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Opinião: estamos muito chatos?

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Comunicação

Opinião: estamos muito chatos?

Ter noção dos limites da comunicação é bom para encontrar novos caminhos e, quem sabe, obter até melhores resultados


19 de junho de 2015 - 10h34

Por Jean Boëchat (*)

O mundo anda muito chato”. “É a ditadura do politicamente correto”. Um amigo disse que quem repete isso é sempre alguém defendendo o passado. O mundo já mudou faz tempo. A revolução não foi televisionada. Acontece, cada vez mais, na sua cara ou na palma da mão.

Nos últimos 20 anos, a internet fez da humanidade uma rede de pessoas conectadas, com espaço para fazerem valer sua voz, livres para manifestar os pensamentos como nunca. Entre seus benefícios, a rede abriu espaço para os excluídos e os questionadores. Claro que há os incomodados: quem defende o passado. Desculpe, mas vivemos um momento lindo.

É lindo ver as pessoas em pé de igualdade para reconhecer-se em suas tribos, questionando e lutando por um mundo melhor para as gerações futuras. Hoje, quem sofreu bullying pode gritar, as vítimas do preconceito podem gritar, as mulheres exigem respeito, em tudo em que o respeito lhes falta; as questões de gênero, o modelo familiar e outras importantes discussões estão na ordem do dia.

Vamos celebrar e aprender com isso. Obs.: favor desconsiderar os idiotas que saí¬ram dos bueiros — mas pelo menos agora podemos ajudá-los a deixar de ser idiotas.

O que a comunicação tem a ver com isso? Tudo. Hoje se questiona e se observa tudo com um olhar diferente. É aí que, para muitos, entra a tal da chatice. “Não pode ter ideia nem humor”. Quem disse que não? Talvez esteja na hora de rever o que é ideia e humor. Não faltam exemplos de bom humor feito sem a necessidade de rir da diferença estereotipada do outro. Quem ri de si mesmo, como Chaplin, Monty Phyton e Jerry Lewis. Amy Schumer e a brasileira Jout Jout são exemplos de um tipo de humor feminino que tira um belo sarro do próprio feminismo, com inteligência e sutileza.

Falta ideia? Não. Tem muita ideia. Basta fugir dos modelos velhos de sempre para comunicar. Você pode fazer propaganda de cerveja, falando das questões masculinas, sem precisar apelar pro mulherão. Pode conversar com os gays — e com todo seu potencial de con$umo — sem tratá-los como aliens, sendo apenas… natural. Não precisa mais tratar as mães como virgens marias brancas destinadas aos chavões de sempre. Pode até falar sobre o universo infantil de forma ética e correta, diferentemente da forma predadora que fizemos através dos anos, em cima das crianças.

O que alguns acham que é limitador, visto por outro ângulo, abre um caminho mais rico e desafiador para contarmos histórias cada vez mais atuais com nosso tempo. Tem até gente que trabalha com propaganda querendo discutir isso. No Facebook existe um grupo de discussão sobre o Gênero na Publicidade, com quase 800 pessoas olhando para tudo o que está sendo colocado na rua e discutindo nosso papel de publicitários diante dessas delicadas questões. Todo tipo de gente, de diferentes funções na indústria, com diferentes opiniões. O papo é sério lá.

Um brasileiro genial, o geógrafo Milton Santos, em entrevista ao Roda Viva, falou sobre a experiência da escassez, que diz que quanto mais limitado você é, mais criativo tem de ser. É a turma que tira leite de pedra. Por isso, ter a noção dos limites é bom para encontrar novos caminhos e, quem sabe, obter até melhores resultados. Quem é capaz de contar uma boa história num banner ou em 140 caracteres do Twitter não tem medo de limites e é capaz de contar ótimas histórias em qualquer formato.

Não perca tempo reclamando do mundo chato. Mexa seu traseiro. Preste atenção. Ouça seus públicos. Conheça as pessoas e, principalmente, faça uso de um expediente humano sensacional para entender o outro: a empatia. Defina os limites e solte a mão com imaginação, garantindo assim maiores chances de tudo dar certo. E nunca se esqueça: o mundo somos nós e estamos aprendendo a fazê-lo melhor construindo a nave durante o voo. Sem medo de errar. Reconheça o erro, peça desculpas como adulto, corrija as rotas e seja feliz, com naturalidade. Tudo o que o mundo quer é a verdade. A verdade de cada um de nós, como indivíduos e sociedade.

*Jean Boëchat é diretor de estratégia digital da Talent

Esta opinião foi originalmente publicada na edição1664 de 15 de junho de 2015, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets de Meio & Mensagem. Nos tablets, para acessar a edição, basta baixar o aplicativo nos sistemas iOS ou Android.

 

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