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19 de dezembro de 2019 - 7h30
Por Vinícius Picollo (*)
No final de novembro de 2019 a estilista, apresentadora e influencer Ana Paula Xongani, colocou em xeque a ação de marketing de uma grande empresa por ter recebido um kit de maquiagem que destoava completamente do tom de sua pele. O kit veio nominal a ela e a blogueira, que é uma mulher negra retinta, questionou a posição da empresa quanto à invisibilidade das mulheres negras na publicidade.
Conhecer seu público (e neste caso, o público do público) e estar atento ao comportamento do consumidor são elementos básicos para qualquer profissional ou empresa cujo core seja marketing. As ações de marketing são pensadas para atrelar valor, diferenciação e com isso vantagem competitiva no mercado.
Apesar do comportamento do consumidor estar em constante mudança e de diversas pesquisas apontarem que a internet transformou completamente o perfil de quem consome, algumas marcas ainda caem na armadilha de retratarem seus clientes em estereótipos.
As fronteiras entre grupos que têm interesses e valores em comum é muito menos nítida hoje em dia. Separar pessoas apenas por regiões, classe social, idade já não é mais o suficiente para atingir o alvo. Gostos, hábitos e valores mudaram. O alvo é móvel e ambivalente.
Os consumidores hoje têm muito mais poder de escolha e buscam a individualização, têm menos medo de mudar de ideia, de vida e direção. Os estilos de vida e hábitos são mais maleáveis e preferências mais líquidas.
Pessoas procuram marcas que validem suas escolhas e valores. Não enxergam mais marcas e produtos através do viés da praticidade, mas sim como aliados, parceiros na construção de sua identidade.
Uma pesquisa feita pelo Kantar IBOPE Media, especializado em gestão de investimento de informação, aponta que marcas ainda estão presas a estereótipos antigos e com isso, perdem oportunidades de se tornarem aliadas de seu público.
Em um recorte específico no público feminino, por exemplo, a pesquisa aponta que 76% das mulheres acreditam que o modo como são retratadas na publicidade foge da realidade. Nesse mesmo cenário, homens falam 7 vezes mais e aparecem 4 vezes mais que elas nos anúncios, segundo o Ad Reaction 2019.
Não basta representar, é preciso representar corretamente. Insistir em retratar estereótipos na comunicação é negligenciar o cliente e o que de fato importa para ele.
Planejar ações ou campanhas de dentro de um escritório em uma megalópole direcionadas a um público que você mal conhece é certeza de fracasso.
Um bom exercício para não cair nessa falácia é justamente observar, estudar e apostar em uma rede diversa de influenciadores digitais. Essa é premissa do boom que os nano, micro e médios influenciadores vem experimentando nos últimos tempos. Eles têm a capacidade de dialogar com diferentes audiências, que até podem ter pontos de interesse em comum, mas com suas particularidades (aquele velho slogan do Free: “Cada um na sua, mas com alguma coisa em comum.”) mas conseguem se conectar a muitos por ter autenticidade no diálogo.
Eles pode até ter pontos de interesse de consumo em comum, mas mantém estilos de vida completamente peculiares. A diversidade habita no modo como vão inserir o tal produto em seus costumes,mantendo a originalidade que os caracteriza como influenciadores.
Entender a diversidade implica em ter empatia e olhar apurado O consumo atua como uma espécie de organizador na selva de oportunidades e informação em que vivemos e a forma como usamos isso pode servir como fator de inclusão ou exclusão em nossa sociedade. É preciso ter o cuidado de sempre lembrar que o mercado é feito para e por pessoas. Não à toa que construir pontes sempre exigiu mais cuidado e planejamento do que tapar buracos ou erguer muros.
(*) Vinícius Picollo é CEO da Clooset