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Opinião

A hora de mergulhar e explorar a espuma

Temos de reconhecer que vivemos em um mundo onde é natural conviver com imprevisibilidade, insegurança e desconforto, com mais perguntas do que respostas


6 de dezembro de 2016 - 9h00

Foto: Reprodução

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Em 2004, para explicar diferentes fenômenos da contemporaneidade, o filósofo alemão Peter Sloterdijk publicou o primeiro livro de uma série que apresenta os resultados de uma longa pesquisa que gerou o que ele denomina de teoria das esferas.

Para explicar as transformações pelas quais estamos passando, a teoria proposta por Sloterdijk começa no indivíduo e afirma que passamos a vida buscando reproduzir e perpetuar a bolha da qual nos originamos, o útero, porque vem de lá nossas primeiras memórias de estabilidade, conforto e segurança. Nossas escolhas por séculos, se basearam nessa busca e motivados por ela, temos tomado decisões envolvendo religião, política, leis, família, trabalho e consumo, buscando minimizar riscos e reduzir nossa necessidade de mudança e de adaptação.

Como acontece com as pessoas, acontece com as organizações. Empresas são um microcosmo da nossa vida em sociedade e também nascem de uma bolha original que passamos a vida buscando reproduzir. Isso é verdade também na publicidade. Não é à toa que somos todos tão parecidos e que profissionais e clientes sofrem tão pouco quando decidem se transferir de um lugar para o outro. Respondemos todos a basicamente o mesmo modelo de negócio, a uma mesma estrutura, a um mesmo modelo hierárquico.

Um dos fenômenos usados por Sloterdijk para demonstrar o efeito da nossa busca por reproduzir e perpetuar nossa bolha original, como sociedade e como empresas, acontece nos séculos 19 e 20, quando começamos a acreditar que era possível transformar o mundo na nossa bolha. O momento máximo dessa busca foi a globalização, quando as organizações empresariais olharam para o mundo em busca de similaridades e homogeneização. Enquanto isso acontecia, fenômenos relacionados ao desenvolvimento tecnológico surgiam e criavam o que Sloterdijk chamou de sobreposição de espaços. Passamos a ocupar vários espaços ao mesmo tempo e saímos de um estar ampliado da mãe, de nossa bolha original, para um estar subjetivo, virtual e interconectado.

Como acontece com as pessoas, acontece com as organizações. Empresas são um microcosmo da nossa vida em sociedade e também nascem de uma bolha original que passamos a vida buscando reproduzir. Isso é verdade também na publicidade

Fenômenos como internet, mobilidade, redes sociais e hipermídia, aceleraram esse processo de sobreposição e se tornou inviável continuar tentando reproduzir a bolha, como se tornou inviável a ideia de um mundo globalizado homogêneo e todo o tempo seguro, estável e confortável. Finalmente nos vimos obrigados a reconhecer que vivemos em um mundo feito por diferentes camadas, onde é natural que tenhamos de conviver com a imprevisibilidade, com a insegurança, com o desconforto. Neste momento, com mais perguntas do que respostas.

Passamos a viver um mundo onde infinitas bolhas, de diferentes tamanhos e características, nascem, explodem, se espelham, se fundem e se separam todo o tempo, formando uma realidade que Sloterdijk chamou de espuma. No mundo dos negócios, essa realidade trouxe a economia compartilhada, os modelos colaborativos, as plataformas abertas, as pequenas empresas locais de atuação global, as startups, a falência de antigos modelos.

Não faz mais sentido buscar nossa identidade apenas no que fomos originalmente. Vivemos a fragmentação de uma realidade em espuma, onde a complexidade, no lugar de um problema, é a solução encontrada pelo sistema para que sejamos capazes de resolver as questões com as quais vamos nos deparar daqui para a frente.

Não existem experiências análogas ao que estamos vivendo agora.

A realidade das espumas não pede que usemos nossa capacidade de criar um novo modelo, mas nossa capacidade de atuar em conexão com os diferentes modelos que irão surgir todos os dias. O mundo contemporâneo está nos pedindo para exercitar nossa visão sistêmica, para perceber o valor da heterogeneidade, da transdisciplinaridade, da diversidade de estrutura e da diversidade nas estruturas.

No lugar de força e agressividade, a realidade atual nos pede adaptabilidade, que foi uma das nossas capacidades naturais nas quais menos investimos enquanto estávamos ocupados tentando reduzir o risco.

É claro que vamos continuar desejando a segurança e que ainda vamos nos deparar com muitos movimentos buscando o retorno, a manutenção, a separação entre a bolha e a espuma, o isolamento. Mas é improvável que esses movimentos consigam frear a transformação que está em curso. Agora, nossa segurança depende da nossa disposição para mergulhar e explorar a espuma porque é fora das bolhas que estão nascendo as novas lideranças, os novos caminhos, as novas soluções. É fora das bolhas que vamos encontrar a diversidade capaz de nos ajudar a compreender e resolver problemas complexos. Estamos vivendo um momento único e repleto de possibilidades. Mas é necessário abrir mão de muito do que até hoje consideramos certo, adequado, necessário. A hora é de sair da bolha e mergulhar na espuma. Experimente. É incrivelmente excitante fazer parte disso.

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