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3 de abril de 2018 - 7h09
Marco Stefanini (*)
Toda a polêmica envolvendo o Facebook mostra que estamos diante de um grande desafio: garantir a transparência das informações para que não sejam utilizadas de maneira maliciosa, intolerante e prejudicial à sociedade. Essa preocupação se tornou ainda mais evidente quando Mark Zuckerberg, criador da rede social, disse em entrevista à CNN, na semana passada, que fará o que for necessário para garantir a integridade das “eleições no Facebook”, inclusive no Brasil.
Não seria presunção demais achar que a disputa eleitoral se restringe aos posts e troca de farpas que existem nos períodos próximos às eleições, com algumas amizades desfeitas em caso de opiniões contrárias? Por mais que pareça um absurdo, Mark Zuckerberg sabe o que está dizendo e a sua parcela de responsabilidade no fenômeno que chamamos de fake news, as informações falsas que circulam pela Internet.
A discussão sobre a interferência das notícias nas eleições ganhou um novo capítulo no final de semana dos dias 17 e 18 de março, quando o jornal americano The New York Times e os ingleses The Guardian e Observer revelaram que os dados pessoais e detalhes sobre atividades on-line de 50 milhões de perfis do Facebook foram coletados e utilizados para fins eleitorais, sem que os usuários tivessem dado autorização para tal.
Segundo as publicações, as informações foram obtidas, entre junho e agosto de 2014, por meio de um aplicativo desenvolvido por Aleksandr Kogan, um psicólogo da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e inspirado nas pesquisas de outro estudioso da mesma instituição, Michal Kosinski. As denúncias sugerem que o Facebook teria consentido que o aplicativo fizesse a coleta de dados em sua plataforma para fins acadêmicos, porém Kogan teria vendido os dados à Cambridge Analytica, uma empresa que tinha em seus quadros Steve Bannon, o ex-estrategista da campanha presidencial de Donald Trump.
Tudo indica que as informações coletadas no Facebook foram cruzadas com registros de eleitores e utilizadas para produzir campanhas on-line que reproduzissem exatamente o que aquelas pessoas pensavam e queriam do próximo presidente. Acredita-se que os dados pessoais vendidos por Kogan à Cambridge Analytica serviram para divulgar abertamente informações tendenciosas e notícias a milhões de cadastrados no Facebook, alimentando uma série de preconceitos. Há indícios, que a mesma estratégia foi utilizada na época do referendo sobre o Brexit, que deu vitória à saída do Reino Unido da União Europeia. Nos dois casos – eleição de Donald Trump e Brexit – a Rússia pode ter interferido para se beneficiar do resultado que lhe mais interessaria, naquele momento.
Na semana passada, o Channel 4 News aguçou a discussão ao divulgar vídeos em que revela como a Cambridge Analytica faz campanhas secretas nas eleições em todo o mundo. Chefes foram filmados falando sobre uso de subornos, ex-espiões e identidades falsas. Em um dos vídeos, o canal mostra uma fala do diretor da Cambridge Analytica, Mark Turnbull, que menciona: “Precisamos ser sutis. Botamos informação na corrente sanguínea da Internet e vemos crescer. Fizemos o México, a Malásia, agora vamos para o Brasil”.
Diante dessa quebra de confiança da Cambridge Analytica com o Facebook e deste com seus usuários, como fica a questão da democracia? No mundo em que as empresas de marketing político conhecem detalhes sobre os gostos, medos, opiniões e vulnerabilidades das pessoas, o fato de curtir o post de um amigo ou compartilhar uma informação pode oferecer munição a estrategistas para criar conteúdos que possam exacerbar a intolerância, além de contribuir para que alguns candidatos se beneficiem do que é publicado nas redes sociais.
É preciso investir na educação, implementar regulamentações e conscientizar a sociedade sobre a importância de verificar se as informações compartilhadas nas mídias sociais são verdadeiras. No Brasil, a morte trágica de Marielle Franco não intimidou a criação de fake news que tentavam depreciar a história de luta da vereadora carioca. E o pior: as informações foram compartilhadas como verdadeiras por pessoas do Judiciário e do próprio meio político.
A discussão sobre fake news e, mais recentemente do escândalo da Cambridge Analytica e Facebook, nos leva a refletir sobre a necessidade de desenvolver soluções focadas em cibersegurança, que consigam minimizar este tipo de informação e denunciar seus autores, para que as redes – criadas originalmente para unir – não sejam um pretexto desonesto para ameaçar a democracia e o futuro político de diversos países.
(*) Marco Stefanini é fundador e CEO global da Stefanini