Opinião: menos Kotlers e mais Bowies

Meio & Mensagem
28 de janeiro de 2016 - 8h18

Por Eduardo Tracanella,

Dois mil e dezesseis tem tudo para ser inesquecível.

Só que inesquecível é um adjetivo em cima do muro. Qualifica algo que vai ficar na memória, mas, na largada, não sorri nem chora. O que é uma oportunidade.

Tenho a sensação de que 2015 ficou inacabado. Foi um ano de transição. Um ano teaser. Plantou as sementes para as transformações mais profundas que se iniciam agora.

Este é um ano de se rever fundamentos e valores — de antes de se definir pessimista ou otimista, se definir a ótica pela qual queremos viver e quais os parâmetros de escolha. 2016 não vai ser fácil. Porém, só vai ser deprimente se assim o quisermos.
Se por um lado não é ano de inventar moda, por outro é ano de se reinventar. Se por um lado a crise econômica nos espreme a fazer menos, por outro os acionistas esperam que façamos mais e melhor com menos.

E esse é um viés propositivo para este ano. Entender os fatores externos também como catalisadores de mudanças. Aproveitar que a conjuntura já chutou as portas do status quo para entrar no jogo e fazer diferente.

Fazer a$ escolha$ certa$ será estrutural e premissa para se construir uma jornada eficiente. Porém, daqui para frente, ser menos Kotler e mais David Bowie, é o que pode fazer toda a diferença. Digo isso porque a técnica já conhecemos. O que está nos manuais já lemos. Os cases já decoramos. Temos agora de entender genuinamente sobre pessoas. Algo que exige desprendimento, humildade e uma boa dose de sensibilidade.

É tempo de fazer um novo set-up. Repactuar a ambição e os fatores de sucesso. Não é mais sobre coisas que ecoam somente no mercado publicitário ou que soam geniais apenas nas salas de reunião. Minha provocação é sobre genuinamente se construir algo que seja memorável a ponto de fazer parte da vida e da conversa das pessoas.

É sobre entender a cultura pop para poder fazer parte. É investir tempo para entender o que está por trás dela, para quem sabe um dia estarmos à frente. Bowie diria que não é mais somente sobre publicidade, é sobre tudo, inclusive publicidade.

Hoje, as marcas não concorrem mais somente entre elas. Tampouco as agências de publicidade entre si. Pode-se fazer o melhor filme publicitário de todos os tempos e veicular no break mais agressivo da história. Se o chat no WhatsApp estiver mais divertido: fail. Se o meme na timeline for mais relevante: fail.

Dois mil e dezesseis não permitirá corrigirmos histórias medianas com produções caríssimas. 2016 não dará espaço a marcas simpáticas se não forem empáticas. Ser mais eficiente passa também por esse entendimento e não somente por corte de custos. Liderar essa virada, esse novo jeito de pensar e construir marcas, não é trivial. Os modelos de negócio, indicadores de sucesso, os baselines, as fórmulas de pensar e agir, tudo já está exaustivamente testado.

Precisamos de menos especialistas e catedráticos e de mais gente multicultural. Precisamos de menos cagadores de regra e de mais gente a fim de arriscar e fazer parte de um modelo beta, onde o erro e o acerto têm valor. Recrutar Bowies significa valorizar não somente a capacidade técnica, mas a adaptabilidade, o talento e a coragem para construir o novo e ser diferente.

Enquanto pensarmos apenas em 2016, algum Bowie estará pensando em 2020. Essa é a discussão. Relevância hoje não é garantia de relevância futura. Sobreviver ao hoje, com todas as dificuldades que temos pela frente, tem de significar construir a mudança, ficar mais leve para ir mais longe e por mais tempo. Chegar antes, hoje.

“Pense bem, a vida é como ir na direção contrária em uma esteira rolante. Caminhe e você fica parado. Fique parado e você retrocede. Para seguir em frente você precisa correr.” Como ele cantou, “eu disse que o tempo pode me mudar, mas eu não posso enganar o tempo.”

Dois mil e dezesseis tem tudo para ser inesquecível. 2020 também.

Eduardo Tracanella é superintendente de marketing institucional do Itaú-Unibanco