C2 Montreal, should I stay or should I go?

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Opinião

C2 Montreal, should I stay or should I go?

O evento cumpriu a missão de falar sobre os conteúdos na crista da onda, mas também conectar com coisas mais velhas, porém, ainda extremamente relevantes


30 de maio de 2018 - 11h11

Crédito: your_photo/iStock

Esta foi minha primeira vez no C2 Montreal. Como vou a vários eventos, sei que a pergunta padrão será: vale a pena ou não? E minha resposta: é uma pergunta complexa pois, além de ser a primeira vez no evento, é a primeira vez em Montreal. Há um mês e pouco, estava no SXSW; seis meses atrás no WebSummit; e há nove meses, em uma missão empresarial ao Vale do Silício, ou seja, é difícil não comparar. Então, vou, sim, comparar esse com outros eventos que se intitulam conferências de negócios, criatividade e inovação.

Primeiro ponto: qualquer coisa com sotaque francês fica muito melhor e isso já mostra um pouco da dificuldade dessa análise. Qualquer coisa em Montreal será legal. Brincadeiras à parte, vamos lá. Primeiro, sobre o tamanho. O evento está em na sétima edição e é meio pequeno. Nessa edição, acho que não chegou a seis mil pessoas nos três dias. Para situar, no SXSW foram 75 mil pessoas e o Web Summit do ano passado teve 53 mil visitantes.

O C2 foi idealizado pela Sid Lee, uma agência de publicidade. No início, contou com o funding de uma família rica da cidade e com o patrocínio do Cirque du Soleil, mas anda muito bem sozinho, obrigado. O objetivo, me dito por Bertrand Cesvet (criador do evento), era colocar Montreal na cena internacional da criatividade para gerar mais comércio e negócios. Inclusive, o nome C2 vem daí: Commerce and Creativity. Os temas abordados se aproximaram do que tenho ouvido nas últimas três viagens, mas o C2  ganha “pontos extras” porque propõe os encontros (colisions) entre diferentes abordagens. E os que eles provocaram este ano foram muito relevantes.

Começamos pelo kit sopa de letrinhas padrão de todo evento que quer ser high tech modernoso. Sim, teve AI, ML, VR, NC, BMI… Inclusive teve bastante IA (inteligência artificial) e ML (machine learning). Me chamou a atenção uma palestra de Timnit Gebru, pesquisadora da Microsoft, que abordou a necessidade de serem obrigatórios os datasheets (descrições detalhadas do conteúdo), os datasets (grandes conjuntos de dados) que são carregados e usados para ensinar as inteligências artificiais. Ela apontou que como não é feita uma curadoria do que usamos para ensinar as máquinas, tem muita coisa errada acontecendo. Cruzando isso com automation bias, aberrações já estão acontecendo. Ela citou o exemplo de um israelita que foi preso porque o Facebook traduziu good morning para attack them. Ela não disse, mas tem uma frase antiga que serve bem aqui: “Shit in, shit out”. Ou cuidamos de como ensinamos as máquinas ou elas irão reproduzir o que temos de pior.

Lógico, também teve realidade virtual (VR). Fora o conteúdo, o que realmente me impressionou foi um dos palestrantes, Sabarish Gnanamoorthy. Ele é um dos dez desenvolvedores de VR mais influentes do mundo e só tem 14 anos, sim, uma criança. Alguma dúvida que vamos ouvir muito sobre ele? A neurociência também esteve presente. A palestra do chefe do departamento de neurociência da Nielsen foi fantástica. Além disso, havia um lab (experiência) sobre o tema. Inclusive, o Lab Rêveries, de neurociência, acabou apresentando uma coisa nova para mim, a brain machine interface (BMI). Basicamente, BMI consiste em uma área de estudo que pretende criar interfaces que permitam inserir dados diretamente do cérebro para a máquina (quase como pensar em vez de digitar). A provocação é válida: queremos que as máquinas leiam e interpretem (e provavelmente usem) nossos pensamentos e sonhos?

O C2 também adicionou algumas letrinhas na sopa padrão, quer ver? Que tal 4D printing e bio printing? Teve isso sim. Vi uma palestra do MIT falando de um projeto de 2013, de impressão em 4D. A variável tempo foi adicionada na equação, fazendo com que, em função de umidade, temperatura ou qualquer outra variável temporal, o material se transforme. Sério! O MIT não é deste mundo. Acho que são alienígenas mandados para a Terra para nos envergonhar. Uma frase me marcou muito: “Hoje estamos programando códigos que fazem coisas fazerem coisas; amanhã estaremos programando os materiais propriamente ditos.”

Teve também o pessoal da Bio X que está vendendo impressoras 3D por US$ 500 dólares (sim, está certo, é só isso mesmo). E não é qualquer impressora. Elas imprimem um material que consegue carregar células humanas vivas, que procriam e produzem colágeno, por exemplo. Por ora, só produzem tecidos e algumas coisas como cartilagem, orelhas, nariz… Mas eles baixaram o preço ao máximo e estão criando uma comunidade para que todos se envolvam e pesquisem e, em pouco tempo, conseguiremos imprimir tecido humano como pele, órgãos e outros. No palco, enquanto falava, ele imprimiu algo. Não é algo para o futuro, já está acontecendo.

Para além das letras high tech, teve muito mais. Chelsea Manning, presa por vazar 750 mil documentos do exército norte-americano para Edward Snowden, foi uma das palestrantes mais aguardadas. Condenada a 35 anos de prisão, ela só estava lá graças ao (Barack) Obama, que a liberou com sete anos de pena. Chelsea falou sobre a importância de tomarmos partido. Mencionou uma frase meio clichê, mas que saindo da boca dela fez muito sentido. A ausência de um posicionamento é exatamente igual a ação preconceituosa ou nociva. Se os de bem não se manifestam, os do mal ganham.

Lógico, além da liberdade de expressão, da crítica ao (presidente) Trump e da defesa dos direitos LGBTQAI+, teve também a defesa dos direitos de igualdade para as mulheres. A palestra de Sophie Trudeau, militante pela igualdade dos sexos e mulher do primeiro-ministro do Canadá, foi muito interessante e cumpriu o papel.

Entretanto, o C2 me ganhou (além do fato de que os montrealenses são as pessoas mais amáveis do planeta) foi na transversalidade. Eles cumpriram a missão de falar sobre os conteúdos na crista da onda, mas também conectar bem com coisas mais velhas, porém, ainda extremamente relevantes para nós, em nosso retorno ao dia a dia. Houve várias palestras que realmente propuseram algo de prático a ser usado na volta para casa. Cito a palestra sobre cultura corporativa da Netflix e a do Spotify, que vem usando dados para construir um storytelling desde 2015.

Tentando concluir este texto, que já está mais longo do que deveria, digo o seguinte: o C2, por ser no Canadá, é fantástico. Se fosse maior, seria ruim. Se fosse mais mainstream, não seria tão bom. Se não tivesse esses labs (experiências sensoriais), seria mais normal. Enfim, em tudo é mais bonito. A água trocada entre uma fala e outra é feita por quatro artistas do Cirque du Soleil, ou seja, é lindo, bem cuidado e feito de forma inesperada. Em suma, tem tudo que os outros têm, mas é mais bonito, diferente e muito mais amigável. Tenho a impressão de que o C2 é uma experiência feita com cuidado e pensado muito em quem já foi para vários eventos e quer algo mais… Se der, quero voltar sempre.

 

*Crédito da imagem no topo: kmlmtz66/iStock

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