Um novo lugar de influência

A expertise multidisciplinar de Monique Evelle como empreendedora, jornalista e ativista confere a ela uma particular visão micro e macro do mercado de influenciadores

Por Renato Rogenski

A expertise multidisciplinar de Monique Evelle como empreendedora, jornalista e ativista confere a ela uma particular visão micro e macro do mercado de influenciadores. Quando tinha 16 anos, fundou o Desabafo Social, um laboratório de tecnologias sociais aplicadas à educação, comunicação e geração de renda. Atualmente, é sócia da Sharp, agência de consultoria e hub de inteligência cultural e reconhecida pela Forbes como 30 under 30 e pelo LinkedIn como Top Voices 2019. Por meio de seu duplo papel como influencer e empreendedora, a profissional usa sua visibilidade em todas as plataformas possíveis para trazer à tona reflexões, conversas e negócios que possam estar conectados com o bem-estar social.

Meio & Mensagem — Qual é o nível de maturidade do mercado de influenciadores?
Monique Evelle — Olhando especificamente para os influenciadores, o ano de 2020 ajudou o mercado a entender o poder de influência e a importância dos criadores de conteúdo para serem porta-vozes. As empresas entenderam isso no contexto em que, apesar de tudo que está acontecendo, há pessoas potencializando a criatividade. E é onde conseguimos ressignificar o que é influência. Não é mais sobre celebridades com milhões de seguidores. Posso até me arriscar a dizer que é o fim das celebridades como porta-vozes de marcas. É sobre, talvez, o nano influenciador com cinco mil seguidores, mas que consegue converter determinada ação, serviço, produto e causa. Isso faz muito mais sentido. Vou desde sempre na lógica de um provérbio africano que diz: “Muitas pessoas pequenas, em lugares pequenos, fazendo coisas pequenas, vão mudar a face da terra”. E no mundo da influência não é diferente.

M&M — E quais são os principais desafios neste processo de evolução?
Monique — O mercado está amadurecendo esse olhar sobre a importância e o alcance dos influenciadores, mas algumas marcas ainda não conseguem enxergar esses potenciais da forma como deveriam enxergar, sobretudo quando falamos sobre criadores de conteúdo que são pretos, mulheres. Pesquisas apontam isso, como a que fizemos com Youpix e Black Influence. Ela mostra o retrato da influência preta no Brasil e que esses criadores, independentemente do quanto conseguem engajar e converter, ainda assim ganham menos. Uma pesquisa anterior, da Squid com o Youpix, mostra a mesma coisa na questão de gênero. Então, se aumentamos o debate sobre lutas antirracistas e equidade de gênero na sociedade, espero que esses discursos também entrem para a prática no mercado de influência.

M&M — Então, há uma grande oportunidade para que os influenciadores se tornem elementos importantes também como elos entre marcas e causas?
Monique — Para isso, as marcas precisam parar de enxergar influenciadores como um banner digital. A bagagem dos influenciadores, cada um nas suas bandeiras, pode contribuir nesse lugar de consultoria e cocriação. Não preciso ser o rosto da marca o tempo todo. Muitas me convidam para pensar um conteúdo digital relacionado a diversas coisas. Isso também é influência. Muitas vezes me sinto até mais confortável nesse papel. Quando colocamos o nosso rosto nas campanhas, também temos os riscos para a nossa reputação e nem todas as marcas estão preocupadas. E, se elas caem numa cilada de discurso e incoerência, automaticamente, os influenciadores ligados a elas também serão pressionados. Mas, o fato é que, quando tiramos esse olhar de que o influenciador é um classificado digital, crescemos nesse significado de influência e entendemos que podemos cocriar, pensar ações internas. É importante esse entendimento para sustentar um mercado, que traz inúmeros benefícios. E se não tiver retorno financeiro imediato, tem retorno de reputação e relevância, e o financeiro é consequência disso.

“Quem não nos ouviu antes, precisa correr agora para entender o que está acontecendo. Mas não adianta as marcas não contratarem pretos o ano inteiro e fazerem isso apenas em novembro para falar sobre racismo quando esse influenciador fala sobre música ou games ”

M&M — O que suas vivências mostram nessa relação entre marcas e influenciadores pretos?
Monique — Esse lugar de desafio parte muito do lugar da marca. Antes, a desculpa era que os influenciadores pretos, indígenas e mulheres não tinham conteúdo relevante. Mas, percebemos, neste momento de mundo, que quem não nos ouviu antes, está precisando correr agora para entender minimamente o que está acontecendo. Por isso, os números de seguidores e de criadores de conteúdo estão crescendo. Mas não adianta as marcas não contratarem influenciadores pretos o ano inteiro, e fazerem isso apenas quando chega novembro, para falar somente sobre racismo, quando, na verdade, muitas vezes, esse influenciador fala sobre decoração, música ou games. E quando o influenciador preto manda o orçamento, as empresas dizem que está muito caro. Ela não parte do pressuposto que, em novembro, a demanda vai literalmente aumentar e o criador de conteúdo vai precisar decidir qual marca deverá atender.

M&M — Como evoluir na questão da precificação e desse olhar muitas vezes monotemático das marcas em relação ao influenciador preto?
Monique — Quem perde é a marca, quando manda essas propostas visivelmente abaixo do mercado. Temos os nossos grupos privados no dark social para falar sobre essas coisas e sabemos que, no mesmo evento, na mesma palestra, no mesmo publi, os influenciadores não negros e não indígenas, com o mesmo número de seguidores, vão ganhar mais. Esse é um desafio que passa pelo letramento social, racial e de gênero. Como consultora, já peguei orçamento de marcas para influenciadores e tive que dizer para a diretora de marketing rever os valores de uma proposta. Além disso, não somos monotemáticos. Ser preto muitas vezes não significa que aquela figura domina ou pretende dominar os estudos de questões raciais. Quando digo que não vivo sob a demanda do racismo, isso gera vários questionamentos. Mas, desde os 16 anos, tenho a Desabafo Social e continuo fazendo o trabalho, mas os meus conteúdos, as coisas que quero escrever, falar, apresentar, têm a ver com o ambiente da cultura e do entretenimento. Muitas vezes, as marcas ignoram a potência que isso pode ter.

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