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Você precisa se isolar. Sua marca não

Como a psicologia comportamental dá pistas inequívocas para sua marca criar diálogos com a comunidade neste momento.


2 de abril de 2020 - 8h55

 

Por Fernando Campos (*)

De um dia para o outro, a comunidade global se viu na trincheira, sem aviso, sem sirene, sem preparo. Ainda que soubéssemos da ameaça, a verdade é que a velocidade com que o lockdown se impôs sobre uma parte considerável da nossa sociedade foi estonteante.

E uma pergunta ficou latente para nós aqui da Santa Clara: o que as empresas precisam para em, curtíssimo prazo, reagir a crises intensas, amplas, sistêmicas inesperadas e de grande potencial destrutivo tanto econômico quanto social? E como fazer para que as correções de rumo sejam feitas da forma mais equilibrada e ágil possível?

Para responder essa questão, fizemos um task force brutal, juntando as melhores mentes, muitos papers e artigos, remodelamos as dinâmicas de produtos estratégicos que já tínhamos no portfólio, e assim nasceu a metodologia CRISE EM 3 ATOS®.

Uma tese central embasa esta metodologia: a percepção de que os sentimentos, reações, ressignificações sociais e culturais que brotam imediatamente quando um evento de tal magnitude acontece não são estanques. Ou seja: o que sentimos, fazemos e pensamos no dia seguinte a um evento destes vai evoluir e se modificar ao longo dos dias, semanas e meses seguintes. E que essa evolução contempla, pelo menos, 3 fases (ou atos) distintos.

A primeira é a fase do impacto.  Nos dias e semanas que sucedem a um cataclisma, voltamos psicologicamente no tempo, como espécie e como indivíduos. Como espécie, retornamos à pauta e ao sistema de prioridades de nossos antepassados de milhares de anos atrás: priorizamos sobrevivência. A nossa, dos nossos entes queridos, da comunidade e – consciente ou inconscientemente – da espécie como um todo.

O retorno aos níveis mais básicos de hierarquia das necessidades essenciais (a clássica teoria da Pirâmide de Maslow) traz também um retorno aos sentimentos mais primitivos e infantis. Passam a predominar em nossa psique: medo, raiva, pena, tristeza, incerteza. A consultoria Stilingue, que traz ferramentas sofisticadas de social listening, detectou claramente estes sentimentos nas últimas semanas.

Trazendo para o branding, uma análise dos valores e personalidade da marca no período pré-crise nos auxilia na decisão de qual (ou quais) desses sentimentos escolhemos para conectar a marca. Sempre como “healer” de uma destas tensões. Se um dos valores da marca é a sustentabilidade, podemos potencializar esse valor para equilibrar sintomas de raiva ou pena, por exemplo. Se é uma publisher brand, pode ser mais adequado focar no alívio da incerteza. Metodologias de arquétipos e ladderings de marca ajudam a tornar este processo mais assertivo e rápido.

Passado o primeiro ato, vem a adaptação. Faço aqui uma observação importante: não existe data marcada para que uma fase evolua para a próxima. Além disso, perceberemos “flashes” da segunda fase invadindo a primeira em clusters específicos da sociedade, antes que possamos de fato perceber que há massa crítica suficiente de mudança de atitudes, interesses e emoções para que possamos considerar que mudamos de fase. Neste final de semana você sofreu com as notícias terríveis vindas do mundo todo, mas também se divertiu encontrando seus amigos de uma forma nova, certo? É assim mesmo.

Nesta etapa, as emoções do impacto inicial seguirão se manifestando, em especial estimuladas por notícias e imagens impactantes da crise, que permanecerão se repetindo na mídia por muitos anos (vide 11 de Setembro). Porém, elas abrem espaço para que novas manifestações apareçam e passem a ser o “novo normal” da sociedade.

Estas manifestações são, prioritariamente:  a criatividade, a ressignificação, a surpresa e a resiliência. Novamente o exercício prático é o de conectar aspectos legítimos da marca a cada uma destas manifestações. Aqui, mais do que a personalidade, é o posicionamento e a proposta de valor que devem ser revisitados por um novo ângulo. Até mesmo ofertas comerciais, extremamente perigosas e a princípio desrecomendadas no ato 1 podem achar lugar e forma adequados para acontecer, ainda que de uma maneira totalmente nova. O consumidor deveria perceber a marca se redescobrindo ao mesmo tempo que ele próprio. Daí virá a identificação.

E, por fim, vem a antecipação, o terceiro ato.  Esta fase é a “luz no fim do túnel”, o momento em que a sociedade percebe que existe uma expectativa de mínimo retorno à alguma normalidade. Apesar disto, os sentimentos predominantes aqui não são todos necessariamente positivos. Na prática estamos falando de um grande sentimento dominante que se apresenta nos polos negativo e positivo simultaneamente, como em um Yin/Yang:

Do lado negativo, temos o fator econômico como protagonista e o questionamento de como atuar dentro dessa nova dinâmica social. Por outro lado, a expectativa positiva traz a revisão, retomada e reconstrução. Uma energia ativa que deve ser incorporada pelas marcas em seus discursos.

É uma etapa marcada pelo fim do confinamento (físico e espiritual), retorno às atividades rotineiras de trabalho, família. Vai requerer uma readaptação. As pessoas vão questionar o próprio consumo: o conceito de essencial e supérfluo pode mudar.

Neste momento um processo de revisão completa dos valores e personalidades da marca se faz necessária. A marca terá mudado para sempre, como cada um de nós, e precisa como nós respirar fundo e ter a coragem de aceitar sua nova identidade. Sob pena de viver para sempre em um mundo que não existe mais.

Deixo aqui uma provocação ou se preferir uma reflexão: sua marca e empresa (e, especialmente, você) estão prontos para isso?

(*) Fernando Campos é Sócio Fundador e Chief Creative Officer da Agência Santa Clara

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