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Fogo Cruzado

Seja qual for, resultado da eleição nos Estados Unidos deixará ainda mais exaltados os ânimos no país — e com reflexos globais


7 de novembro de 2016 - 11h09

Foto: Reprodução

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Tradicionalmente uma campeã de audiência, pelo simples fato de decidir o cargo político de maior influência no planeta, a eleição presidencial nos Estados Unidos atingiu um novo patamar em termos de atratividade neste ano. A imprensa americana não perdeu tempo e soube transformar a disputa em um verdadeiro show.

Enumero a seguir alguns destaques. As transmissões pela TV dos debates entre Hillary Clinton e Donald Trump na reta final da campanha bateram recorde de espectadores. De acordo com monitoramento publicado pelo Advertising Age, as duas candidaturas, juntas, investiram aproximadamente US$ 600 milhões em compra de mídia — os democratas respondem por três quartos deste montante. Na noite do pleito, em 8 de novembro, o New York Times promoverá um evento em sua sede, para um número limitado de 300 pessoas, ao preço de US$ 250 por cabeça, com direito a comidas e bebidas e, o principal prato da noite, a análise ao vivo de jornalistas que comandaram a cobertura do jornal, em painéis com a participação de analistas políticos e figuras públicas.

O acirramento da disputa nos últimos dias aumentou exponencialmente o interesse de todo o mundo pela eleição. Antes dada como praticamente certa, a vitória de Hillary é agora mais uma aposta do que favas contadas. Até a sexta-feira 4, quando esta edição foi fechada, ela ainda mantinha a liderança tanto nas pesquisas de intenções de voto quanto nas projeções dos votos dos delegados (que, divididos por estados, elegem, de fato, o presidente dos EUA), mas a margem apertada de diferença em ambos os casos já não permitia cantar vitória antecipada.

Após a mais ferrenha campanha dos últimos tempos, nenhum dos dois candidatos é visto como capaz de reunificar o país, nem mesmo por seus próprios eleitores

Seja qual for o vencedor, a missão pela frente será ainda mais árdua do que o habitual. Após a mais ferrenha campanha dos últimos tempos, nenhum dos dois candidatos é visto como capaz de reunificar o país, nem mesmo por seus próprios eleitores, de acordo com a mais recente pesquisa realizada pela rede CBS e o New York Times. A cisão se repete sob diferentes recortes: gênero, raça, classe social, densidade demográfica, ideologia… Alguns analistas identificam como principal determinante dessa polarização o eterno pêndulo entre a segurança e a liberdade — assunto já abordado nesse espaço em fevereiro, quando a Apple se negou a ajudar o FBI a desbloquear o iPhone de um dos autores do atentado que matou 14 pessoas em San Bernardino, na Califórnia.

A equação é simples: para termos mais segurança, é preciso abrir mão de uma proporção similar de liberdade, e vice-versa. Um estudo divulgado pela Havas World wide na semana passada retrata fielmente o dilema. Intitulada “Orgulho e preconceito: mudando mentalidades em uma era de incerteza “, a pesquisa online foi realizada com 11.976 pessoas maiores de 18 anos, em 37 mercados.

Quase metade (48%) dos franceses e britânicos participantes, além de 45% dos americanos, disseram estar dispostos a sacrificar parte de sua liberdade em troca de maior segurança. O mesmo estudo apontou também um aumento do nacionalismo: sete em cada dez pessoas afirmaram sentir orgulho de seus países. Por outro lado, 45% dos respondentes acreditam que sua nação está avançando na direção contrária da que deveria.

O atual cenário global de crise econômica, ataques terroristas, imigração de refugiados e desigualdade social e financeira acentua as diferenças de posicionamento entre grupos em relação a esses e a outros temas. Nessas condições, muitos assumem uma posição defensiva, cujo próximo passo é, geralmente, partir para o ataque contra quem pensa diferente. O desfecho da eleição americana não encerrará a discussão — pelo contrário, a probabilidade é de que os ânimos fiquem ainda mais exaltados, com reflexos em toda a sociedade, nas mais diversas esferas.

Será interessante acompanhar a evolução das estratégias de comunicação das marcas no meio desse fogo cruzado, em um cenário global no qual agradar a todos parece não somente estar longe de ser a melhor saída, como também uma tarefa impossível.

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