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Empreendedor, você conhece bem seu credor?
Quanto mais você for transparente, melhores serão as condições que as instituições terão para avaliar o risco real e conceder capital.
Quanto mais você for transparente, melhores serão as condições que as instituições terão para avaliar o risco real e conceder capital.
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26 de agosto de 2020 - 7h31
Por Gabriela Gonçalves e Marcos Perillo (*)
Existe um preconceito em contrair dívidas. Buscar crédito no mercado financeiro parece sempre ser um sinal de que as coisas não estão indo tão bem quanto o planejado. Pedir empréstimos é, para muitos, constrangedor. Mas por que tem que ser assim? Dívidas deveriam ser, na verdade, uma decisão estratégica pensada desde o momento do plano de negócios. Afinal de contas, dívida saudável faz parte de uma estrutura de capital bem equilibrada.
Se você é empreendedor, sabe muito bem da importância que a captação de recursos tem em propiciar um crescimento acelerado do seu negócio, uma característica chave de praticamente todas as startups de sucesso. Se financiar desde o início com capital exclusivo dos próprios empreendedores mostra-se quase sempre uma alternativa inviável, considerando-se os investimentos demandados em capital de giro, equipamentos, aquisição de talentos, estratégias de crescimento e outros gastos previstos, além dos imprevistos.
Se você é daqueles que acredita que o financiamento de startups deve se dar apenas através da venda de participação acionária, lembre-se que abrir mão de suas ações pode custar (bem) caro no futuro. Na prática, os sócios estão abdicando de uma fatia do negócio que pode vir a valer milhões em um futuro não muito distante. Mais ainda, as captações de equity envolvem, além da entrada de terceiros no conselho consultivo e influência direta na governança da startup, um dispêndio de grandes esforços e tempo para serem concretizadas, aspectos que devem ser levados em conta pelo empreendedor na hora de considerar alternativas de financiamento. No fim, captar investimento através de equity pode até ser mais seguro e faz parte sim da vida de uma startup, mas ele é mais caro e, invariavelmente, tem contrapartidas econômicas e políticas para o novo sócio.
Para evitar arrependimentos, encare as linhas de dívidas sob outro prisma. Dívida, como já mencionado, é estratégia. Faz parte da estrutura de capital. Uma startup, assim como qualquer outra empresa, possui uma série de opções para se financiar, seja através de capital próprio (capital dos sócios) ou de terceiros (capital advindo de credores). E todas elas envolvem custos. Fundamentalmente, as opções de financiamento por capital próprio sempre serão as mais custosas pelo simples fato de que o retorno almejado pelo terceiro é maior, dado o seu nível de risco. Afinal, se você, empreendedor, almeja um retorno menor do que os seus financiadores, não há porque se financiar por terceiros, certo?
O capital próprio não tem data ou certeza de saída e, por consequência, vem com uma expectativa maior de retorno. Já os credores querem ter certeza de quando e como terão o retorno do capital e a expectativa de ganho tende a ser significativamente menor do que a dos sócios. O custo de oportunidade do empreendedor é enorme e dos investidores em equity também. O segredo aqui é você conhecer bem o seu negócio, sua capacidade de pagamento e, assim, encontrar o equilíbrio ideal entre as duas fontes de captação.
Para cada startup, e para cada momento, existirá uma ótima combinação entre as opções de financiamento por capital próprio ou por capital de terceiros. Para se aproximar ao máximo desse “mix” ideal, o empreendedor deverá, em primeiro lugar, se mostrar aberto para novas alternativas. Deve pesquisar todos os modelos de financiamento e evitar, ao máximo, preconcepções potencialmente enraizadas por informações recebidas de terceiros que nem sempre possuem experiência no assunto. Deve-se ter um conhecimento profundo sobre seu negócio e buscar ter acesso às melhores opções de financiamento do mercado de forma constante.
O segredo da estrutura de capital está no equilíbrio. O capital próprio, aquele que sai do bolso do próprio empresário, acionistas ou do lucro da empresa, é mais caro exatamente por suas expectativas de retorno e risco atrelado. Se enquadram nessa categoria os aportes feitos por fundos de investimento, os quais acarretam diluição acionária. O capital de terceiros, advindos de empréstimos e financiamentos, têm prazo para vencer, implica em saídas de caixa, mesmos que programadas, mas é mais barato. Quanto mais seu fluxo de caixa for previsível, mais você pode recorrer a terceiros. E quanto mais imprevisível, mais dependerá de seus próprios recursos.
