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Djamila: “É preciso ir além de comunicar representatividade”

Filósofa, uma das estrelas da campanha “Mulheres que Amamos”, de Quem disse, Berenice?, falou ao M&M sobre pautas importantes neste Dia Internacional da Mulher  


8 de março de 2021 - 14h00

Djamila: políticas públicas de educação mais inclusivas ainda não se refletiram no mercado de trabalho (Crédito: Bruno Santos/Folhapress)

Participante da reportagem especial do Meio & Mensagem para este Dia Internacional da Mulher, a filósofa Djamila Ribeiro conta, na introdução de seu livro “Quem tem medo do feminismo negro”, que somente após ir trabalhar na Casa de Cultura da Mulher Negra atentou para o silenciamento social que as mulheres negras, inclusive ela, sofriam. Hoje, é uma das vozes mais ativas na discussão de temas como a equidade de gênero e, dentro deste, a posição de “dupla antítese” da mulher negra (ante a branquitude e a masculinidade). Com raras participações em ações publicitárias, Djamila é uma das estrelas da campanha “Mulheres que amamos”, da AlmapBBDO para Quem disse, Berenice?, marca do Grupo Boticário. Isso porque, ao lado da advogada Gabriela Priolli e da lutadora de MMA Mackenzie Dern, ela ajuda a quebrar mais alguns dos estereótipos que recaem sobre as mulheres, como os de que beleza e inteligência ou força não combinam. Leia a seguir, parte da entrevista publicada na edição 1950, desta semana.

Meio & Mensagem – Qual sua visão sobre a situação, no Brasil, da agenda de equidade de gênero e diversidade, especialmente no ambiente corporativo e na publicidade?

Djamila Ribeiro – O Brasil ainda tem muito a avançar neste sentido, no ambiente corporativo, na publicidade. No meu livro “Pequeno Manual Antirracista”, falo das políticas públicas em educação, que fizeram um maior número de pessoas negras terem acesso ao ensino superior, só que isso não se refletiu no mercado de trabalho, então ainda é uma questão que precisamos olhar com bastante seriedade, apesar dos avanços nos últimos anos, de ter mais pessoas negras sendo representadas, e mulheres também. Ainda tem uma questão, na publicidade sobretudo, de sermos só representados como quem divulga o produto. É importante também participar de toda a cadeia de produção, de direção, estar por trás das câmeras. É algo que ainda precisa ser discutido e que muitos países, como a Noruega, onde tive o prazer de estar em 2017 para conhecer políticas de equidade de gênero, já avançaram. O Brasil precisa resgatar estudos sobre diversidades, sobretudo da década de 1980, com Bulgarelli, Sueli Carneiro, Cida Bento, para pensar o quanto a diversidade no ambiente corporativo, inclusive, é lucrativa do ponto de vista econômico.

A filósofa em campanha de Que disse, Berenice? com o batom que ajudou a criar (Crédito: Divulgação)

M&M – Deveria haver cotas raciais no mundo corporativo? De que maneira implementar, já que simples processos de seleção de trainees negros, como os de Bayer e Magalu causaram alvoroço?

Djamila – Acredito que sim. Temos ações afirmativas no âmbito público, como lei de cotas em todas as universidades (a primeira a adotar, antes da lei, foi a UERJ, em 2001) e no serviço público federal desde 2012, e o mundo corporativo não acompanhou as mudanças, então, é fundamental que pensem essas políticas, como o Magalu pensou. E causa alvoroço por falta de entendimento da maioria da população sobre a questão racial no Brasil. Racismo não é só referente à cor da pele, é um sistema de opressão que nega oportunidades à população negra. É um problema estrutural, pois por quase quatro séculos a população negra foi alijada de direitos e a escravidão foi a base da economia no Brasil, e isso empobreceu essa população. Se a sociedade brasileira se beneficiou da opressão da população negra, é também sua obrigação criar medidas para combater essa opressão. Então, causa alvoroço pois as pessoas não entenderam que durante quatro séculos as pessoas negras construíram a riqueza deste país sem ter acesso a ela. É dever dessa sociedade criar condições de diminuir os abismos criados pelo racismo.

M&M – Que medidas são mais urgentes serem tomadas por empresas que queiram contribuir com o fim do racismo estrutural e a dupla discriminação das mulheres negras?

Djamila – Indo na linha do que dizem os estudos sobre diversidade, como da Cida Bento. Criar um comitê de diversidade com metas: em tantos anos vamos contratar tantas pessoas. Se coloca em uma vaga em que é necessário inglês fluente, numa sociedade cujo acesso ao curso de idiomas está ligado diretamente à questão econômica, que pessoas vão se candidatar? Se anunciam vagas somente em universidades de elite, quem vão atrair? Mas para além disso, é necessário criar, de fato, um comitê de diversidade com planos e metas, fazer o diagnóstico da empresa, se só tem homens brancos majoritariamente, tem algum problema. É tomar ações concretas, para além somente de comunicar uma representatividade. Pensar como na empresa essa representação acontece, como estão sendo criadas concretamente oportunidades para que pessoas de outros grupos sociais acessem esses espaços.

 

Crédito da imagem no topo: frimages/istock

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