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Opinião

Diga de quem compras e te direi quem és

Em tempos nos quais a confiança zero norteia os relacionamentos, tem aumentado o número de pessoas dispostas a fazer das compras um ato político


20 de maio de 2019 - 12h50

 

(Foto: Reprodução)

Foi breve, muito breve, a época de nuvens entreabertas a indicar uma possibilidade de dias melhores para a economia, sob o signo de possíveis reformas propostas pelo novo governo e o reaquecimento de alguns setores motivado pela retomada da confiança nos rumos do País, com a mudança no grupo político que agora ocupa o Planalto. O tempo fechou de vez na semana passada, quando pela primeira vez protestos populares ganharam as ruas das principais cidades brasileiras desde que Jair Bolsonaro assumiu a Presidência, em janeiro.

Com a reforma da Previdência tramitando em ritmo lento na Câmara, a piora do quadro econômico, o aumento do número de desempregados e uma série de polêmicas em temas controversos, os cortes anunciados nas verbas das universidades federais foram o estopim para deflagrar a união de milhares de pessoas contrárias às decisões. A menos de um mês do aniversário de seis anos dos protestos que incendiaram o País, a quarta- feira 15 de maio teve um quê de junho de 2013, a começar pelo protagonismo dos estudantes na liderança das manifestações. O potencial de propagação dos atos será verificado nas próximas semanas — assim como o humor do mercado, que começa a refletir em seu ânimo e resultados as dúvidas quanto à capacidade de articulação política do governo para tocar as reformas prometidas e necessárias.

Raios e trovões também irromperam no horizonte internacional, com a escalada da discórdia entre Estados Unidos e China, uma batalha com potencial para se prolongar por décadas, de acordo com especialistas entrevistados pelo The New York Times e a The Economist. Por trás da guerra comercial, as duas superpotências seguem demarcando territórios de influência e disputando a liderança em inovação e tecnologias que definirão a vanguarda da economia e a supremacia no atlas mundial.

Em tempos nos quais a confiança zero norteia os relacionamentos entre países, grupos da sociedade e corporações, tem aumentado o número de pessoas dispostas a fazer do consumo um ato político, inserindo a variável da afinidade sociocultural na equação do custo-benefício — desde que, claro, tenham o privilégio financeiro de direcionar suas escolhas por valores diferentes do menor preço.

Dois em cada três brasileiros entrevistados em 2018 para o estudo Edelman Earned Brand foram classificados como consumidores movidos por suas crenças, para os quais tanto a escolha quanto o boicote de uma marca podem ser motivados pelo posicionamento político e social da empresa. Tamanho nível de consciência desautoriza o discurso como lastro: serão as atitudes que definirão a autoridade de uma empresa para encampar causas.

“Pessoas têm crenças, inserem-se em conflitos, opinam, ganham simpatizantes e desafetos. Marcas também. Enquanto algumas ainda insistem em tentar agradar a todos, outras já transformam suas crenças em ativos valiosíssimos”, afirma a CEO da Box 1824, Paula Engert, em entrevista a Meio & Mensagem.

Tal ambiente demanda que os executivos-chefes de marketing assumam mais um papel dentre suas múltiplas funções como guardiões da marca, agora mais no campo ético do que no estético, para o qual serão importantes ter a coragem de um ativista em prol de uma causa legítima e a precisão de um diplomata, para saber a hora certa tanto de comprar brigas quanto de fazer amigos — habilidades dignas de um chief political officer, como relata o jornalista Salvador Strano. Que o digam os responsáveis pela comunicação da Nike, Patagonia, Burger King e Banco do Brasil.

*Crédito da foto no topo: RawPixel/Pexels

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