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Comunicação

O mercado publicitário de Nova York na era pós-Mad Men

Diretora de criação da BBDO na cidade, a brasileira Bianca Guimarães fala sobre os desafios e particularidades da região símbolo da publicidade global


4 de julho de 2019 - 6h00

Madison Avenue: a mais famosa rua da propaganda mundial (Crédito: Anouchka / iStock)

Como trabalhar na propaganda, assistir Mad Men e não se imaginar na Madison Avenue dos anos 1960, considerada a era de ouro da propaganda mundial (pelo menos no quesito glamour)? O mesmo cenário nova iorquino que inspira a premiada série, também faz parte do dia a dia da publicitária brasileira Bianca Guimarães, que em dezembro completa 10 anos de atuação no mercado americano. Antes, trabalhou dois anos e meio no Brasil, nas agências WG Comunicação e Eugenio.

Em 2012, 2014, 2015 e 2016 o seu trabalho a colocou na lista do Business Insider como uma das profissionais com menos de 30 anos mais criativas da propaganda mundial. Com diversos trabalhos premiados nos principais festivais do mundo, ela também foi listada entre os “Creative 100” da Adweek e nomeada como uma das novas líderes do mercado publicitário pelo One Show e pela 3% Conference. Na entrevista abaixo, a oitava da segunda temporada da série Publicidade Brasileira Tipo Exportação, Bianca Guimarães revela como é trabalhar na cidade considerada por muitos como o coração da propaganda mundial.

Bianca Guimarães: “As agências daqui são formadas por pessoas de diferentes estilos de vida” (Crédito; divulgação)

Meio & Mensagem – Como você foi parar em Nova York?
Bianca Guimarães – Eu sempre gostei da ideia de ter uma experiência de trabalho fora do Brasil. Quando soube que minha prima viria fazer um curso de inglês em Nova York, resolvi vir com ela e fazer um curso de design, enquanto procurava um trabalho em alguma agência. Acabou que consegui um trabalho na Thompson antes mesmo de começar o curso. Vim com plano de ficar mais ou menos um ano e já estou aqui há nove anos e meio. Não poderia ter feito uma escolha melhor.

Ainda guarda algum glamour da “era Mad Men”?
A publicidade ainda é uma profissão que tem seus luxos, mas estamos muito distantes da realidade daquela época. Os martinis são agora tall iced lattes, os offices privados viraram mesas comunitárias e o terno e camisa foram substituídos por shorts e camiseta. Os gastos e investimentos são muito mais conscientes e pontuais. Eles são as festas das produtoras, os festivais como Cannes onde você é convidado para passeios de barco, as produções onde temos a chance de conhecer diferentes lugares do mundo, etc. Algumas agências globais ainda ficam perto da área da Madison Avenue, mas hoje em dia tem muitas agências independentes ou mesmo globais migrando para as áreas mais descoladas da cidade como SoHo e também indo de Manhattan para o Brooklyn.

Podemos considerar a cidade como o coração da propaganda mundial?
Nova York é a sede de muitas das maiores agências do mundo. Nesse sentido podemos considerar a cidade como o coração da propaganda. Mas, o mercado daqui também aprende muito com outros mercados e se beneficia pelo grande número de pessoas que vem de fora para aplicar seus conhecimentos aqui. O Brasil, por exemplo, é uma grande referência na área de design e craft. Nova York também é a sede de muitas empresas que estão desenvolvendo tecnologia de ponta. Isso faz com que tenhamos acesso a infraestrutura para fazer qualquer ideia acontecer, mantendo a cidade à frente das inovações do mercado.

 Como é o mercado publicitário por aí, de maneira geral?
Aqui, assim como no mundo inteiro, o mercado está passando por uma grande transformação. As agências estão tendo que adaptar seus formatos de negócio para competir em um mundo onde as marcas têm seus próprios departamentos criativos e as plataformas sociais dominam parte do budget de mídia e criação. O mercado aqui também é bastante diverso pelo fato de Nova York atrair pessoas do mundo todo, o que faz com que também seja um mercado bem competitivo.

Quais são as maiores diferenças na comparação com o mercado publicitário brasileiro?
Faz quase 10 anos que saí do Brasil então as coisas já devem ter mudado bastante. Eu falaria que uma grande diferença é que as agências brasileiras têm área interna de mídia enquanto aqui a mídia é responsabilidade de uma empresa separada. Outro diferencial é que aqui as verbas são geralmente maiores. Em relação ao design e craft das campanhas, o Brasil se destaca muito e é exemplo para os americanos. Além disso, aqui existe uma preocupação maior na representatividade do consumidor na propaganda e um foco maior das agências em contratar mulheres, negros, pessoas LGBTQ ou com deficiência para cargos de liderança. O Brasil ainda parece estar um pouco mais no discurso do que na prática, o que é uma pena, pois o povo brasileiro é muito rico em diversidade e poderia se beneficiar com isso. Em relação a produção, aqui os criativos são 100% envolvidos em todas as partes do processo – da filmagem, a edição, ao sound mix, a correção de cor, etc. No Brasil, pelo que eu saiba, você participa da filmagem, mas o processo é mais ditado e controlado pelo diretor.

