Gaules, o Galvão Bueno dos esportes eletrônicos

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Gaules, o Galvão Bueno dos esportes eletrônicos

Maior streamer do Brasil desde 2020, Gaules comenta sua rotina, conexão com as marcas e próximos passos na carreira


30 de agosto de 2023 - 6h00

Françoise Terzian

Gaules, segundo maior streamer do mundo em 2022 e o primeiro do Brasil desde 2020, segundo The Esports Observer, Esports Charts e Streams Charts, já foi chamado de Galvão Bueno dos eSports. A comparação faz todo sentido. Com quatro milhões de seguidores na plataforma da Amazon, o paulistano Alexandre Borba Chiqueta é um fenômeno.

Foi jogador profissional de Counter-Strike por quase uma década e o primeiro treinador a ser campeão do mundo, em 2007, com o MIBR. Desde 2020, é sócio da Omelete Company. Tem um time de 50 profissionais atuando exclusivamente com ele e 100 compartilhados. Parceiro de marcas como Itaú, Red Bull, McDonald´s e Kabum, tem um canal que fica 24 horas por dia no ar e faz lives diárias de cerca de 12 horas.

Recentemente, transmitiu o Gamers8, maior campeonato de eSports da história, com direito a campanha de divulgação no intervalo da Globo. Com US$ 45 milhões em premiação, o torneio, que aconteceu em Riyadh, na Arábia Saudita, neste mês, reuniu as maiores estrelas dos eSports.

Nesta entrevista, Gaules fala de sua rotina, a conexão com as marcas e próximos passos da carreira.

Gaules

Canal do Gaules tem média mensal de 65 mil assinantes pagos (crédito: Marcelo Maragni/Red Bull Content Pool)

Meio & Mensagem — Você começou com 14 anos, com o desejo de participar de um time. Qual foi o momento de virada da sua carreira?
Gaules — Foi quando estava terminando o colegial, por volta de 16 anos. Na época, 2001, já estava jogando Counter-Strike, competindo havia dois anos. Estava me formando, tinha o vestibular. Tinha a primeira seletiva para um campeonato que acontecia na Coreia, que era o World Cyber Games, espécie de olimpíada, com várias modalidades. Vencemos a etapa e viajamos para a Coreia. Fiquei em dúvida, mas pensei que vestibular tinha todo ano e eu não conhecia muitas pessoas que tiveram essa possibilidade de ir para o outro lado do mundo realizar um sonho. Chegando lá, pude perceber que essa parte da Ásia estava muito à frente. Pude ver que tinha uma estrutura muito grande das competições. O pessoal assistia a transmissão de esportes eletrônicos na TV aberta já naquele tempo. Ali foi o primeiro impacto, uma garantia de que existia um mercado.

M&M — No Google, pelo seu nome, aparece receita mensal em torno de US$ 3 milhões. É isso mesmo?
Gaules — Hoje, chegamos anualmente a um valor muito grande de receita. Tem tudo: patrocínio, parcerias, transmissão que acaba sendo monetizada pela Twitch. Somos um dos canais que mais tem assinantes (pagos) no mundo. Uma média de 65 mil pessoas assinando por mês. O valor pago varia de acordo com a categoria. Se assina Amazon Prime também pode virar um assinante do seu canal e a Amazon repassa. Na Twitch são quatro milhões de seguidores e 65 mil assinantes mensais. Isso é crescente e tem mês que varia, que vai para 80 mil, 100 mil, 45 mil. Depende das transmissões. A pessoa tem benefícios como não assistir as propagandas automáticas que aparecem no canal.

M&M — Quem gerencia a marca Gaules?
Gaules — Eu praticamente só transmito. Hoje, Gaules é uma empresa que faz parte do grupo Omelete, do qual sou sócio. Uma parte de funcionários é compartilhada entre as várias empresas do Omelete, jurídica, vendas. Mas tem uma parte exclusiva e específica com 50 colaboradores só para a Gaules. Marketing, negociação. Esse é o nosso diferencial. As marcas conversam com o comercial, fecham com o time de marketing, terminam o projeto e passamos o relatório como qualquer veículo de comunicação. Nenhum outro criador de conteúdo e canal de transmissão do mundo tem algo parecido. É um dos diferenciais que nos coloca onde estamos.

M&M — Trabalha com quantas marcas? Como é sua relação com elas?
Gaules — São muitas. Tem patrocínios mais longos, contratos de um ano, três anos, e muitas coisas pontuais. São mais de 10. Um exemplo é o Itaú, patrocínio que teve início há mais de um ano e com contrato de longo prazo. Está presente em projetos comuns, de estar na comunidade de esporte eletrônico apoiando campeonatos, times, transmissão e criação de conteúdo. O que as marcas mais procuram é uma chancela de que elas apoiam as várias comunidades. Sou um dos representantes dessa comunidade de games e esportes eletrônicos, e as marcas enxergam a importância de se conectar com o público que está ali. A forma de consumir conteúdo mudou e as marcas buscam essa conexão para mostrar interesse no que as pessoas querem consumir.

M&M — Tem alguma categoria que você veta?
Gaules — Casino, sites de apostas. Como embaixador, nunca farei. É um valor meu. Independentemente se é esporte tradicional ou eletrônico, faz parte apostar quando se tem duas pessoas competindo. Está muito inserido, os times e os jogadores precisam dessa receita. Os campeonatos são financiados muitas vezes por eles. Também são uma receita importante para transmissões. As marcas procuram minha imagem como embaixador que chancela aquele produto/serviço. Casino online ou sites de apostas não permito que usem minha imagem. Propostas chegam todos os dias.

