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DE 08 A 16 DE MARÇO DE 2024 | AUSTIN - EUA

SXSW

A Inteligência Artificial pode, sim, nos ferrar muito

Com a ascensão meteórica da Inteligência Artificial, nessa nova internet, não somos nós que buscamos a informação. As informações nos buscam


15 de março de 2023 - 15h12

Inteligência artifical de biometria por voz

Crédito: Shutterstock

Se você não pode ficar 10 dias, ou pelo menos cinco, em Austin, Texas, para aproveitar todo o SXSW, não deve perder os três primeiros. É nesse período que os palestrantes e convidados mais estrelados das conferências sobem ao palco e lotam os auditórios. E se você, assim como eu, veio mais pelos painéis do que pelo festival de música e cinema – o que, oxalá, pretendo consertar nos próximos anos! –, está agora com um nó na garganta.

A conclusão de que estamos ferrados não veio das palestras sobre a emergência climática, a urgência de limparmos os oceanos ou encontrarmos fontes de energia alternativas aos combustíveis fósseis. Não fui a nenhuma palestra na trilha de conteúdo de sustentabilidade ambiental. Não porque não seja importante, mas é que, infelizmente, já sei o quanto estamos ferrados nesse sentido. Diante de tantas opções de temas abordados no festival, é preciso ter foco aqui no SXSW. E eu me concentrei na trilha sobre Inteligência Artificial, Web3 e redes sociais.

Minha conclusão, após esses primeiros dias, é que, assim como chegamos a um momento crucial para revertermos nossa própria extinção física após décadas de mau uso dos recursos naturais, estamos diante de uma emergência sobre que tipo de humanos seremos nas próximas décadas. E o motivo disso é a nova era da internet em que já vivemos, diferente da World Wide Web, o conhecido www, quando a grande rede era apenas uma massa gigante de dados, da qual podemos dispor a nosso bel prazer e necessidade, trazendo informações, soluções e conhecimentos.

Com a ascensão meteórica da Inteligência Artificial, nessa nova internet, não somos nós que buscamos a informação. As informações nos buscam. Pra entender melhor: como você chegou a este meu artigo? Foi uma notificação no seu celular na qual clicou? Foi um post em alguma rede social que te trouxe aqui? Que algoritmo te puxou para ler estas linhas?

Só esta simples constatação já mostra o quanto nossa vida e nossas ações já estão condicionadas pelos algoritmos. E não é só isso. Com o desenvolvimento dos chamados LLMs – Large Language Models – , que são ferramentas de IA que ingerem e geram informação, por conta própria, foi possível criar o ChatGPT, por exemplo. O que esta tecnologia faz é aprender com base numa quantidade inimaginável de informações de bibliotecas inteiras em texto e milhões de páginas da web, e prever palavras ou sequências com distribuição probabilística, gerando conteúdos totalmente novos.

Isso é tão revolucionário quanto a máquina a vapor e o automóvel, que mudaram radicalmente o mundo e a forma como vivemos há mais de um século! Seus usos foram tantos e tão fundamentais para a forma como nos organizamos como sociedade e economia, que passamos a depender totalmente do petróleo para viver, até descobrirmos que estávamos acabando com o planeta para isso.

Em sua disputadíssima palestra por aqui, Amy Webb, uma das mais aclamadas futuristas do nosso tempo – e que nos presta um maravilhoso serviço gratuitamente todo ano ao divulgar seu relatório de tendências –, mostrou trechos do primeiro press release da Open AI em que a empresa dizia que o ChatGTP “era muito perigoso para ser lançado, pois havia preocupações quanto à sua segurança”. Bingo! Amy Webb pegou no meu principal ponto de desconforto enquanto eu assistia, na véspera, ao painel com Greg Brockman, CEO e co-fundador da Open AI.

Ele falou à beça das inegáveis maravilhas do ChatGPT, mas não passou nenhuma credibilidade ao responder às questões problemáticas que vêm surgindo, como conteúdos enviesados e os episódios em que a ferramenta fez ameaças ao seu interlocutor – só para citar exemplos que ficaram mais públicos recentemente. “Temos uma equipe trabalhando nisso, todo feedback é importante”, respondeu Brockman.
Então quer dizer que o ChatGPT já vem sendo usado por milhões de pessoas, para uma infinidade de propósitos, e a empresa responsável por ele ainda depende do feedback dos usuários para tratar questões éticas e essenciais envolvendo segurança? Exato.

Os efeitos nocivos das redes sociais na nossa saúde mental foram debatidos em vários outros painéis por aqui. Em quase duas décadas desde que surgiram, mudaram radicalmente a forma como nos relacionamos e consumimos informação. E contribuíram para a epidemia de ansiedade e depressão no mundo todo. É uma amostra de como ferramentas de AI podem nos mudar ainda mais rápido do que as emissões de gases mudaram o planeta.

Logo, a velocidade com que precisamos consertar a falta de responsabilidade das empresas de tecnologia, em especial as de AI, precisa ser bem alta. Não se trata de travar o desenvolvimento de ferramentas como o ChatGPT e uma porção de outras que nos abrem a novas maravilhas. Mas precisamos estar atentos para onde isso tudo está apontando. E começar a agir hoje.

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