Agora vem a primeira e principal dica. Para fechar os melhores negócios na contratação de crédito é imperativo construir uma sólida rede de relacionamento com seus credores potenciais e existentes, e não colocar todos os ovos na mesma cesta. Por um lado, quanto melhor os credores conhecerem as dinâmicas e particularidades do seu negócio, maior será a probabilidade de te oferecem crédito com termos justos e coerentes. Estar próximo a eles fará toda diferença na hora de se desenhar um produto de crédito especialmente para seu negócio e com as melhores condições possíveis. Por outro, quanto mais frentes de contato forem abertas, maior será a gama de opções que terá em suas mãos. Estreitar relacionamento com agentes de crédito, pautado sempre na transparência e confiança, é fundamental.
No ecossistema brasileiro de startups, os CFOs, via de regra, não enxergam o mercado de crédito como uma alternativa de longo prazo. E não deixam de ter razão quando argumentam que as taxas de juros são desanimadoras. Mas o atual cenário está mais favorável com a queda da Selic e, de novo, diluir a participação acionária para abrir as portas a investidores pode se revelar uma alternativa extremamente custosa mais adiante. Por isso, avaliar alternativas de crédito pode e deve estar no radar dos empreendedores e CFOs. Para CFOs, é imperativo conhecer e navegar bem junto as alternativas de crédito. Faz parte da função.
Se você é um CFO não se esqueça que tem o chapéu de guardião da governança corporativa, e deve conduzir as finanças sob dois pilares: transparência e accountability. Prestar contas periodicamente aos seus credores irá trazer muito mais harmonia para o relacionamento e criará um ambiente favorável à negociação de novos empréstimos. Quanto maior for a confiança que tiverem em você, melhores serão as condições do seu contrato.
Portanto, invista na sua controladoria, conheça profundamente seus números, planeje reuniões periódicas, preferencialmente mensais, com as instituições financeiras e seja transparente. E transparência não é só trazer boas notícias. Revise sempre o planejamento estratégico e caso algo saia do inicialmente previsto volte a conversar para repactuar.
Quanto mais você for transparente, não custa lembrar, melhores serão as condições que as instituições terão para avaliar o risco real e conceder capital. Você verá que, ao estreitar relações com seus credores, eles terão maior propensão a emprestar nos momentos bons e também ruins, como estamos atravessando justamente agora com a pandemia. Não esqueça: confiança é a base de sustentação do mercado financeiro. Se ela é quebrada, o mais provável é que as portas se fechem para você.
Dada a importância de se construir uma estrutura de capital multivariada para as startups, que vá além de alternativas de capital próprio, surgem do lado da oferta firmas especializadas em fornecer crédito para empresas inovadoras e em rápido crescimento, historicamente desassistidas pelo sistema bancário tradicional. Nos Estados Unidos, esse já é um mercado bilionário com mais de 40 anos e que representou cerca de 20% do mercado do montante aportado em deals de Venture Capital no país em 2019. Além de vir crescendo, nos últimos anos, a taxas maiores do que os investimentos através de equity.
Trata-se do Venture Debt, um modelo de dívidas estruturadas, não conversíveis, para negócios inovadores e em rápido crescimento. Modelo este que começa a ganhar tração no Brasil. Ele vem se mostrando uma boa opção para que empreendedores consigam captar recursos com custo menor do que o equity, sem diluição acionária, seja entre ou durante rodadas de Venture Capital. O Venture Debt tem como objetivo financiar as estratégias de crescimento das startups e, portanto, é focado no médio a longo prazo.
Os fundos de Venture Debt entendem profundamente o modelo de negócios e os desafios enfrentados pelas startups e, por conta disso, conseguem oferecer um produto que se encaixa em seu momento e ambições, ao contrário dos financiadores tradicionais. Prazos de carência, garantias e remuneração são todos “tailor-made” para startups. É um produto, sobretudo, complementar ao equity que pode ser utilizado entre as rodadas de captação com fundos de Venture Capital, alongando runways e permitindo que a próxima rodada seja captada com um valuation maior, ou na própria rodada, alcançando o montante desejado sem gerar diluição acionária adicional.
Não transforme suas dívidas em um bicho de sete cabeças. Se bem geridas e negociadas, elas são amigas do seu negócio e podem te levar mais rápido ao breakeven e à uma saída exitosa. Conheça bem seus credores. Só assim terá as ferramentas necessárias para fechar bons negócios. Tomar as decisões financeiras certas, especialmente em um período de crise, é o que irá garantir sua subsistência e seu crescimento até chegar a hora da boa colheita. E lembre sempre: confiança e transparência são as chaves para o sucesso!
(*) Gabriela Gonçalves é CEO do Brasil Venture Debt e Marcos Perillo é CFO do Conta Azul
(**) Fonte Foto: Depositphotos
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