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Ponto de vista

Marco Civil da Internet: um presente no aniversário do Meio & Mensagem?

Foram cinco anos de tramitação com polêmica


8 de abril de 2014 - 3h02

Coincidência engraçada o Meio & Mensagem e a World Wide Web fazerem aniversário juntos – 36 e 25 anos respectivamente. Criado em 1978 para discutir os principais momentos da nossa comunicação, o Meio & Mensagem viu a internet nascer. No Brasil, ela surgiria em 1989, com a delegação do código “.br” restrita ao uso da comunidade acadêmico-científica. Em pouquíssimo tempo, o admirável mundo novo “www” expandiria suas fronteiras ao infinito, tornando-se parte indissociável da reflexão de toda comunidade de comunicação, incluindo a coexistência e reinvenção dos meios, como a do próprio Meio e Mensagem.

Na celebração de 2014, segundo as declarações do pai da criatura, Sir Tim Berners Lee, os aniversariantes ganharam um “presente para lá de especial”: a aprovação do Marco Civil da Internet na nossa Câmara dos Deputados, em março último. Foram cinco anos de tramitação com polêmica e a matéria terá que passar pelo Senado e colegiar melhor os interesses políticos envolvidos entre partidos, indústrias de TI e sociedade. Aí sim será implantando o Projeto de Lei 2.126/2011.

O documento traz muita filosofia e pouca objetividade, dando margem para interpretações diversas e buracos negros. Foi assim também na última South x Southwest, nos discursos de Julian Assange e Eduard Snowden: muito ativismo, mas pouco progresso. Snowden foi até mais longe: disse que seria a comunidade tech que regularia a rede e não o legislativo, nem as agências nacionais de segurança (QUAC!). Para mim caiu a casa! São os filtros, códigos, encriptação de dados e algoritmos que vão definir a democracia digital e não os seus atores? Na simplicidade, o direitos digitai deveria ser um desdobramento dos direitos universais previstos em nossa constituição.

No entanto, muitas coisas são inéditas e darão margem a um longo debate. Por exemplo, no mundo real, a livre expressão está garantida desde que o autor tenha sua identidade conhecida. No mundo digital, na maioria das vezes é o contrário: as pessoas se manifestam de forma incógnita. No offline, é clara a informação que pode ser do conhecimento do Estado para o cumprimento da justiça e das leis. Na internet, esta medida ainda não foi calibrada. Na rede, ainda existe o problema dos co-atores, do envolvimento da indústria que viabiliza a existência e uso da web.

Como descrito no documento oficial, “uma neutralidade absoluta é impraticável…No entanto, permitir formas de favorecimento ou discriminação por motivos políticos, comerciais, religiosos, culturais ou de qualquer outra natureza, que não seja fundada em valores técnicos, significa degradar a rede e seus próprio valor como bem público…”. E aí começa o salve-se quem puder. Os “injustiçados pela indústria de TI”, contam com o ativismo, por exemplo, do sociólogo Sérgio Amadeu da Silveira.

O mundo corporativo ganha voz contra a censura e interferência nos modos operantes das empresas com líderes como Marcel Leonardi, Diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais do Google. E por parte do governo, Demi Getschko, conselheiro do Conselho Geral da Internet e o relator do Marco, Alessandro Molon (PT-RJ) são alguns nomes em pontas opostas da mesa.

Outro desafio está na questão da propriedade de dados. Se for determinada a proibição total do conhecimento de dados dos usuários, o desenvolvimento das novas tecnologias ficaria comprometido e, por conseqüência, o big data talvez nem fique tão big assim, prejudicando a nossa atividade ea velocidade de cenários em CRM. Mais um ponto crítico está no fato de que a internet tem que ser uma plataforma de inclusão social e não o reforço da diferença e motivo de estagnação das classes menos favorecidas.

Considerando uma relação tosca de 1 para 3, entre o número de usuários únicos na internet e a população brasileira, é possível ver que o abismo é grande. Mesmo assim, a aprovação do Marco Civil da Internet no Brasil foi comemorada pela presidenta e deve ser comemorada por todos nós. É um princípio para termos princípios no mundo online. Voltando a fala de Sir Tim Bernes, na minha opinião, o presente está mais para presente de grego. Vai dar muito “penso”e trabalho. Será mais fogo nas 36 velinhas do Meio & Mensagem. Bora mergulhar nisso e parabéns!

(*) Marisa Furtado é sócia-diretora da área de inovação da Fábrica 

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