Meio & Mensagem
29 de fevereiro de 2012 - 11h47
Por Fernando Murad
A escolha da cidade do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 colocou uma pressão extra quanto ao desempenho do País. Além dos bilhões investidos na infraestrutura para receber o megaevento, outros tantos estão sendo destinados para o treinamento e desenvolvimento de atletas para que, como anfitrião, o Brasil obtenha a melhor participação em sua quase centenária trajetória olímpica, iniciada na Antuérpia, em 1920.
Apesar de figurinha carimbada, o Brasil está longe de ser uma potência. Computando todas as suas participações, o País acumula 91 medalhas (sendo 20 de ouro), número inferior ao conquistado pela China apenas em 2008, quando foi sede. Na ocasião, os chineses subiram cem vezes ao pódio, 51 delas para receber a medalha de ouro.
Investimentos para mudar este cenário parecem não faltar. Com mecanismos como a Lei Agnelo/Piva, que destina 2% da arrecadação bruta de todas as loterias federais para o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e para o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), o Bolsa-Atleta (programa que dá benefícios mensais para esportistas) e a Lei de Incentivo ao Esporte (a Rouanet do esporte), o governo federal injeta milhões anualmente no desporto nacional.
O PIB do setor também tem o reforço do patrocínio de empresas estatais às confederações, como é o caso de Banco do Brasil, Caixa, Casa da Moeda, Correios, Eletrobras, Infraero e Petrobras (algumas delas apoiam modalidades olímpicas há décadas), e ainda de companhias privadas, que ao longo dos últimos anos estão aumentando seus investimentos em marketing esportivo.
Embora este movimento aconteça há alguns ciclos olímpicos, os resultados esportivos não estão acompanhando o crescimento do dinheiro aplicado. Em Pequim 2008, por exemplo, o Brasil conquistou três medalhas de ouro, duas a menos do que em Atenas 2004, quando o País ganhou o maior número de medalhas douradas em uma única edição.
“O patrocínio esportivo é uma parte importante no processo de crescimento do esporte olímpico, mas não é apenas o aporte de recursos que fará com que isso aconteça. As entidades envolvidas precisam adotar programas de melhoria contínua na gestão esportiva como um todo para que os atletas tenham à disposição as melhores condições de treinamento e evolução”, opina Gerson Bordignon, gerente nacional de promoções, cultura e esportes da Caixa.
Diante do crescimento dos recursos com patrocínio, Meio & Mensagem fez a seguinte pergunta a profissionais da área: com o atual modelo de patrocínio esportivo o Brasil conseguirá se tornar uma potência olímpica nos médio e longo prazos? Leia abaixo as respostas.
INSTITUIÇÃO
“Hoje o financiamento do esporte olímpico no Brasil é um misto de recursos públicos e privados. Porém, a ação mais importante em um momento como este, quando os recursos começam a aparecer, é um alinhamento na estratégia do uso desses milhões vindos de diferentes fontes, que em muitos casos não se conversavam. A soma desses recursos todos nem sempre significa que temos esse montante com o mesmo foco e objetivo. Uma coisa é ter R$ 3 milhões investidos em um projeto por meio de três fontes diferentes, mas com uma estratégia única, e outra é ter três projetos de R$ 1 milhão cada projetados e administrados de forma completamente independente. Além de financiar diretamente a preparação de atletas com os recursos da Lei Agnelo/Piva, hoje o Comitê Olímpico Brasileiro atua como integrador e orientador dessas diferentes fontes, para atuar também em outras frentes indispensáveis para se construir uma potência olímpica, como a qualificação de treinadores e gestores esportivos, instalações esportivas para alto rendimento e planejamento estratégico, dentre outros. Necessitamos de mais recursos, sim, mas também de projetos sólidos, integrados e prazo para preparar nossos medalhistas olímpicos.”
JORNALISTA
“Tornar-se potência olímpica é trabalho planejado, prioritariamente. Não temos isso. Uma potência olímpica não se mede apenas pela conquista de medalhas, mas com o País sendo, também, referência em esportes. O vôlei, o judô e a vela já são respeitadas escolas internacionais. Mas o fato de Cesar Cielo e Maurren Maggi terem o ouro olímpico não nos reserva destaque na natação e no atletismo. Os resultados dessas modalidades ainda estão nas mãos de poucos brasileiros. Ao Brasil não faltam recursos financeiros nem humanos para entrar no top 10 do esporte mundial. Falta, sim, política de esportes integrada entre o governo e instituições afins. Hoje, temos o Estado ‘doador de verbas’, mas sem participar da gestão. Pior: somos carentes de planejamento, metas e prioridades. Até a elementar educação física, importante na formação do caráter dos jovens e ponto de partida para a prática esportiva, desapareceu das escolas públicas. Há dinheiro, leis e instituições; sobra desordem institucional. Em 2010, R$ 1,75 bilhão saiu do Ministério do Esporte, Lei de Incentivo, Bolsa-Atleta, loterias e sete estatais para o Comitê Olímpico, confederações e clubes. Mas cada instituição faz o seu plano de formação de atleta, provocando duplicidade na aplicação das verbas e atraso na meta para sermos potência olímpica.”
EX-ATLETA
“Com a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016, os investimentos no esporte certamente acontecerão nos próximos anos. O Pan 2007 abriu caminho para os Jogos Olímpicos e deixou um grande legado: a lei de incentivo ao esporte. Com isso, clubes e instituições estão cada vez mais se preparando para captar recursos e investir no esporte. As próprias empresas também estão aumentando seus investimentos. O grande legado certamente estará relacionado à cultura esportiva no País. Temos chances, no longo prazo, de conseguir aumentar o número de participantes e, com isso, mais atletas serão formados para competir no alto rendimento. A questão de se tornar uma potência olímpica é um ponto mais difícil de prever. Os esportes que mais distribuem medalhas são o atletismo e a natação. Mas, para ser uma potência, o País precisa ter múltiplas modalidades ganhando medalhas. Devemos investir de forma estruturada em todas elas. O Comitê Olímpico Brasileiro e as confederações têm a responsabilidade de zelar pelas modalidades, além de motivar os clubes formadores, que são realmente quem garantirá se o País será ou não uma potência olímpica. Estar entre os dez no quadro de medalhas já nos caracterizaria como uma potência, desde que tenhamos referências em várias modalidades e não simplesmente resultados de talentos esporádicos.”
ANUNCIANTE
“Acredito que o Brasil tem potencial incrível e uma grande chance de se tornar um expoente importante neste cenário. Porém, para isso não basta somente termos atletas e pessoas com potencial olímpico, o que o Brasil tem em abundância. Temos de dar condições para que o esporte se desenvolva não somente em datas pontuais como Olimpíadas, Copa do Mundo ou outros com magnitude internacional. O esporte tem de começar nas bases, mas ter continuidade por meio de instituições fortes e competentes. O modelo de patrocínio contribui de uma forma bastante expressiva, e acredito que o atual modelo de patrocínio esportivo está melhorando devido aos grandes eventos que teremos nos próximos anos. Isso significa que temos não mais os famosos apoios pontuais, mas a oportunidade de investimentos continuados na formação e manutenção de atletas de ponta, junto com as federações e confederações. Há também uma maior profissionalização do setor, principalmente na iniciativa privada. Isso mostra que o mercado está se preparando para atender à demanda das grandes empresas, que querem participar do esporte. Este é um ciclo benéfico que, sem dúvida, vai colocar o Brasil na rota dos investimentos esportivos do planeta nos próximos anos.”
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