Não se desespere, mas abandone já sua zona de conforto

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Opinião

Não se desespere, mas abandone já sua zona de conforto

Operações que hoje chamamos de “veículos de comunicação” irão se dissolver no mundo digital, tornando- se plataformas de produção e distribuição de conteúdo, muito possivelmente associadas a grandes marcas


20 de abril de 2018 - 8h00

Crédito: Fodor90/iStock

Há 40 anos soube por um cara que morava comigo naquilo que na época chamava-se de “república” — um grupo de estudantes dividindo um mesmo teto — que uma empresa chamada Meio & Mensagem estava contratando repórteres. Estava ainda na faculdade de jornalismo.

O cara se chamava Luis Sergio Borgneth, que desenhou e dirigiu o editorial do Grupo M&M por décadas, tornou-se seu sócio e, depois, foi ter com os deuses.

Fui lá, eles me contrataram e o resto é história.

Estou aqui no M&M desde aquele dia, início da operação, e embora tenha saído e voltado duas ou três vezes, sigo aqui. Orgulhoso de estar aqui e do que acho que posso ter contribuído para que o M&M tenha sido nestas quatro décadas. Se bom ou ruim, você leitor decide.

Há 40 anos não existia nada do que conhecemos hoje como mundo digital, esse mundo no qual, para o bem ou para o mal, acabei por me especializar.

Havia a dominância inconteste da TV, com revistas, jornais e rádio, tudo isso junto, controlando o cenário da mídia e da comunicação. Havia já os grandes grupos globais de agências de propaganda, que seguem aqui no País construindo nossa indústria com sua contribuição. Havia as primeiras discussões sobre o modelo de remuneração das agências, tema que seguimos discutindo até hoje. Havia o início da projeção internacional da criatividade publicitária brasileira, que só se consolidou nestas quatro décadas. Havia já algumas das grandes entidades do setor, como a APP, a ABP, a Abap, ABA e estava nascendo o Conar. Enfim, muitos dos pilares da nossa indústria já estavam de pé.

Fui, portanto, testemunha ocular de toda essa história, como diria o falecido Repórter Esso, e posso assegurar que nossa evolução foi nada menos do que impressionante. Assim como posso igualmente assegurar, por conta das dezenas e dezenas e dezenas de viagens internacionais que fiz acompanhando a indústria do marketing e comunicação mundo afora, que somos hoje um setor evoluído e sólido, em linha com muito do que de mais evoluído e sólido existe por aí.

Tá bom. Perdemos quando se fala em grandes volumes de investimento e tudo o que eles podem rapidamente produzir, mas isso não é culpa da nossa indústria, é uma condicionante histórica e geográfica.

E os próximos 40 anos, o que nos reservam?

Minha bola de cristal não consegue enxergar um futuro tão distante assim. Ray Kurzweil, o cientista e futurista da Singularity University, hoje um dos mais influentes do mundo, prevê que a Singularidade, ou seja, quando os homens serão máquinas, acontecerá em 2045. São 27 anos a partir de hoje.

Diante de uma previsão assim, qualquer outra que se atreva a olhar para além de 15 ou 20 anos, tenderá a estar completamente comprometida com um mundo que não temos minimamente como imaginar.

Seja como for, e exatamente por isso assumindo aqui alguns riscos evidentes, olhando pelo buraco da minha fechadura do futuro, consigo entrever caminhos e tendências que deverão se consolidar nos próximos dez anos.

Comecemos pela TV. Em breve, não vamos chamar mais TV de TV, porque o setor terá se dissolvido no digital de tal forma, que não saberemos mais o que é internet e o que é TV. Teremos então uma coisa só (portanto, essa “briga” entre on e off-line de hoje é meio tolinha e se dissipará com o tempo).

Nossas agências terão se transformado, nos próximos dez anos, em operações de alta eficiência para as empresas em busca de consultoria de marketing e negócios. Isso quer dizer que elas terão se transformado em consultorias? Sim

Do ponto de vista das operações e negócios desse setor no País, deveremos ter, como decorrência da mescla mundial tecnológica das plataformas, a incorporação dos grandes grupos nacionais dessa indústria por grandes grupos globais, uma vez que operações estritamente locais de TV não terão mais qualquer razão de existir.

As demais operações que hoje chamamos de “veículos de comunicação” irão igualmente se dissolver no mundo digital, tornando- se plataformas de produção e distribuição de conteúdo, muito possivelmente associados, de alguma forma, a grandes marcas e grandes grupos produtores de bens de consumo e serviço.

Acredito também que nossas agências terão se transformado, nos próximos dez anos, em operações de alta eficiência para as empresas em busca de consultoria de marketing e negócios. Isso quer dizer que elas terão se transformado em consultorias? Sim. Não necessariamente no modelo do que hoje conhecemos por consultoria, até porque também as consultorias de hoje terão se tornado empresas consultivas de inovação tecnológica e empresarial diferentes das atuais, mas porque as agências terão papel consultivo mercadológico bastante mais abrangente do que têm hoje.

O passo seguinte, entre dez e 15 anos, é não existir mais qualquer linha de separação entre consultorias e agências, pois serão todas empresas de suporte a negócios, com forte viés tecnológico.

Possivelmente, nos próximos dez ou 15 anos, não chamaremos mais os anunciantes de anunciantes, porque as empresas (indústria e varejo, sendo que cada vez mais a indústria vai virar varejo) investirão suas verbas de marketing em dezenas e dezenas de atividades que não terão mais nada a ver com “anunciar”. Nem com “veicular”. Mas, prioritariamente, em estreitar relacionamentos duradouros com seus públicos, o que se dará por meio de plataformas integradas de tecnologias que nem conhecemos hoje ainda (a Internet das Coisas é a pista mais clara que conseguimos enxergar hoje).

No Brasil, nos próximos dez anos, veremos a explosão do setor de startups. Como vem acontecendo no resto do mundo, aliás. Será delas uma parte relevante do protagonismo da inovação em todos os setores da nossa economia e não haveria de ser diferente no nosso setor (isso, em verdade, já começa claramente a acontecer e, modéstia à parte, ProXXIma terá contribuído seu quinhão nessa evolução).

Bom, num mundo em que agências, anunciantes e veículos não serão mais o que são hoje, pois ou terão desaparecido ou se transformado de tal forma que não conseguiremos mais identificá-los, o que será a indústria que hoje chamamos de marketing e comunicação?

Obviamente, ela não existirá mais, não como está configurada hoje.

Mas não precisamos chorar por isso. Teremos, de alguma forma, nos adaptado a essas transformações ao longo das próximas uma ou duas décadas. Nada disso acontecerá da noite para o dia.

No entanto, imaginar que os próximos 40 anos serão iguais aos passados 40 anos que vi acontecer desde que entrei nesta indústria é pedir para ser atropelado pela inevitabilidade da evolução humana. Seja ela o que for e vá ela para onde for.

Portanto, não se desespere, mas abandone já sua zona de conforto. Os próximos 40 anos serão mais avassaladores do que tudo que aconteceu na Humanidade até hoje. Desde o Big Bang.

Pois que venham. Será uma aventura de tirar o fôlego.

 

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