O álbum de R$ 1 bilhão
Ponto de Vista: As bancas de jornal já foram um excelente negócio. Hoje, para ter algum crescimento, o setor é extremamente dependente das febres ? especialmente das que movimentam crianças e adolescentes
Ponto de Vista: As bancas de jornal já foram um excelente negócio. Hoje, para ter algum crescimento, o setor é extremamente dependente das febres ? especialmente das que movimentam crianças e adolescentes
Meio & Mensagem
6 de maio de 2014 - 11h52
Faz quatro anos que visito uma mesma banca de jornal pelo menos uma vez por mês. Lá atrás, tive uma longa conversa com a dona sobre como andavam as vendas. Ela pintou um quadro desolador. Desde então, sempre que me encontra, ela volta ao assunto. Sempre com a fisionomia carregada. Sempre reclamando. Não me lembro de tê-la visto sorrir uma única vez nesse tempo todo.
Daí minha surpresa ao ser recebido por ela com um enorme sorriso no rosto na semana passada. Perguntei como andavam as coisas.
― Agora, está bom! ― respondeu.
A razão da alegria era justamente o motivo da minha visita: comprar figurinhas do Álbum da Copa para meu filho de 11 anos.
― Só esta semana, já vendi mais de três mil pacotinhos. Nunca vi uma coisa dessas ― contou.
A esta altura, todo mundo já sabe que o Álbum da Copa virou uma mania nacional. O que muita gente não imagina é a importância desse fenômeno para um segmento que vem sofrendo muito nos últimos anos e é pouco lembrado nas discussões sobre o futuro da mídia.
As bancas de jornal já foram um excelente negócio. Quando me formei, no início dos anos 1990, a gente brincava que, se não arranjasse emprego de jornalista, tentaria trabalhar como jornaleiro. Eram tempos em que, em valores de hoje, o dono de uma banca de bairro podia tirar R$ 10 mil livres por mês. Comprar uma banca era mais caro que uma casa – e não estou falando das mais bem localizadas, como as da Praça Panamericana, em São Paulo. Essas custavam uma fortuna!
O segmento já foi tão forte que, no passado, chegou a impedir que as editoras vendessem suas publicações por meio de assinaturas. Para poder entregar Veja diretamente na casa dos leitores, o falecido Roberto Civita contava que teve de fazer um acordo com o sindicato das bancas: durante uma década, não venderia assinatura de nenhum outro título.
Com os anos, as assinaturas foram ganhando terreno e tiraram boa parte do poder das bancas. Mas o que enfraqueceu mesmo o setor foi a migração dos leitores para a internet. Se os grandes grupos de mídia puderam compensar parte dessa perda com o lançamento de portais de notícias, as bancas só tiveram algum alento com a ascensão da nova classe média, que trouxe novos leitores ao mercado. Mas, nos últimos três anos, também esse público foi para a internet – e as vendas das bancas voltaram a minguar.
Hoje, para ter algum crescimento, o setor é extremamente dependente das febres – especialmente das que movimentam crianças e adolescentes. A maior da última década foi a do grupo musical RBD, que despontou na novela mexicana Rebelde e enlouqueceu a garotada, sobretudo as meninas, em 2004. As bancas foram tomadas por pôster, figurinha, livro, revista e o que mais fosse possível lançar com a imagem dos integrantes do grupo.
O Álbum da Copa do Brasil provavelmente roubará o posto. A Editora Panini, responsável pelas figurinhas, não divulga o número de pacotinhos vendidos, mas diz que já somos mais de oito milhões de colecionadores. Considerando que cada pacote custa R$ 1 e tem cinco figurinhas – e que são necessárias 649 delas para completar um álbum -, chega-se à estimativa de um potencial de faturamento de mais de R$ 1 bilhão! (Número superestimado porque não considera as desistências, mas também não contabiliza as figurinhas repetidas nem a receita com as nove polêmicas figurinhas patrocinadas).
Se a dona da banca que eu vou está sorrindo de uma orelha à outra, imagina como estão os donos da Panini…
* Demetrius Paparounis é jornalista, diretor da TAG Content e especialista em comunicação para a nova classe média.
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