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As reações de Toronto sobre a Aceleração 2.0

As reações em Toronto foram muito positivas, com algumas perguntas sobre a viabilidade do modelo de negócio em função da sustentabilidade do ecossistema empreendedor e sobre os ganhos de existirem soluções co-criadas por Startups e Corporações.


14 de novembro de 2019 - 11h33

 

 

Por Clara Bidorini (*)

 

Designers em geral, mas sobretudo quem é especializado em serviços, são quase obsessivos por testar e iterar. É assim que validamos uma ideia, solução, produto ou serviço. No caso que descrevo a seguir, são quase três anos de aperfeiçoamento do nosso modelo de aceleração da melhor maneira que os designers conhecem: obviamente testando e iterando, testando e iterando. Até que, com um pouco de frio na barriga, resolvemos apresentá-lo internacionalmente para uma plateia agnóstica, mas bem mais detalhista. Formada não apenas por service designers brasileiros, que até poderiam conhecer o contexto, mas integrantes canadenses, paquistaneses, americanos, australianos, alemães, dinamarqueses, suecos…Ou seja, resolvemos seguir testando e iterando.

 

O que fomos fazer em Toronto? Para sermos mais específicos, apresentar a nossa jornada ao público da Service Design Global Conference 2019, em busca de interação, discussão crítica e conexão, para iniciarmos uma série de diálogos com outros ecossistemas ao redor do mundo.

 

O tema da conferência de 2019 pregava isso: “Building Bridges” (construindo pontes). E caiu como uma luva sobre o trabalho que estamos realizando como aceleradora corporativa. Um modelo que nos coloca no mapa das novidades relacionadas tanto ao design de serviço quanto à inovação aberta. Apresentar modelos híbridos é sempre um desafio: em geral, demoram um pouco a serem aceitos e compreendidos. Mas é sempre preciso um primeiro passo. E este foi dado na conferência, após a realização de sete programas de aceleração neste formato.

 

Com o título “O que está faltando para aproximar startups e corporações”, dividimos o nosso modelo com a comunidade, para que mais designers pudessem conhecê-lo, utilizá-lo, refletir sobre ele e, quem sabe, iterá-lo. Fomos buscar a criação de ecossistemas mais sustentáveis entre startups e corporações. Tudo isso, a partir de uma reflexão: é possível exportar modelos de aceleração de um ecossistema para o outro? Por exemplo, importar para o Brasil o modelo do Vale do Silício?

 

Enquanto service designers, vindos de consultoria com abordagem holística e centrada no ser humano, acreditamos que não. Aí começa a discussão sobre contexto, fenômeno, meios, tão preciosa para designers e tão pouco interessante para o universo corporativo, no seu corre corre da eficiência, da procura por resultados.

 

Após a palestra, falando com designers e executivos de corporações presentes no evento, ficou claro que as corporações em geral compartilham de problemas parecidos aos nossos. Silos, metas de sucesso desalinhadas da criação de diferencial, interesse em processos e resultados mais que em lições aprendidas, turnover excessivo. Ao mesmo tempo, aceleradoras e alguns investidores afirmaram que têm gastado muita energia tentando fazer funcionar modelos tradicionais em seus países. Com isso, coletamos mais evidências que não existe uma fórmula mágica e que, se não olharmos para as diferenças dos contextos, a aplicação de modelos de aceleração pode se mostrar ineficiente.

 

Ao longo da palestra, falamos do modelo do Vale do Silício, que chamamos carinhosamente de Aceleração 1.0. Esse modelo conta com o apoio de corporações, de investidores com cultura mais propensa ao risco (diferente de investimento em imóveis e produtos bancários), com pipe de vendas bem mais curtos e com o suporte da comunidade e de universidades. Mas será que esse é o melhor modelo para o contexto brasileiro ou existem outros caminhos?

 

Olhando para o Brasil, para a cultura avessa ao risco, a abundância de capital do setor público com seus processos burocráticos sem fim e do setor privado com sua dificuldade de contratação de startups, notamos a necessidade de apoiar os empreendedores na construção de produtos e serviços que possam sobreviver à quase ausência de IPOs e aos lentíssimos pipes de vendas. Nossa resposta foi iterar a Aceleração 1.0 para uma segunda versão. A Aceleração 2.0.

