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Em um mundo digital exposto e transparente 24/7, é a vulnerabilidade que nos empodera. E o ego e as certezas nesses momentos só atrapalham


17 de outubro de 2016 - 10h34

Todo mundo está falando em mudança. Do empoderamento das pessoas ao fim da luta armada na Colômbia. Da imprevisível disputa das eleições americanas às revoluções tecnológicas. As mudanças estão em todo lugar. Apesar de significar um ato, concreto e visível, de transformação do estado físico, emocional, econômico ou social de algo, a mudança é um eterno gerúndio.

E nos dias de hoje é possível afirmar que a necessidade constante de transformação talvez seja a única certeza que permanece.

Esse fenômeno não é novo em si. As grandes empresas e marcas vêm mudando as regras, seja há um século, 50 ou dois anos atrás, e tornando- se líderes pela capacidade extraordinária de pensar à frente e inovar. A diferença agora é a velocidade e a volatilidade com as quais elas acontecem. Por consequência, fica cada vez mais aventuroso e difícil prever o futuro.

Em Nova York, tive a chance de ouvir o professor John Quelch da Harvard Business School falar sobre a cultura da transformação. Algumas ideias me marcaram e fiquei com vontade de compartilhar aqui. A primeira é que a mudança está localizada entre o “no longer” e o “not yet”. E os líderes são convidados a se sentarem solitários neste vácuo. Um vácuo opressor de busca sem fim por novos caminhos e novas soluções. E, finalmente quando você chegar ao Éden, precisará recomeçar tudo de novo…

E ainda tem outro desafio: não tem como mapear o caminho do Éden. Ao contrário de um GPS, a trajetória dos negócios está cada vez mais mutante e menos previsível. Para chegar aonde planejou, você terá que agir tal qual o Waze, ou seja, alterar muitas vezes a rota, encontrando caminhos alternativos e às vezes até atalhos.

Outra reflexão importante: não existem muitas regras e padrões a serem seguidos, principalmente quando a ordem que impera é a da transformação permanente. Mas existem algumas atitudes que podem ser mapeadas dentro do processo por vezes caótico. “Se a chave do caos é o medo”, como diria o Coringa, sua saída são os valores que o contradizem.

O Quelch tem a sua definição de líder transformador: “part of wisdom, part of courage and part lack of care for self”.

A sabedoria é antídoto do medo no momento em que possuímos o conhecimento de onde queremos chegar. A coragem é a razão que nos permite tomar decisões a despeito da dor enfrentada no processo, como bem definiu Platão.

Mas gostaria de me ater ao que me parece ser um valor ainda mais contemporâneo e essencial, principalmente para quem precisa construir pontes entre empresas e pessoas: “lack of care for self”. Sabedoria e coragem são conceitos que já conhecemos muito. Porém, humildade na sua carreira, na sua reputação, na sua imagem em prol de um bem maior — que é a empresa em transformação —, isso sim é um padrão novo.

Segundo Quelch, o que faz o líder se destacar dos outros no seu sucesso em transformar é esse terceiro elemento, certo descuido dele mesmo. Em tempo de exposição midiática, ranking e prêmios permanentes, parece que o desprendimento de si é um valor a ser considerado. É mais dar do que receber.

Em um mundo digital exposto e transparente 24/7, somos todos vulneráveis e empoderados ao mesmo tempo. Ou melhor, é a vulnerabilidade que nos empodera. E o ego e as certezas nesses momentos só atrapalham.

Vulnerabilidade não no sentido da fraqueza, mas da franqueza. Da fragilidade intrínseca aos atos de sinceridade, às tentativas, à abertura para o diálogo. Com consumidores, clientes ou colaboradores. A transformação é um bem maior do que o próprio líder. E ela não vem dele. Ele só é um catalizador e um servidor dela.

O vácuo da mudança entre o “no longer” e o “not yet” torna-se menos opressor e solitário quando você está aberto a compartilhar esse espaço com os outros. Incluindo seus erros e acertos. Suas fortalezas e vulnerabilidades. Ou melhor, as forças da sua vulnerabilidade.

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