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Parabéns, você está no Big Brother

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Opinião

Parabéns, você está no Big Brother

Venho por meio desta informar que você foi selecionado!


30 de março de 2022 - 6h00

Crédito: Divulgação

Bem-vindo a nossa nave. Seu perfil é exatamente o que procurávamos. Aliás, procuramos muita gente. Todo mundo, de preferência.

Você sabe, o Big Brother foi inspirado no comemorado livro 1984 de George Orwell. Tem setenta e poucos anos que foi escrita aquela belezinha. Naquela grande obra de atmosfera opressora e apavorante, Winston, o herói, vive sua vida ordinária, oprimido pela vigilância constante do “Grande Irmão que está vigiando você”. Ele bate cartão no Ministério da Verdade. E seu trabalho é basicamente transformar notícias falsas em outras notícias falsas. Este trabalho é repetido a quantidade de vezes necessárias para que já não se saiba o que é realidade e o que é mentira.

Em termos atualizados, Fake News. No mundo do Grande Irmão, a única alternativa possível é acreditar no que diz ‘O Partido’.

E, assim, soberano de toda verdade, ‘O Partido’ determina o que você pensa, e, mais importante, o que você ama.
Eu sei, eu sei. Tudo isso parece notícia velha num mundo em que a gestão Trump criou o termo pós-verdade. E, você sabe, os grupos de zapzap estão por aí, fazendo o trabalho muito melhor que mil Ministérios da Verdade e um milhão de Wintons Smiths.

Seja qual for seu político de estimação, você precisa concordar que a verdade é hoje um conceito pessoal, atolado em subjetividades, prismas viciados, opiniões comprometidas e, voialá, cá estamos nós entre fatos camuflados em meio a mil versões e interpretações.

Lá, no mundo do Grande Irmão, Winston desistiu de buscar a verdade e aceitou sua vida rigidamente vigiada por teletelas, microfones e um milhão de espiões que nem pagavam pay per view.

Aqui, estamos nós, nas casas mais vigiadas do Brasil, pagando pesadas parcelas de nossas pequenas telas que monitoram os nossos rostos, nossas reações, o tempo que assistimos um vídeo, o tipo de Fake News que preferimos e assim vamos sendo manipulados, não pelo ‘Partido’, mas por algoritmos viciados em atenção, desesperados por audiência e que pouco se importam com as consequências que informações distorcidas causam ao nosso cérebro, à nossa confiança nas leis, à nossa federação.

‘O Partido’ — outra vez isso parece notícia velha — pouco se importa com as causas desde que a consequência seja dominação e poder. E, lá no livro, ‘O Partido’ consegue dominar a tal ponto que arbitra sobre a língua, proíbe e cria palavras, e dessa forma, domina o pensamento.

Não falei em rede social até agora, foi você quem pensou nisso sozinho.

Lá, a dominação política se dá justamente pela onipresença do Grande Irmão. E, desculpe o spoiler, o Grande Irmão sequer é um homem de fato, é apenas uma ideia que une a todos num único projeto de poder.

Lá, todos dominam e são dominados por esse líder que sequer sabem se tratar de realidade ou invenção.
Chega a ser chato comparar a obra de George Orwell com o mundo de hoje. Falar que o escritor inglês previu a Fake News, a dominação pela mentira e a sociedade monitorada 100% tempo… são constatações tão atuais que devem entediar o escritor no túmulo. Ele mesmo deve sentir que teve as ideias roubadas pela realidade de uma era sem imaginação. A nossa. Onde o programa de maior audiência na TV brasileira tenta imitar o mundo que o velho Orwell criou.

Mas, pasmem, não é o reality show, e sim, é o mundo real que melhor replica a imaginação do escritor inglês.

Algoritmos, manipulação de pensamento, informações distorcidas, dominação pela mentira.

Bem-vindos, corajosos aventureiros. Em nossa própria bolha de vidro, estamos todos no Big Brother.

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