E quais são as maiores curiosidades do mercado nova iorquino?
Na maioria das agências os horários são bem flexíveis e o pessoal tem liberdade de trabalhar fora da agência. Outra curiosidade é que o pessoal almoça na mesa enquanto trabalha e é bem normal marcar reunião na hora do almoço. Também é comum o Summer Fridays no verão, onde você pode escolher uma sexta feira por mês durante a estação para não trabalhar.

Para quem não conhece… Como é dividido o mercado publicitário americano? Quais são as regiões e suas características?
Nova York, Los Angeles e São Francisco são as cidades com a maior concentração de agências renomadas. Nova York, na maioria dos casos, é a seda das agências globais e muitas delas também têm escritório em Los Angeles e São Francisco. Los Angeles é a cidade mais popular dos Estados Unidos para produção de filmes. As melhores produtoras do país ficam lá. Aí tem cidades como Portland, Miami, Bolder e Virgínia que têm agências muito boas, mas não são os polos de comunicação do país. A Wieden & Kennedy de Portland, por exemplo, é uma das agências mais premiadas dos Estados Unidos.

De que maneira a cultura do país (e dos nova iorquinos) se reflete na propaganda?
As agências daqui são formadas por pessoas de diferentes estilos de vida, raça, nacionalidade, cultura e religião, o que gera muito trabalho interessante. O americano também é mais sistemático e eficiente. Essas duas características são visíveis no dia a dia das agências e no modo com que aproveitam o horário comercial. 

Como estão no momento a economia e o comportamento de consumo?
A economia está indo bem e o consumo online está cada vez maior. Muitas marcas têm fechado suas lojas físicas e investido no meio digital. O consumidor passa muito tempo online então nunca foi tão importante criarmos campanhas adequadas a esse meio. Além disso, os consumidores estão sempre on the go. Então não adianta mais o site, o anúncio e a mensagem apenas funcionarem no celular. Eles têm que ser criados pensando nesse formato.

E como são as agências e os publicitários que atuam em Nova York?
A cultura entre as agências difere bastante. Tem agência que a cultura é focar no trabalho e ter uma boa qualidade de vida e agência que serve jantar para o pessoal todos os dias. Agências onde a criação dita mais as regras e agências onde o atendimento e planejamento tem mais voz ativa. Como o mercado é bem competitivo, aqui você encontra muita gente inteligente e com skill sets diferenciados. Então, muitas vezes você vê times que vão além do diretor de arte e do redator trabalhando juntos em uma campanha. Além disso, os publicitários vêm de todos os cantos do mundo fazendo com que as agências sejam bem diversas culturalmente. Infelizmente, apesar do progresso dos últimos anos, ainda existe um déficit muito grande de mulheres, negros e pessoas com deficiência em cargos de liderança.

“Aqui existe uma preocupação maior na representatividade do consumidor na propaganda e um foco maior das agências em contratar mulheres, negros, pessoas LGBTQ ou com deficiência para cargos de liderança”

Há algo que se pareça com o mercado brasileiro?
O prazo é sempre curto (rs). E acho que a determinação é algo parecido entre os dois mercados. O brasileiro é um povo determinado, que faz acontecer. E o pessoal daqui é muito focado no trabalho. Ninguém vem pra Nova York para ter uma vida profissional tranquila.

Como eles enxergam a propaganda brasileira e os publicitários brasileiros?
Os brasileiros são muito bem vistos aqui. Em primeiro lugar como excelentes diretores de arte, pois no Brasil o visual é tão importante quanto a ideia. Além disso como dedicados e resilientes.

Como é trabalhar por aí e o que você tem feito de melhor?
Eu gosto muito de trabalhar por aqui e ser exposta a tanta diversidade cultural. O que fiz de melhor nos últimos seis meses foi um filho (risos). Eu acabei de voltar de licença maternidade, então estava focada na família nesses últimos meses. No momento estou trabalhando no filme de Super Bowl de Snickers e em uma campanha contra bullying em parceria com a Monica Lewinsky e outra contra tiroteios na escola para a ONG Sandy Hook Promise. São dois assuntos que viraram ainda mais urgentes para mim agora que virei mãe.

O que você pode dizer sobre a qualidade de vida na cidade?
Apesar de Nova York ser uma cidade muito movimentada e agitada, eu acho que a qualidade de vida é muito boa. Em 30 minutos de metrô você está em qualquer lugar, anda com segurança na rua e tem acesso à cultura sem gastar muito dinheiro. Além disso, eu moro no Brooklyn, então não me sinto tão sufocada pelo agito/caos que Nova York pode transmitir.

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