O silêncio define o estado das coisas

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Opinião

O silêncio define o estado das coisas

Todos temos motivos para ter esperança e medo – resultado do encontro de uma revolução tecnológica e científica sem precedentes com um cenário político, econômico e social altamente volátil e inseguro


12 de março de 2018 - 12h42

A chanceler alemã Angela Merkel se encontra com o premiê canadense, Justin Trudeau (Créditos: Handout/GettyImages)

Sob o tema “Criando um futuro compartilhado em um mundo fraturado”, 2,5 mil líderes de empresas, governos, sociedade civil, artes, academias e mídia estiveram reunidos no World Economic Forum (WEF) na pequena cidade de Davos, na Suíça, na última semana de janeiro. O desafio era definir e impulsionar uma agenda compartilhada baseada no atual estado das coisas: os inevitáveis e negativos impactos ambientais e o crescente risco de arrefecimento de impactos sociais e econômicos decorrentes da desigualdade em todos as suas faces.

Com o compromisso explícito de olhar a realidade de frente e abordar questões cruciais para que o crescimento econômico não continue desvinculado do desenvolvimento humano e social, o WEF de 2018 deixou claro que todos temos motivos para ter esperança e medo — resultado do encontro de uma revolução tecnológica e científica sem precedentes com um cenário político, econômico e social altamente volátil e inseguro.

Esperança e medo. Não existe exatamente como se colocar em apenas um desses lados agora, a não ser em casos de profunda miopia ou ignorância. Como está colocado no Relatório de Riscos Globais 2018, publicado no ano passado e que pede uma reforma urgente do capitalismo, “a humanidade tornou-se notoriamente apta a entender como mitigar os riscos convencionais que podem ser facilmente isolados e gerenciados com abordagens padrão de gerenciamento de risco. Mas somos muito menos competentes quando se trata de lidar com riscos complexos nos sistemas interligados que sustentam nosso mundo, como organizações, economias, sociedades e meio ambiente. Existem muitos sinais de tensão em muitos desses sistemas: nosso ritmo acelerado de mudança está testando as capacidades de absorção de instituições, comunidades e indivíduos”.

A realidade que está sendo discutida é a nossa realidade. Equidade, liberdade e educação agora são parte da agenda do mundo dos negócios, do nosso mundo, e quem está dizendo isso não são aquelas pessoas que muitos chamariam de sonhadores ou ativistas

Riscos complexos em sistemas interligados. Registre e pense muito a respeito. Estamos falando de uma realidade que, entendida, demanda a construção de sistemas de confiança (particularmente, de confiança interpessoal), o que, segundo Davos, torna prioritária a adoção de “políticas centradas no ser humano para melhorar a coesão de um mundo cada vez mais fraturado”. Uma mensagem que vem junto com alertas sobre questões urgentes. Escolhi algumas para citar aqui:

-Equidade e assédio no trabalho: não vai existir igualdade enquanto existir assédio. O fim das desigualdades não é apenas uma questão numérica, também passa por questões envolvendo vieses inconscientes de comportamento e reprodução de uma cultura perversa onde minorias de voz são oprimidas por uma ideia equivocada que relaciona força bruta, covardia e resultado.

-Liberdade e limites: durante Davos, Google, Twitter e Facebook foram acusados de não controlar conteúdos extremistas e de ajudar na construção de uma sociedade baseada em uma “dieta insalubre de atualizações” e de “explorar o ambiente social e prejudicar a democracia”, uma discussão necessária e desejada a respeito de intencionalidade e impacto na discussão sobre o papel das corporações na formação da sociedade.

-Educação e desemprego: a estimativa é de que cinco milhões de pessoas percam o emprego, nas principais economias mundiais, nos próximos cinco anos. Considerando que estamos falando de um momento de transformação nos perfis e relações de trabalho e nos modelos de geração de renda, a ordem do dia é gerir a transição, o que inclui um foco, que já está atrasado, em educação. Vale manter em mente o comentário feito por John Goodwin, chefe da Fundação Lego: muitos países ainda estão usando práticas de educação estabelecidas na época de nossos avós.

O risco de que o impressionante momento de desenvolvimento pelo qual estamos passando gere impactos negativos incontroláveis foi colocado na mesa em Davos. A realidade que está sendo discutida é a nossa realidade. Equidade, liberdade e educação agora são parte da agenda do mundo dos negócios, do nosso mundo, e quem está dizendo isso não são aquelas pessoas que muitos chamariam de sonhadores ou ativistas. As corporações, finalmente, parecem estar entendendo que não existe mercado sem pessoas e não existe pessoas sem que o lucro esteja comprometido com a saúde da sociedade. O silêncio não define mais o estado das coisas.

*Créditos da imagem no topo: bee32/iStock

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