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Comunicação

A estratégia por trás das marcas que viraram publishers

Disciplina de brand publishing dá seus primeiros passos no Brasil, mas já coleciona cases consistentes nos Estados Unidos


28 de janeiro de 2021 - 6h00

(Crédito da imagem: Harrison Kugler/ Unsplash)

As novas dinâmicas de comunicação dificultaram o trabalho da publicidade convencional, que agora pode ser preterida pelo consumidor no mundo on demand. Como consequência, as estratégias de conteúdo ganharam maior relevância no universo das marcas nos últimos anos. Não à toa, seja para fomentar a cultura de um segmento ainda incipiente ou para ressaltar autoridade em um assunto, algumas marcas se tornaram uma espécie de veículo especializado e atuam como legítimos publishers verticais. Nem todo mundo sabe, mas o nome desse movimento é brand publishing.

Segundo Paulo Henrique Ferreira, fundador e diretor executivo da Barões Digital Publishing, a disciplina não é nova e desde o século XIX a John Deere (equipamentos industriais) publicava a revista “The Furrow” para os fazendeiros americanos, atravessando o século XX com diversos casos de sucesso. O que aconteceu, em sua visão, é que com a escalada da sociedade da informação, do digital e do telefone celular, a disciplina deu um salto. “Hoje uma marca com autoridade, líder em seu segmento, pode contribuir para a qualidade de informação do seu território com conteúdos originais, opinativos, educativos e curados, sem a necessidade de ser autorreferente o tempo todo”, explica.

Na entrevista abaixo, o executivo explica o potencial do brand publishing no Brasil, além das oportunidades e desafios em sua aplicação:

Meio & Mensagem – Além da capacidade de produzir conteúdo, o que mais uma estratégia de brand publishing envolve?
Paulo Henrique Ferreira – A disciplina também demanda conhecimento profundo sobre plataforma, técnicas de distribuição, indexação em mecanismos de busca, coleta e tratamento de dados e integração com áreas de técnicas e de negócio. É bom frisar que o brand publishing se diferencia de ações de conteúdo como, por exemplo, branded content em plataformas de terceiros. Afinal, uma marca publisher também se define por ser detentora da plataforma, dados e do processo de construção de sua audiência proprietária.

Paulo Henrique Ferreira: “As marcas precisam entender a importância da mídia proprietária nesse momento de rearranjo da indústria de comunicação” (Crédito: divulgação)

M&M – Qual é o nível de maturidade do mercado brasileiro na disciplina?
Paulo – Ainda é pequeno, mas felizmente tem avançado muito. As marcas têm chegado com demandas cada vez mais claras e objetivas e já entenderam que ter o foco apenas em conteúdo, por si só, não resolve. Também já entenderam que as práticas elementares de content marketing e inbound não são estruturantes e não entregam resultados consistentes. Uma marca relevante deve pensar em toda a cadeia do publishing, passando por plataforma, posicionamento editorial, distribuição orgânica e paga, modelo de governança, assim como o tratamento de dados em linha com a LGPD. E saber medir o resultado, desde awareness até geração de negócio, com processos contínuos para ativação das ações de “fundo de funil”.

M&M – Qual é o potencial da disciplina na estratégia de marketing das marcas?
Paulo – O brand publishing tem se tornado ferramenta central na profissionalização dos sistemas de mídia proprietária das marcas. Como o Holmes Report previu em 2016, a mídia proprietária seria a frente que mais cresceria nas empresas até 2020, tornando-se uma disciplina protagonista, ao lado de earned e paid media. Acertaram na mosca, mesmo sem prever a pandemia, que foi um gatilho dramático nesse movimento de transição midiática. Uma marca que detém uma plataforma de conteúdo de qualidade, mais do que informar e formar opinião com credibilidade, também detém um hub de indexação de informação em mecanismo de buscas, uma plataforma de construção de audiência proprietária e um sistema de tratamento de dados, com potencial de integração com áreas de negócios, TI e relacionamento com o cliente.

 M&M – Já temos bons exemplos no mercado brasileiro? Quais?
Paulo – Dou como exemplos casos já longevos como o Meulugar, hub do Quintoandar, lançado em 2018, e o Panoramacrypto, hub da Transfero, empresa suíço-brasileira, líder no ecossistema de criptomoedas e ativos digitais, lançado no mesmo ano. Em abril de 2020, a Engie lançou o Além da Energia que, em menos de um ano, já é referência de conteúdo sobre transição energética, integrado com áreas de negócios e demais frentes de comunicação. Fora do portfólio da Barões, destaco a L’oreal, que tem uma tradição forte como publisher, inclusive no Brasil. E a GE, com um projeto global como o GE Reports, também disponível para o público brasileiro. Também temos o fenômeno de empresas adquirindo veículos como a XP, com o Infomoney e a BTG, com a Exame.

“A marca que se posiciona como publisher, ajuda a qualificar o debate e se estabelece como um farol em meio a tanta informação produzida nas redes”

M&M – Quais são as referências em termos de case no mercado internacional?
Paulo – Damos sempre como exemplo o portal Business e Insights, da American Express, que há mais de uma década aproxima a marca de pequenos varejistas dos Estados Unidos com uma publicação digital sobre gestão de “small business”, finanças, RH e outras informações. O projeto deu tão certo que virou um evento nacional, adotado pelo calendário da indústria norte-americana, o “Small Business Saturday”. Outro exemplo virtuoso e longevo é a própria L’oréal que, desde 2011, tem o makeup.com, portal com o qual a marca se posiciona como grande publisher do segmento, inclusive organizando o debate em uma área com tantos influencers. Ou seja, a marca se posiciona como publisher, ajuda a qualificar o debate e se estabelece como um farol em meio a tanta informação produzida nas redes.

M&M – Quais são as principais oportunidades e desafios para essa disciplina no mercado brasileiro?
Paulo – As marcas precisam entender, de uma vez por todas, a importância da mídia proprietária nesse momento de rearranjo da indústria de mídia e comunicação. No meio digital não funciona atuar com a cabeça do século XX, com campanhas persuasivas em propriedades de terceiros ou apenas com assessoria de imprensa. Tem que aproveitar a oportunidade para estruturar seu próprio ecossistema de mídia proprietária, com plataformas em compliance com Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), capacidade de prestar um bom serviço de conteúdo, que reforça a sua autoridade, e usar inteligentemente as redes sociais como canal de distribuição e construção de audiência desintermediada. Nesse momento de transição midiática, as áreas de comunicação também tem a oportunidade de se imbuir do espírito de martech de comunicação e serem centrais no restabelecimento de processos funcionais, adequados à realidade dos sistemas de comunicação e hábitos de consumo de informação.

*Credito da imagem de topo: piranka/iStock

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