Meio & Mensagem
12 de abril de 2013 - 3h34
Por Fernando Murad
O comércio eletrônico brasileiro deve encerrar 2013 com faturamento da ordem de R$ 28 bilhões, números 25% superiores aos R$ 22,4 bilhões auferidos no ano passado, mantendo assim sua trajetória de crescimento na casa de dois dígitos. O desempenho robusto demonstra que o setor já conquistou a confiança de uma grande massa consumidora (são quase 40 milhões de e-consumidores, segundo a e-bit), mas ainda existem barreiras a ultrapassar.
Calcanhar de Aquiles das pontocom, o serviço de entrega dos pedidos ganhou os holofotes no primeiro trimestre do ano com a sanção da Lei no 14.951, em 6 de fevereiro, pelo governador de São Paulo Geraldo Alckmin, que alterou a Lei de Entrega (no 13.747), em vigor desde 2009. Bem-recebida pelos organismos de defesa do consumidor e muito criticada pelos agentes do e-commerce, a nova legislação prevê que as lojas virtuais ofereçam gratuitamente o serviço de entrega agendada (com data e horário determinados). O resultado imediato foi um alongamento no prazo médio de entregas.
Desde 2009, o Procon-SP fez cerca de 600 autuações por descumprimento da lei que resultaram em mais de R$ 50 milhões em multas. O atraso recorrente de entregas rendeu, por exemplo, em março de 2012, a suspensão das vendas nos sites da B2W (Americanas.com, Submarino e Shoptime). A decisão, no entanto, foi suspensa por uma liminar concedida à empresa. A B2W, por sinal, anunciou, na semana passada, plano de investimento de mais de R$ 1 bilhão, entre 2013 e 2015, em logística, tecnologia e inovação. A empresa pretende inaugurar 10 centros de distribuição no período.
“Os atrasos podem ocorrer por diversos motivos. No entanto, o fornecedor deve ter uma estimativa desses atrasos e informar o prazo correto de entrega para o consumidor. Na ocorrência de um atraso inesperado a empresa poderá conceder algum benefício ao consumidor tal como um desconto e com isso evitar o desgaste de sua imagem. Apesar de o consumidor ser prejudicado com o atraso na entrega, o fornecedor também pode sofrer grandes prejuízos tendo, em alguns casos, que devolver a quantia paga pelo consumidor e ainda correr o risco de ser processado por perdas e danos”, aponta Daniel Mendes Santana, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Delicado, o tema envolve desde as empresas de comércio eletrônico e seus fornecedores, que precisam investir constantemente em melhoria de processos para atender aos consumidores, até os poderes públicos responsáveis pelo desenvolvimento da malha logística brasileira. Abaixo, a opinião dos profissionais do mercado convidados por Meio & Mensagem para debater a questão e apontar possíveis caminhos.
CONSULTOR
“Os problemas têm duas etapas. Uma, antes do clique. A operação das lojas exige armazenagem de produto, disponibilidade em estoque e sistemas. É preciso investimento para que o processo de compra seja o mais rápido possível. Muitas empresas acham que basta ter o produto e pronto. Mas é só uma ponta. Esse despreparo é um ponto importante, mas vem sendo revertido. As grandes já investiram bastante nos processos operacionais. O segundo é depois do clique e foge do controle. O e-commerce usa a malha rodoviária em 90% das entregas e ela é muito ruim mesmo e o deslocamento nas capitais é difícil. Além disso, a Lei de Entrega sancionada pelo Alckmin foi um susto para o mercado pelo total desconhecimento do setor mostrado pelo Executivo e pelo Legislativo ao exigir que as entregas tenham data e horário marcados sem cobrança por isso. A lei é uma aberração que vai causar a evasão de empresas de São Paulo e o aumento no prazo de entrega. Se antes a entrega era feita em dois dias, agora será em 21. Aí você quebra o principal motivo de realizar a compra online que é a comodidade. Se a lei se tornar federal, será um tiro fatal no e-commerce.”
CONSUMIDOR
“O panorama já foi muito mais trágico. O número de entregas com problemas vem caindo, mas tivemos de chegar ao extremo. No início do comércio eletrônico o consumidor tinha medo de disponibilizar os seus dados. Isso passou, mas ele acabou adquirindo outra fobia: a de não receber no prazo ou de não receber o produto. Se o mercado tivesse adotado as melhores práticas e se preocupado com toda a cadeia desde o início, não teríamos a norma da Lei de Entrega. Quem causou tudo isso foi o próprio mercado, que não conseguiu se organizar. Tivemos medidas extremas, como a contra a B2W (suspensão das vendas), que não entraram em vigor por conta de liminares. Mas após a punição as reclamações no Procon diminuíram 60% e o índice de problemas resolvidos no primeiro contato passou de 50% para 90%. Quando a empresa deseja, resolve. Basta ter disposição e não ficar na retórica. Empresas de fora que têm no respeito ao consumidor sua meta estão ganhando mercado com baixos índices de reclamação mesmo com grandes volumes. As empresas que não respeitam a lei desprezam o interesse do consumidor. Na medida em que respeita e entrega, ganha, pois fideliza e faz o negócio crescer. O respeito demanda investimentos num primeiro momento, mas sai mais barato que desrespeitar a lei.”
ENTIDADE
“Já há algum tempo estamos alertando para uma das grandes barreiras de crescimento do e-commerce que é a malha logística brasileira. O comércio eletrônico, em picos de demanda como Natal e Dia das Mães, já sente a necessidade de um maior desenvolvimento das malhas. Vemos os varejistas online, os sites de e-commerce e as empresas de logística discutindo profundamente essa questão. Grande parte do que está ao alcance das empresas está sendo feito ou discutido, mas eles não são da área de infraestrutura. Além dessa necessidade, começamos a vivenciar situações regulatórias que, em vez de ajudar, por algumas filigranas, passam a ser barreiras. A câmara-e.net é a favor dos benefícios da Lei de Entrega, mas não é a favor de oferecer um serviço de valor agregado, que é mais oneroso, sem poder cobrar a mais por isso. A legislação precisa ser flexibilizada para levar benefícios ao consumidor. Como o e-commerce não pode cobrar pela entrega agendada, agora trabalha com um prazo dilatado como 20, 30 e até 35 dias. Temos percebido uma interlocução positiva no Executivo. Acredito que chegaremos a um meio termo bom para todos os lados.”
EMPRESA
“Encaramos cada pedido como uma promessa e possibilidade de realização de um sonho. Sabemos que há diversas dificuldades logísticas, mas criamos processos internos para minimizar o impacto. O pedido já está pronto para ser transportado depois de duas horas da confirmação de pagamento. Fomos a primeira empresa a ter um posto dos Correios dentro do Centro de Distribuição (inaugurado em novembro de 2010), o que garante redução no prazo. Temos três CDs próprios e com automação. Operamos com uma lista flexível de fornecedores logísticos e controlamos rigorosamente o serviço. Todos esses pontos permitem que criemos uma folga para eventuais situações adversas. Com controle de todos os processos, conseguimos posicionar nossos clientes e sermos transparentes. O cliente que recebe um posicionamento ágil e atencioso percebe que a empresa está se esforçando para atender sua solicitação. O e-commerce está cada vez mais avançado na qualidade de seus serviços no Brasil. O setor percebeu a importância e aprendeu com os pioneiros. Do outro lado, o consumidor possui diversos meios e órgãos para conhecer o serviço oferecido por cada empresa. A percepção de serviço facilitador do e-commerce já ganhou escala para a população nos mais variados segmentos.”
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