Meio & Mensagem
7 de janeiro de 2014 - 9h36
Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo em 3 de janeiro de 2014, página dois, com o título País das Libações, Ruy Castro faz defesa de que anúncios de cerveja deveriam retratar pessoas "urinando, vomitando os bofes, batendo o carro, espancando mulher ou sofrendo de dor de cabeça". Segundo o escritor, dessa forma "o Brasil se reconheceria nesses filmetes".
Castro foi co-autor e leitor do "Manifesto dos intelectuais brasileiros contra a censura às biografias” durante a XVI Bienal do Livro do Rio de Janeiro, em setembro de 2013. O documento, assinado por diversos escritores brasileiros em um dos trechos, afirma "Hoje, quando a sociedade clama pela ética e pela plena liberdade de expressão, está mais do que na hora de eliminar este entulho autoritário e permitir novamente que os brasileiros possam ter acesso à sua própria história."
O "entulho autoritário", na visão dos escritores, é a necessidade de autorização prévia dos biografados ou seus familiares, o que compromete a liberdade e a sobrevivência do gênero no Brasil.
O assunto ainda está na pauta da Câmara dos Deputados, mas como janeiro costuma ser mês de poucas atividades literárias, Castro voltou suas atenções para, também ele, produzir sua parcela de entulho autoritário.
Em outro trecho do "manifesto dos intelectuais", afirmam o óbvio: "A ninguém é dado impedir a livre expressão intelectual ou artística de outro, garantia consagrada na Constituição democrática de 1988, que baniu definitivamente a censura entre nós.". Para Castro isso não se aplica a liberdade de expressão comercial representada pela propaganda.
Pela tese de Castro o livro Carmem – Uma biografia, de 2005, deve ser anunciando ao público como a história da portuguesa que usava abacaxis e bananas na cabeça, rebolava de barriga de fora, cantava coisas desconexas como "meu coração faz tica-tica-bundi" e forjou, para sempre, a imagem das brasileiras através dos filmes de hollywood estrelados por Carmem Miranda.
O livro Estrela Solitária, de 1995, pode ser apresentado como a história de um alcoólatra, limítrofe, que abandona os filhos para viver uma aventura amorosa com uma cantora popular, o que é a síntese da história de Garrincha.
E Anjo Pornográfico, de 1992, nada mais é que a história de um apoiador da ditadura militar, delator de opositores para os órgãos de repressão e tortura o que reproduz o pensamento e as ações de Nelson Rodrigues.
Castro defende que ao se propagandear produtos dessa forma estará preservada a essência do povo brasileiro. Tanto na publicidade de cerveja, exibindo os constrangimentos do excesso, quanto na divulgação dos livros de biografia, valorizando as mazelas dos seus retratados.
Esse pensamento simplista imposto pelos críticos da propaganda e incorporado agora pelo autodenominado intelectual Castro não aprimora em nada o debate sobre a propaganda ética e responsável liderado pelo Conselho Nacional de Autorregualmentação Publicitária (Conar), com mais de 150 membros representantes da sociedade civil, dos anunciantes, agências e veículos.
Castro é tão primário e irresponsável na sua análise sobre a propaganda de bebidas alcoólicas quanto os líderes do Movimento Procure Saber sobre o direito à privacidade dos biografados. Ambos gostam de movimentar entulhos autoritários sob o pretexto de proteger a sociedade brasileira. Ambos são dispensáveis.
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