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Ponto de vista

Compre aqui. Temos sacolas plásticas de graça para você


27 de janeiro de 2012 - 3h36

Desde o dia 25 de janeiro, supermercados apoiados pelo Governo do Estado de São Paulo e pela APAS (Associação Paulista de Supermercados), prometem deixar de usar sacolas plásticas e passar a oferecer sacolas alternativas que serão vendidas. Lançaram uma campanha em que afirmam ser necessário não sufocar o Planeta. Toda medida destinada a melhorar a qualidade de vida e a preservação ambiental é bem vinda. Mas esta revela um lado perverso da questão do marketing da sustentabilidade e a própria ação dos principais interlocutores. A sensação que se tem é de que a medida redime os pecados e, automaticamente, tornam-se todos bons defensores do meio ambiente.

O caso das sacolas resvala nessa história. As sacolas plásticas têm sido demonizadas e ganharam o espírito de causa como se fossem de uma matéria prima diferente de outras tantas. Questiona-se a sacola plástica com o argumento de que são descartáveis e demoram muito tempo para se decompor. Mas não se questiona o conceito do descarte, este sim um problema sério. Nisso, os atores principais estão de mãos dadas.

O Governo do Estado de São Paulo, por exemplo, mantém um programa chamado LEVE LEITE. O programa entrega anualmente 130 milhões de litros de leite em embalagens plásticas descartáveis. São 260 milhões de sacos plásticos descartados anualmente. Mas como alguém quer combater o descarte de sacolas plásticas distribuindo embalagens descartáveis no mesmo material que critica? A explicação deve ser a de que saco de leite não é sacola. Delírio. Governantes estão fazendo jogo de cena e agindo de maneira simplista. O mesmo jogo que tantas vezes vimos na eleição de tentar surfar numa onda e se aproveitar dela. Política, enfim. Nada de sustentabilidade. Se adiantarmos o tema vamos buscar quantas escolas tem programas de educação ambiental, reciclagem, se as merendas destas escolas são compradas em embalagens não descartáveis e outros tantos olhares.

Caso pior é o dos supermercados. Estes empunharam a bandeira ambiental. Dizem que querem ser ambientalmente corretos. Mas ser ambientalmente correto significa, de maneira didática, cumprir os 3 Rs: reduzir, reutilizar e reciclar. Para reduzir o descarte o ideal é utilizar embalagens retornáveis – como as sacolas que eles sugerem que sejam utilizadas como redutor de impacto ambiental. Brilhante. Vamos além. Os supermercados deveriam propor então um pacto pelas embalagens retornáveis e reutilizáveis. Deveriam priorizar potes plásticos de sorvetes que as donas de casa reutilizam para guardar uma série de coisas: de alimentos a parafusos. As garrafas de cerveja retornáveis deveriam retornar às prateleiras no lugar de descartáveis. Refrigerantes em garrafas de vidro ou de PET retornável seriam muito bem vindos. Lembra daqueles potes de doces que sua avó fazia? Bem que poderiam voltar. Potes reutilizáveis em lugar de descartáveis e os copos de requeijão voltando para dentro dos armários.

Aqui não se trata de defender este ou aquele material. Apenas que a diminuição de impacto ambiental se dá com a redução, campo em que retornar e reutilizar andam de mãos dadas. Os supermercados concordam. Tanto que preferem as sacolas retornáveis. Ou será que não? Na verdade, não. Embalagens retornáveis obrigam a fazer as trocas e muitos supermercados teriam custo com isso. Então são ambientalmente corretos surfando na onda das sacolas plásticas que custam para eles. Interessantíssimo. Não assumem custos para embalagens retornáveis e economizam não fornecendo mais sacolas. Tudo pelo meio ambiente e confiando no fato de que este raciocínio não será desenvolvido pelos consumidores. E aí erram feio.

As sacolas plásticas em excesso e sem cuidados necessários são um problema. A própria indústria setorial reconhece isso e desenvolve uma ação para reduzir o seu consumo. Mas é preciso reconhecer que tirar as sacolas – que são reutilizáveis pois substituem os sacos plásticos de lixo, não torna ninguém verde ou ambientalmente responsável. O problema é o descarte. O problema não é o carro, mas os motoristas, as estradas, a imprudência. O risco que governo e varejo correm de serem simplistas é grande.

Vale também mencionar que ao retirar as sacolas de circulação o cidadão que antes as reutilizavam terá que comprar sacos plásticos de lixo. Os mesmos que vão para o descarte. Onde está o ganho ambiental? Sei onde está a perda: no bolso do consumidor. Sem contar que no caso da baixa renda existe o risco de não comprar os sacos de lixo permitindo detritos ao ar livre, sob a chuva, proliferando doenças. As secretarias de saúde recomendam que lixo deve estar envolto em plástico.

Em marketing, sempre dizemos que buscamos longevidade nas ações e que as oportunidades devem estar alavancadas em um processo durável. Só é sustentável o que é verdadeiro e só é verdadeiro o que é sustentável. A campanha para reduzir o uso das sacolas é necessária. Todos concordam. Mas banir imaginando assim criar uma ação de imagem para as redes varejistas é um equívoco.

Uma demonstração disso está na reação dos consumidores. Esperei alguns dias e fui olhar o que estava acontecendo. Vi gente pegando aos montes sacos de frutas que são distribuídos à vontade para guardar suas compras em uma das maiores lojas de São Paulo. Mais frágeis, são utilizados em duplicidade. Também nas pequenas redes vi as sacolas sendo distribuídas e as consumidoras dizendo que era melhor assim. As lojas são na periferia e quem falava isso tinha ido ao supermercado a pé. E vi um sujeito num supermercado próximo a Cotia dizendo: aqui a gente defende os clientes – damos a sacolinha de graça. Cada um com seu marketing e este vai se tornar um diferencial.

Acreditar que os consumidores vão parar de questionar o tema nas sacolas é infantilidade. Se querem ser ambientalmente responsáveis e fazer o trabalho completo, assumam a responsabilidade de priorizar nas prateleiras os produtos retornáveis e reutilizáveis. Negociem com as indústrias. E com o governo, que deve dar o exemplo e ser um agente fomentador desta ação trazendo o conceito de retornabilidade para dentro de seus projetos e programas. Eduquem para reduzir o consumo desenfreado de descartáveis e o descarte inconsequente. Mais do que ser marqueteiro este é o momento de ser cidadão. E, cá entre nós, não conheço marketing melhor.

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