 

Ele funciona como qualquer programa de aceleração corporativa, utilizando recursos de grandes corporações para incentivar a aceleração de Startups, mas tem duas premissas, cuja combinação mostrou uma enorme eficiência ao longo da nossa experiência: zero equity e abordagem de design de serviço.

 

O primeiro ponto é mais conhecido. Para investimento em série A, por exemplo, fundos de investimento normalmente procuram startups e scale ups nas quais fundadores e cofundadores sejam donos de aproximadamente 80% do equity. Na modelo aceleração 1.0, as aceleradoras podem ficar com até 15% do equity em troca da realização de mentorias, networking, processos de aceleração. Uma aposta na qual quem sai perdendo muitas vezes são os empreendedores. Na ponta da corporação, por sua vez, mesmo sem receber ações, a aceleração traz vantagens, visto que, a partir da proximidade com as startups, observamos mudanças positivas como o compartilhamento de novos valores e a realização de acordos comerciais mais diretos e melhor negociados com as startups.

 

Já a abordagem de design de serviço, frequente no Lean Startup, procura trazer uma abordagem mais holística: o Brasil é um país continental e com muitas características regionais, processos sobrepostos, burocracias específicas e inúmeros pontos de contato a serem repensados. Foi assim que nasceu o service design bootcamp baseado em design de serviço e abordagem holística. A visão a partir do design permite não apenas a criação de serviços e produtos relevantes para as corporações (pivotamos o MVP para MVS – serviço minimamente viável), como também a prototipação dos mesmos diretamente com a corporação. Sobretudo se o modelo de negócio da startup é B2B ou B2B2C. Entendemos que o ciclo “Construir – Testar – Validar” do Lean Startup, que foca muito no produto, pouco considera o esforço do processo de venda, que é essencial no contexto de um país sem cultura de risco. Por isso iteramos o ciclo para “Cocriar – Testar – Validar”, onde cocriar envolve pesquisa centrada nas pessoas e nas necessidades da corporação e validar inclui prototipação com clientes (corporativos e finais).

 

Fica como responsabilidade da aceleradora evitar que os produtos sejam desenhados on demand e que não possam ser escalados. Assim como fica como responsabilidade dos designers de serviço garantir uma construção holística que não conta apenas com a solução do problema de mercado (abordagem Lean), mas considera as dificuldades de vendas, o mapeamento de todos os processos e a satisfação de seus vários interlocutores. Para tangibilizar toda essa riqueza, em Toronto, apresentamos o case da aceleração da Blu365 e os passos que demos em conjunto ao longo do processo com a Visa e os bancos brasileiros.

 

Sob o ponto de vista da corporação, um primeiro e crucial desafio: como incentivar executivos e gerentes das áreas de negócio e estrutura (jurídico, marketing, compliance, compras) a se envolverem na aceleração? Foi para responder a essa provocação que surgiram os workshops de alinhamento de objetivos estratégicos de inovação aberta, os sprints de design focados em preparar as áreas para trabalhar hands-on nos projetos com startups e o nosso Mentorship Program, pensado para tornar os funcionários da corporação mentores ativos ao longo do programa de aceleração – nos últimos 2 anos, treinamos mais de 170 mentores ao longo de dois programas. O Mentorship também é válido para parceiros e fornecedores das corporações, o que potencializa o alcance da aceleração.

 

As reações em Toronto foram muito positivas, com algumas perguntas sobre a viabilidade do modelo de negócio em função da sustentabilidade do ecossistema empreendedor e sobre os ganhos de existirem soluções co-criadas por Startups e Corporações. Olhando para trás, o friozinho na barriga deixa espaço a uma vontade muito grande de tecer mais relações com os países emergentes e os mais desenvolvidos para propormos novas alterações e alcançarmos outro estágio evolutivo do ecossistema, a equidade. Trabalhar para o ecossistema não significa apenas trazer números de crescimento e métricas de sucesso, mas também a criação de um relacionamento saudável, coeso e sinérgico entre todos os players do mercado, de diversos países, para que se desenhem ótimas soluções. Notem que em momento algum na redação desse texto deixei de usar o plural, porque a mudança é uma responsabilidade coletiva, assim como sua criação. Sem dúvida o legado será um ecossistema mais inovador e sustentável.

 

(*)Clara Bidorini é Head de Corporate Venture na Kyvo Design-Driven Innovation

 

 

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