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Razões para otimismo

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Ponto de vista

Razões para otimismo


1 de julho de 2013 - 4h09

Conta comigo quantas crises estão em andamento hoje: a crise da Europa, a crise do mercado de trabalho americano, a crise do pibinho brasileiro, a crise dos 20 centavos que virou outra crise muito maior. Ou seja: desde 2008, vivemos em um estado de crise, como definido pelo Harvard Business Review (julho/2009), num texto brilhante de Heifetz, Grashow e Linsky.

2013 tem sido um ano duro, difícil e arrastado em que o estado de crise chegou ao Brasil num movimento bem mais forte do que a tal marolinha. Mas, como diz o velho clichê, toda crise traz em si ótimas oportunidades. E eu adoraria que o ano ficasse marcado também, além dos adjetivos acima, como o ano em que a discussão sobre preço finalmente perdeu fôlego e começou a ganhar espaço uma conversa sobre valor.

Até onde eu consigo enxergar, a partir da entrada da China no mercado econômico mundial, toda discussão passou a ser sobre preço. Daí em diante, todo mundo foi obrigado a encontrar um jeito mais barato de produzir. Da indústria de alimentos aos bancos de investimento. Também segundo as minhas próprias teorias conspiratórias essa é a razão do nascimento da crise de 2008 que teima em não passar até hoje. Se é que vai passar algum dia.

E qual o problema da discussão sobre preço? Primeiro, não importa o que você faça, alguém sempre vai encontrar um jeito, lícito ou ilícito, de fazer por um preço mais baixo. Depois, essa é uma discussão apenas sobre o curto prazo. E o que é bom pro curto prazo não necessariamente é bom pro médio prazo (longo prazo então não vou nem tentar discutir). Pior, muitas vezes o sucesso de curto prazo é a razão do fracasso no longo prazo. E nesse tema nenhum vilão tem sido tão raivoso quanto o mercado de capitais e seu foco cada vez maior no curto curtíssimo prazo.

Mas alguns exemplos de que o valor (em vez do preço) volta a ser tema de algumas conversas é o que me trazem as tais razões para otimismo do título desse artigo.

O primeiro desses exemplos é que a gigante Unilever rompeu uma tradição das companhias de capital aberto e decidiu parar de publicar resultados trimestrais. Uma das razões pra isso é que, se o número não viesse como o mercado e seu foco de curto prazo estavam esperando, a ação era castigada, não importando o quanto do lucro era resultado de um bom trabalho junto ao consumidor, ao distribuidor ou ao lojista. Além disso, e essa foi outra razão, os ciclos de fabricação, distribuição, venda e marketing não acontecem em 90 dias, portanto, decisão brilhante do presidente Paul Polman, não havia porque se guiar por resultados trimestrais. Mais um fato pesa a favor dessa decisão: segundo a revista Exame, em 1975, a média de tempo que um acionista ficava com uma ação era de sete anos, em 2010, quatro meses. Ou seja, na soma total das decisões da Unilever: construção de valor 1 x 0 discussão de preço.

Outra evidência de que existe espaço para a construção de valor e, quando bem feita, o resultado no médio prazo é fenomenal, atende pelo nome de Grupo Boticário. Fico imaginando quantas vezes o senhores Arthur e Miguel tiveram que resistir ao canto da sereia para abrir o capital. Não só não fizeram como decidiram empreender uma bem sucedida diversificação de negócios que levou à criação de 3 marcas e o lançamento de mais de 1500 produtos em 2012. Sem dúvida essa decisão trouxe desafios e demanda ajustes constantes no meio do caminho, mas também levou o Grupo a ser a empresa que mais cresce no competitivo mercado de beleza do país. Se a empresa tivesse o capital aberto, como será que esse ditador chamado “mercado” reagiria? Em outras palavras: construção de valor 2 x 0!

A terceira evidência vem da Organização Mundial de Comércio, talvez a instituição responsável pelo que de mais transacional existe no mundo: quanto um país vende para outro e vice-versa. Pois é, você sabia que desde o ano passado a OMC tem dois filtros para analisar as transacões comerciais entre os países: por volume e por valor? Sim, até a OMC começa a fazer suas análises não só baseadas no preço por tonelada e volume embarcado, mas também no valor do que é exportado. Só por curiosidade, olhando para volume, a China é o nosso melhor parceiro comercial, mas se o foco for valor, esse título vai para os Estados Unidos. E aí, quem você prefere?

A última evidência, e que pra mim é a mostra de que estamos no fundo do poço da discussão sobre preço, vem de uma declaração recente de Warren Buffet dizendo que está cada vez mais difícil ganhar dinheiro. Se está difícil para o Oráculo de Omaha, imagina para cada um de nós que vive numa indústria que comercializa o intangível, que tem aceitado passivamente a discussão sobre preço (e a consequente diminuição de rentabilidade) e para isso tem piorado sensivelmente a qualidade do que produz e entrega para seus clientes.

Essas todas são as razões do meu otimismo ainda em 2013. Quando se bate no fundo do poço, o próximo passo é começar a construir a escada que nos levará para fora dele. E essa escada, na minha opinião, é a conversa sobre valor. Sobre o valor do nosso trabalho para as marcas, sobre o valor das marcas para a vida das pessoas, sobre o valor dessas pessoas para a existência e o sucesso das marcas. Construir valor é a verdadeira vocação da nossa indústria. E quando o cenário, por mais crítico, difícil e cercado de crises que seja, nos empurra para exercer a nossa vocação, nada pode dar errado.

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