêmeos, na Nina, no Speto, no Kobra e em tantos outros grafiteiros insolentes que conseguem deixar sua marca em prédios altíssimos e que dariam histórias maravilhosas.

Outro exemplo aconteceu recentemente na Irlanda: pegamos um barco e fomos ouvindo a incrível história das 365 ilhas (ilhotas), “uma para cada dia do ano”, e “três lagos naturais” (uau!, três?). E depois veio a história dos steamboats (nossas traineiras, jangadas e canoas renderiam um tour só sobre elas, mas nessa hora todos estão maravilhados olhando o mar). Foi um tour de uma hora em que ouvimos sobre a origem do nome do lago e sobre o fundo do lago e depois sobre os tesouros do lago (uma espada do século 9 foi encontrada e, mais, está no museu da cidade de 15 mil habitantes!!!). Eu estava achando aquilo uma aula de como fazer o “much ado about almost nothing”. Procuro um olhar cúmplice em meio àquela arte de vender o lugar. Encontro o Jonathan, meu colega da África do Sul e não me contenho:

— Nossa, aqui eles valorizam cada árvore!

E em três segundos o guia fala:

— Do you see that tree?

Juro!!! E assim foi também certa vez em Paris, onde nem pude encostar numa fruta “extremamente-especialíssima-de-origem-quase-sagrada” que era vendida por unidade e que eu conhecia muito bem porque comprava em cachos por R$ 2 nas ruas do Recife. Era Pitomba, vendida a euro e ouro pelos gringos.

E em Bali? Ali, só pela história incrível do vendedor, em bad english, comprei o café de cocô de macaco, que nunca cheguei a tomar. Estes pequenos exemplos são quase ingênuos perto de quando eu vejo os americanos, os ingleses, o Google, o Facebook valorizarem o que vendem. Estes sempre me fazem lembrar com irritação o que fazemos com as nossas ideias. Temos muitas, e temos muito boas. Mas parece que, justamente pela abundância, não damos a cada uma delas a importância e o tamanho que merecem. Em resumo: não vendemos bem a ideia que promete vender tudo maravilhosamente. Tem cada vez menos pompa, não tem circunstância e às vezes tem de ser por call! — ora, sabemos por atendentes de telemarketing que vender por telefone é a tarefa mais estressante e improdutiva que existe! E o pior: de onde saiu essa, às vezes não vai sair outra tão boa! A verdade é que a gente sempre reclama quando os clientes não compram as nossas ideias. Mas aí entra minha perturbação: e nós, como estamos vendendo?

*Crédito da foto no topo: Reprodução

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