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“As boas histórias vão salvar o jornalismo”

Zahra Rasool, head de conteúdo na Al Jazeera, fala sobre as oportunidades e desafios dos meios de comunicação em meio à revolução tecnológica, fake news e ondas conservadoras

Luiz Gustavo Pacete
5 de abril de 2018 - 7h10

Plataformas? Modelos de negócios? Digital e offline? Para a jornalista Zahra Rasool, head de conteúdo na Al Jazeera, esses questionamentos são tão ultrapassados quanto questionar a relevância ou não do jornalismo em tempos de internet. Segundo ela, o momento para o jornalismo é de muitas oportunidades, mas desde que os produtores de conteúdo estejam dispostos a buscar a qualidade. “São as boas histórias que vão salvar o jornalismo”, disse Zahara ao Meio & Mensagem, durante a Rio2C.

Zahra Rasool (Crédito: Al Jazeera)

Zhara está desde janeiro de 2017 na Al Jazeera e seu papel é conduzir uma área chamada de Contrast VR cujo principal objetivo é dar escalabilidade às produções imersivas jornalísticas da rede. “Um ambiente de TV, como é o caso da Al Jazeera, é muito tradicional. Óbvio que isso traz benefícios e desafios. O benefício é que você pode contar com a capacidade de jornalistas muito experientes. Por outro lado, há o desafio de provar o valor do VR ou qualquer tecnologia de imersão para profissionais de carreiras formadas na TV tradicional”, afirma.

Meio & Mensagem – Qual o desafio de cuidar de uma área com propostas e experimentações tão disruptivas quanto o VR dentro de uma emissora de TV?
Zahra Rasool – Um ambiente de TV, como é o caso da Al Jazeera, é muito tradicional. Óbvio que isso traz benefícios e desafios. O benefício é que você pode contar com a capacidade de jornalistas muito experientes. Por outro lado, há o desafio de provar o valor do VR ou qualquer tecnologia de imersão para profissionais de carreiras formadas na TV tradicional. Logo que eu comecei na Al Jazeera era muito comum ouvir “o que essa coisa chamada VR pode fazer pelo jornalismo? ” Hoje, parte do meu trabalho é produzir conteúdo, mas uma outra parte muito importante é educar os excelentes jornalistas que temos para provar o valor da imersão para o jornalismo. E só foi possível avançar neste sentido com casos concretos, depois que grandes meios como o New York Times começaram a gerar trabalhos de referências. E eu utilizo agora os nossos próprios cases para mostrar aos nossos jornalistas como o VR pode transformar uma apuração ou uma história.

I am Rohingya, uma das principais produções da Contrast VR

M&M – Muito se debate atualmente sobre o desafio do VR em setores em que ele já é mais testado como entretenimento, games e até na publicidade, no jornalismo as dificuldades de aplicação são maiores?
Zahra – O VR já tem uma certa consistência no game, no entretenimento e até na publicidade. Porém, no jornalismo ele ainda é novo. Assim como Al Jazeera, o New York Times, Guardian, BBC e outros, o grande desafio é ter histórias de qualidade. Neste processo de testes e experimentação, muito foco foi dado à plataforma e menos às histórias. Mas a essência é um grande personagem e um storytelling consistente e que faça sentido. No fim do dia, não é sobre tecnologia, mas sobre storytelling. É compreensível que as empresas tradicionais sejam mais reticentes em investir no VR, ainda temos dificuldade com o custo dos devices. O desafio de se investir na produção de conteúdo. Mas precisa da ousadia do experimento e isso, de uma forma ou de outra, está acontecendo.

M&M – Um dos grandes temas envolvendo o jornalismo e sua responsabilidade são as fake news, o VR como uma tecnologia de imersão pode, de alguma forma, contribuir para contar histórias mais transparentes?
Zahra – É natural que o VR pode ser algo mais transparente, pela capacidade de você colocar uma pessoa muito próxima de uma história. Agora, não é uma tecnologia imune às fake news. Você produzir um vídeo falso, contar uma história falsa. Eu vejo o VR e qualquer outra tecnologia de imersão que possa ser utilizada no jornalismo como ferramentas de aproximação e maior transparência para com a audiência.

“Além de mulher em duas indústrias majoritariamente masculinas como o jornalismo e a tecnologia, sou uma mulher imigrante e muçulmana vivendo nos Estados Unidos”

M&M – O fato de você ser jovem e mulher em um segmento com bases tradicionais e conhecido pela predominância masculina traz desafios adicionais para você como profissional?

Zahra – Eu penso que ainda é muito importante falar o tempo todo sobre esse assunto. É muito difícil ver com rapidez o crescimento da presença feminina na nossa indústria. Veja o meu caso, além de mulher, sou uma mulher imigrante e mulçumana vivendo nos Estados Unidos. Além do jornalismo, estou em uma área majoritariamente masculina que é a de tecnologia. O esforço é muito grande, mas não dá mais para fazer concessões sobre isso, ou as empresas cumprem na prática seus papeis ou ficamos somente no discurso. Quando cheguei na Al Jazeera, eu não abri mão de criar uma equipe de várias regiões do mundo e de várias bases culturais. Se eu não fizesse isso e me contentasse em contratar apenas quem estava na minha zona de conforto nada mudaria. E quando falamos de contar histórias tão fortes como no caso do jornalismo, precisamos ter esse olhar.

M&M – O que o jornalismo pode tirar de lição das pressões vindas do governo no Trump para com vários meios jornalísticos?
Zahra – O jornalismo sempre foi importante, a imprensa livre sempre foi fundamental para a base de várias sociedades. E o jornalismo vive uma nova fase com toda essa pressão. Toda a discussão sobre manipulação e fake news. Nós precisamos aproveitar essa oportunidade para elevar a qualidade das histórias e dos personagens que contamos.

Alguns dos projetos de imersão dirigidos por Zahra Rasool:

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