Assédio nas agências: 90% das mulheres já foram vítimas
Grupo de Planejamento divulga dados da primeira pesquisa sobre o tema, que ouviu 1400 pessoas que trabalham em empresas de comunicação de São Paulo
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Bárbara Sacchitiello
15 de novembro de 2017 - 14h10
Atualizada em 16/11, às 11h19
Embora as questões do assédio sexual e da desigualdade de gênero já estejam na pauta na indústria global de comunicação há algum tempo, o Brasil ainda não possuía nenhum dado concreto a respeito do alcance desses problemas no ambiente das agências, produtoras e veículos de comunicação. Com o objetivo de fornecer ao setor algum panorama que traduzisse em números a dimensão desses fatores, o Grupo de Planejamento dedicou os últimos meses à elaboração da primeira pesquisa quantitativa sobre o tema.
Com o nome de “Hostilidade, silêncio e omissão: o retrato do assédio no mercado de comunicação de São Paulo”, o estudo ouviu 1400 pessoas (homens e mulheres) que trabalham em empresas de comunicação da região metropolitana de São Paulo – em sua maioria, funcionários de agências de publicidade. Com apoio da Qualibest, a pesquisa foi realizada em forma de questionário online, sem identificação de nome ou de local de trabalho dos entrevistados.
“Tínhamos ideia de que a questão do assédio era um grande problema de nossa indústria. Mas quando conseguimos quantificar esse problema e transformar a percepção em números concretos é mais fácil conscientizar as lideranças e começar a planejar as maneiras de coibir essas práticas que são culturais e tão prejudiciais a toda a sociedade”, diz Ana Cortat, cofundadora da Hybrid Colab e conselheira administrativa do Grupo de Planejamento.
O dado mais emblemático do estudo – que foi apresentado nessa quarta-feira, 15, na Conferência do Grupo de Planejamento – é a percepção da indústria sobre a questão do assédio – 100% das pessoas que responderam à pesquisa declararam que existe casos de assédio nas empresas de comunicação.
O percentual de vítimas de situações de assédio elevado. Entre as mulheres entrevistadas, 90% declarou já ter sofrido alguma situação de assédio (seja moral ou sexual). Entre os homens, o índice é de 76%.
O assédio no entretenimento brasileiro
O estudo – que também foi coordenado por Ulisses Zamboni, CEO da Santa Clara e conselheiro do Grupo de Planejamento, e Ken Fujioka, ex-sócio da Loducca e ex-presidente do GP – também trouxe dados sobre a prática de assédio moral nas agências e empresas de comunicação. Para 89% das mulheres e 85% dos homens, o assédio moral é algo que faz parte do cotidiano de trabalho. Entre os tipos de assédio moral especificados no estudo estão a cobrança de tarefas em prazos impossíveis de serem cumpridos, jornadas extenuantes de trabalho (incluindo noites, feriados e finais de semana) e humilhação moral por parte de superiores ou clientes.
A pesquisa do GP também mostra que a hostilidade no ambiente de trabalho causa transtornos de saúde: 62% das mulheres que foram vítimas de assédio sexual ou moral declararam terem tido sintomas físicos. As reações variam entre crises, de choro, ansiedade, sensação de incapacidade e depressão. Entre os homens vítimas de assédio, o índice de sintomas físicos foi relatado por 51%.
Um dos pontos mais preocupantes da situação do assédio na comunicação, na opinião dos membros do Grupo de Planejamento, é a falta de rede de apoio para que as pessoas denunciem esses casos. Entre todos os 1400 entrevistados, apenas 5% declarou ter conhecimento de que sua empresa possui um canal onde é possível denunciar situações de assédio. O índice de quem, de fato, formaliza as reclamações por assédio ainda é muito baixo. De acordo com a pesquisa, somente 3% das mulheres e 7% dos homens vítimas de assédio sexual formalizaram a denúncia para as empresas. No caso de assédio moral, o índice de reclamação formal foi de 12% para as mulheres e 8% para os homens. “Seja por receio de represálias ou por achar que a denúncia não surtirá efeito, as pessoas preferem se calar. Não há estímulos para que esses casos venham a tona”, opina Ken Fujioka.
O estudo será disponibilizado a toda a indústria da comunicação em alguns dias. A ideia é que os números sejam o primeiro passo de uma série de ações que visam coibir a prática de assédio na indústria.A Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap) também comprometeu-se, junto ao Grupo de Planejamento, a apoiar a questão. Em nota, o presidente da Associaçao, Mario D’Andrea (CEO da Dentsu Brasil), declarou que “o estudo mostra que, infelizmente, o assédio moral e sexual (um dos grandes males da nossa sociedade) está claramente presente na nossa atividade, a comunicação”. O presidente da Abap afirma que a entidade repudia e condena qualquer prática desrespeitosa em relação à gênero, raça, cor e credo mas ressalta que a indignação não pode ser a única manifestação. “Nosso mercado, como um todo, não pode ficar alheio a esse grave problema e não pode tolerar uma situação tão absurda. A Abap vai apoiar e participar de discussões entre todas as entidades do mercado para encontrar formas inteligentes e eficientes de enfrentar o problema.”, disse D’Andrea.
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