M&M — Qual é a faixa etária da sua audiência?
Gaules — A grande maioria tem de 22 a 36 anos. O que mais transmitimos é Counter-¬Strike, um jogo muito antigo, lá de 1999. Hoje, vejo muita renovação. É um caso curioso porque os jovens tentam trazer os pais para assistir o esporte eletrônico. No caso do nosso canal, recebo muitas mensagens de pais que falam “meu filho já está aqui, com 2 anos, 5 anos, e eu estou colocando para assistir”. Nos eventos presenciais, os pais trazem os filhos desde criança de colo até pré-adolescente. Conseguimos conectar muito com a família. Apesar de o jogo ser destinado para maiores de 16 anos, 18 anos, é um conteúdo que acaba sendo muito mais leve e é consumido pela família.

M&M — Então, você atrai novas gerações e as marcas percebem isso?
Gaules — Sinto que elas querem se aproximar de uma comunidade que cresce cada vez mais. Quando você pensa em games, fala de quase todo mundo. A pessoa que joga um jogo casual no celular já é considerada gamer. As marcas tentam se conectar através de uma verdade e, principalmente, valores. Quando você olha a história, criamos nossa comunidade, a forma como lidamos com as coisas, e as marcas procuram esse personagem que é uma pessoa que pode conectá-la com alguns de seus valores. Não vou em muitas reuniões com marcas, mas com todasque trabalhamos, em algum momento, conheço as pessoas ligadas ao projeto. Percebo que o maior interesse delas é se conectar com a nossa história de vida que é levada para o dia a dia do conteúdo.

M&M — O interesse das marcas começou na pandemia ou antes já tinha?
Gaules — Já tinha, mas percebo que tinham uma desconfiança como qualquer outro negócio. Hoje, sou uma marca e também escolho. Vamos nos associar com essa marca? Será que os nossos valores são os mesmos? As marcas têm mais confiança por se tratar de um canal de comunicação sólido e confiável. Fomos construindo isso de 2018 para cá, quando comecei a fazer stream. Essa confiança veio quando as marcas começaram a testar e ver resultados. Quebramos a barreira da desconfiança.

M&M — Qual é sua estrutura para ter um canal non stop?
Gaules — No final do ano passado, minha noiva eu nos mudamos para um apartamento que é nosso, com estrutura muito boa, onde temos meu estúdio, o estúdio dela e uma parte onde podemos receber outros criadores de conteúdo. É um apartamento bem grande, de mais de 400 metros quadrados. Aqui tenho cinco internets, um nobreak gigante, tem gerador no prédio. A não ser que aconteça algum acidente, a gente estará sempre transmitindo. É praticamente impossível o canal não estar online.

M&M — Você tem o canal número um do Brasil e o segundo do mundo. Imaginava que iria tão longe?
Gaules — Ainda mais em uma língua como a portuguesa. É muito difícil porque competimos com canais internacionais. Quando alguém está transmitindo em inglês, está transmitindo para o mundo. É muito forte esse lance de se conectar com a sua comunidade, existe uma verdade maior, mas existe uma limitação linguística. Fico muito orgulhoso em saber que hoje o maior canal de transmissão de esporte eletrônico do mundo é em língua portuguesa. Isso é um avanço da nossa região.

M&M — E quais são os próximos passos do canal?
Gaules — É a profissionalização, conseguir manter um canal como um dos maiores e principais de transmissão do mundo. Conseguir ao longo dos próximos anos ir mesclando um pouco. Comparo com o SBT. Tinha uma época que o Silvio Santos ficava muito tempo na tela. Hoje, o Gaules depende muito de mim. Mas ao longo dos meses e anos estamos conseguindo incluir outras coisas que não são somente eu transmitindo e jogando. Tem uma equipe de transmissão que faz alguns jogos, tem conteúdos que passam antes e depois das partidas. No futuro, a ideia é conseguirmos profissionalizar e trazer mais personagens, elementos e conteúdo para conseguir atender o público com a qualidade que eles esperam, mas eu também diminuir um pouco de 12 para 10 horas; de 10 para 8 horas, até um número que fique mais confortável pra mim.

M&M — Como você tem se sentido?
Gaules — É um desgaste físico e mental, mas gosto muito. São momentos de construção e sou de uma geração que entende e aceita que isso faz parte da construção de algo muito grande. Não tem muito segredo. Quando competia, o segredo estava na dedicação de passar horas treinando. Hoje, minha competição é ser um dos maiores canais do mundo e, para que isso aconteça, depende do meu trabalho. Se tiver que fazer 12 horas, faço. Se tiver que fazer 14 horas, faço. Tento equilibrar cuidando mais da saúde. Nos últimos anos, com a pandemia e outras coisas, as pessoas, no geral, foram adoecendo um pouco e agora tenho cuidado dessa parte.

M&M — E o que espera para o segundo semestre em termos de transmissão, jogos e negócios?
Gaules — Será melhor que o primeiro semestre. Nos últimos cinco anos, o Brasil não tem ido tão bem no esporte eletrônico, apesar de conseguirmos aumentar a audiência e o público. Nunca fomos dependentes dos resultados das partidas, mas quanto melhor o Brasil for, mais conseguiremos trazer na transmissão. Recentemente, um dos principais times (Furia) trouxe um dos principais jogadores do Brasil (Gabriel FalleN). Temos a segunda metade do ano com vários campeonatos e o Brasil vem com certo favoritismo. Teremos também um lançamento do nosso principal jogo, que será o Counter-Strike 2. Isso é algo que o pessoal tem procurado bastante e que desperta para querer jogar e assistir algo novo.

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