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Opinião

Não temos wi-fi, conversem entre vocês

Vivemos num paralelo entre dois mundos: o mundo real, o qual você está lendo esse texto; e o mundo ideal, ou seja, aquele que você constrói nas redes sociais de acordo com o que compartilha sobre si mesmo


15 de março de 2018 - 16h35

Há uma pergunta que dez entre dez pessoas não respondem com total sinceridade: o que você faz quando sai com seus amigos? As respostas variam entre “Saio pra beber”, “Saio pra dançar”, “Saio pra conversar”, “Saio pra me divertir”. Porém, é isso que realmente acontece? Encontrar a resposta a essa pergunta é mais fácil que visualizar todos os Stories do Instagram.

Aliás, a resposta está justamente nisso: Instagram, Facebook, Foursquare e etc. Afinal de contas, quem diria que hoje teríamos nossas vidas expostas em redes sociais? Vivemos num paralelo entre dois mundos: o mundo real, o qual você está lendo esse texto; e o mundo ideal, ou seja, aquele que você constrói nas redes sociais de acordo com o que compartilha sobre si mesmo. Assim, existem as pessoas que não gostam desse mundo, as que gostam e as que necessitam desse mundo.

Obviamente que não há problema algum em registrar momentos especiais, o problema está em fazer isso o tempo todo ao invés de viver o momento

Se voltarmos, pelo menos, 15 anos no tempo podemos dizer que as respostas acima se concretizavam sem pestanejar. As pessoas diziam: “Vamos sair pra beber alguma coisa e conversar”, e era exatamente isso que acontecia. Não existia a necessidade de fazer check-ins, selfies, lives ou stories para mostrar onde estava, com quem estava ou o que estava bebendo. As interações realmente aconteciam. Hoje é raro entrar em um bar ou restaurante e não ver ao menos uma pessoa por mesa com o celular na mão. Será que realmente precisamos criar outro mundo?

A primeira pergunta que muita gente faz quando chegam a algum lugar é se existe Wi-Fi disponível. Nos bares é a mesma coisa. Se você sai para conversar com amigos, vai ficar checando o celular de cinco em cinco minutos para que?

Obviamente que não há problema algum em registrar momentos especiais, o problema está em fazer isso o tempo todo ao invés de viver o momento. Mas isso não acontece apenas quando saímos para algum lugar, em casa também é assim, mesmo que estejamos assistindo nosso programa favorito, quase sempre temos o celular ao alcance das mãos. É fato que a evolução da tecnologia é uma maravilha e facilita a vida de qualquer mortal, porém, há certas ocasiões em que devemos esquecer aquela coisa de Matrix e suas pílulas azuis e vermelhas. Afinal de contas, você prefere acordar e acreditar no que quiser, ou quer saber até onde vai a toca do coelho?

Morpheus: O que é real? Como se define real? Se você se refere ao que pode sentir, cheirar, provar e ver, então real são apenas sinais elétricos, interpretados pelo seu cérebro. Este é o mundo que você conhece. O mundo como ele era no final do século XX. Ele existe hoje apenas como parte de uma simulação neuro-interativa, que chamamos de Matrix. Você tem vivido em um mundo de sonho. Este é o mundo, como ele existe hoje. Bem-vindo ao deserto do mundo real. Temos somente pedaços de informação, mas o que sabemos com certeza é que, no início do século XXI, toda a humanidade se uniu para celebrar. Nós nos maravilhamos com a nossa própria grandeza quando criamos I.A.”

Essa fala de Morpheus, no filme Matrix (1999), retrata um pouco essa questão da escolha entre esses dois mundos.  Como diz um famoso meme da internet: “Será que estou vivendo, ou apenas existindo?”. Já parou para pensar nisso em algum momento? Já parou pra pensar que viver num reality show virtual pode não ser legal? Já se imaginou vivendo como Truman Burbank? Viver em um mundo onde basicamente tudo é perfeito, todos gostam de você, todos te cumprimentam e ninguém te acha estranho realmente é o mundo ideal, ou pelo menos seria o ideal.

Em O Show de Truman: O Show da Vida, o protagonista vive uma mentira desde o dia de seu nascimento, porém, uma hora a casa tem de cair. E a realidade também. Em algum momento você também tem que “cair na real” de que as coisas acontecem mesmo fora da tela do celular. Todo mundo espera alguma coisa de um sábado a noite, mas não dá para acreditar que #vemcoisaboaporaí se você ficar olhando a tela do celular o tempo todo. Aquelas piadinhas que rolam na internet nunca se encaixaram tão bem: “Aquele momento em que acaba a energia em casa e você precisa sair do quarto e socializar com os estranhos que vivem na mesma casa que você”.

Internet é legal, rede social também, essas coisas ajudam a conectar pessoas, mas o mundo real fica aqui fora, as conexões reais também. E isso só me faz pensar em uma coisa: “Deus me livre eu deixar de sair com os meus amigos ou de ver meu programa favorito para ficar no telefone. Se quiser me ligue depois”. Além disso, todo estabelecimento deveria ter uma placa com o título desse texto: “Não temos Wi-Fi, conversem entre vocês”.

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