Entre a sala de aula e os desafios do mercado
Crescimento da economia exige qualificação do profissional de marketing, mas valor da formação acadêmica só é comprovado na prática
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Roseani Rocha
7 de fevereiro de 2012 - 4h45
Em 2008, estudo realizado pelo Meio & Mensagem em parceria com o Ibope mostrava que 80% dos profissionais de marketing em níveis de gerência ou superiores haviam optado por uma pós-graduação lato sensu. Entre estes, 40% haviam feito um MBA e outros 40%, especialização (entre os que se dedicaram à formação strictu sensu na área, o percentual de mestrados era de 9% e o de doutorados, de 1%). Além disso, já naquele momento, coordenadores de alguns desses cursos classificavam como “fundamental” que os alunos tivessem algum tipo de experiência internacional. De lá para cá, tornou-se mais valorizado o passe de quem, além da pós-graduação feita no Brasil, tenha uma formação complementar em instituições estrangeiras.
No entanto, em um mercado como o brasileiro, essa formação acadêmica baseada num conceito global é adequada às demandas locais e a um cenário como o atual, em que o crescimento de muitos setores é movido pelo mercado interno e pela ascensão de classes? Até que ponto os temas debatidos nesses MBAs e especializações têm ressonância na realidade local e contribuem para o desenvolvimento das empresas e do próprio País?
Para os especialistas ouvidos por Meio & Mensagem, de forma geral, a dedicação ao aperfeiçoamento profissional pela via acadêmica é elogiada. Há quem acredite, todavia, que o próprio fato de os cursos de pós-graduação terem melhorado no Brasil dispense a obrigatoriedade de um título no exterior. André Torreta, da Ponte Estratégia, ressalta a mudança que houve no cenário corporativo conforme a evolução econômica brasileira. Ele lembra que antes muitas das decisões eram tomadas fora do País e os profissionais aqui não precisavam se preparar, estudar. Agências de publicidade que atendiam multinacionais, por exemplo, tinham de trabalhar com material totalmente importado. “A decisão estava lá fora. E hoje isso mudou. Os brasileiros fazem parte da decisão”, diz.
CONSULTOR
Rafael D’Andrea – professor de Marketing do Insper
“De fato, existem muitos cursos que dão titulação lato sensu ou de pós, mas não entregam o que precisam. O ponto é a qualificação das instituições que estão formando os pós-graduandos. Quanto a um doutorado ou MBA internacional, isso é relativo. O MBA em algumas áreas é válido; em outras, o profissional se distancia por tanto tempo do mercado, que a volta é um choque. Aí concordo, em parte, que pode não ser bom. Mas há instituições nacionais que hoje preparam para situações práticas, dão conhecimento aplicado ao profissional de marketing. Uma pós-graduação é e tem sido muito útil às pessoas, até para sua promoção, atualização em networking e do ponto de vista comportamental. Títulos não trazem benefícios ao País; o conhecimento, sim. A questão de crescer com a classe C, D ou A não muda em nada. Grandes pensadores, que são ph.D, vêm da elite indiana e têm projetos de microcrédito, relacionados à classe C. Formação sempre ajuda. Só não vejo necessidade de fazer um MBA fora porque no Brasil há grandes cursos, que não tiram o profissional do mercado.”
ANUNCIANTE
João Batista Ciaco – presidente da ABA e diretor de publicidade e marketing de relacionamento da Fiat
“Existem dois níveis de discussão que permeiam a área de marketing: grandes movimentos globais e as estratégias e execuções locais. Por isso, por muito tempo foi exigido do executivo uma formação internacional que o capacitasse a enxergar a área globalmente para que pudesse executar o marketing local. Hoje, vemos que as estratégias locais ganham espaço e são tão relevantes quanto esta visão internacional. É comum que cursos fora do País usem cases brasileiros como referência. Por isso, o entendimento de estratégias locais de execução do marketing não pode ficar de lado. Quando falamos sobre o comportamento do consumidor, por exemplo, é fundamental termos esta visão local e específica. Apesar de exigir uma boa formação, o que as empresas procuram são profissionais que saibam lidar com características do mercado em que atuam de forma mais objetiva e, geralmente, essa habilidade está em um profissional que tem mais vivência no mercado local. O Brasil tem hoje um desempenho relevante na área de marketing, com grandes cases e grandes marcas que olham o nosso mercado. E isso se justifica por uma série de fatores que vão além de títulos e cursos de formação.”
HEADHUNTER
Denys Monteiro – sócio-diretor da Fesa, especializada em recrutamento de altos executivos
“Com perfil generalista, o executivo de marketing precisa conhecer todo o funcionamento da companhia, desde o conceito do serviço ou produto até logística, impacto ambiental e, principalmente, o consumidor final. O mundo acadêmico não se atualiza conforme as mudanças do mundo corporativo. Porém, isso pode ser revertido a favor do executivo, caso ele mantenha uma educação contínua, atualizações do mercado e sempre se reinventando. A formação acadêmica de qualquer nível tem o papel inicial na construção da carreira. No entanto, o que é avaliado nos candidato são os resultados obtidos durante a vida corporativa. Não dá para afirmar que um ph.D é melhor para uma determinada função do que um graduado ou pós-graduado. Nem podemos pensar que alguém formado em Harvard entende menos de classe C do que um formado em uma universidade local. O mercado valoriza cada vez mais o que foi feito depois de conseguir o diploma. Em 2011, empresas de consumo foram responsáveis por 20% das posições para as quais encontramos os profissionais qualificados.”
CONSULTORA
Luciana Faluba – professora associada da Fundação Dom Cabral
“A revolução tecnológica, que impôs maior velocidade à comunicação, abriu novas possibilidades de se atingir o cliente. Contextos complexos e inovadores exigem práticas igualmente complexas e inovadoras. Para responder a essa demanda, os profissionais precisam de formação consistente e atualização constante. Eles estão ingressando nos cursos de pós imediatamente após a graduação, buscando um melhor preparo para enfrentar o mercado. Assim, os cursos de pós configuram-se como uma “extensão” da graduação e não um diferencial de formação. Esse movimento impulsiona os que buscam uma formação diferenciada a cursar uma segunda pós-graduação e até um curso no exterior. E cabe uma reflexão: qual o verdadeiro sentido de uma pós-graduação? Não seria discutir a teoria a partir de uma perspectiva prática? Mas, como fazer isso se não existe acúmulo de experiência prática? O desafio fica por conta das escolas que precisam proporcionar aos seus estudantes programas que estejam alinhados às mudanças do mercado e que permitam o desenvolvimento de capacidades para atuar nesse novo contexto de negócios.”
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