Os famosos pedem passagem
Nunca tanta gente de fora do mercado se apresentou nos seminários de Cannes como em 2012
Nunca tanta gente de fora do mercado se apresentou nos seminários de Cannes como em 2012
Felipe Turlao
1 de junho de 2012 - 11h23
Na edição 2010 do Festival de Cannes, o ator Ben Stiller entrou no palco do Debussy e soltou: “Estou no Festival de Cannes. É um sonho se tornando realidade”. Logo em seguida, emendou: “Mas espere, este não era o festival de cinema?”. A piada deu a tônica da apresentação de 50 minutos que arrancou gargalhadas nesta e nas outras duas salas disponibilizadas (e lotadas). Ao lado do ator estava Jeff Goodby, um dos fundadores da premiada Goodby, Silverstein & Partners, que apesar de cativar os publicitários por onde passa, acabou relegado ao papel de coadjuvante. Muito tem se falado nos últimos anos sobre a mudança de perfil do Festival, que está mais aberto a outras formas de criatividade que não a produzida pelos publicitários. Mas será que Cannes chegou tão longe a ponto de trancar seus antigos protagonistas nas salas de exibição de comerciais e de usá-los como meras escadas das piadas e teorias de nomes mais famosos nos seminários?
A teoria é reforçada pelo testemunho de profissionais que assistiam à exibições de cases e comerciais quando foram surpreendidos pelo corte puro e seco para que pudessem ser transmitidas palestras. “Eu acho bacana ver gente de fora em Cannes. Se não abrirmos espaço, o professional fica auto-referente, pesquisando coisas nas Archives e no site do One Show, e seu trabalho fica viciado no que tem sido feito”, pontua o redator Lusa Silvestre, da WMcCann. “No entanto, acho que há uma distorção pela qual esse tipo de atração passou a ser mais forte do que todo o resto. Ver o Al Gore é legal, mas acho errado e uma agressão quando interrompem um screening de filmes de varejo para transmitir uma palestra. Isso é um desprezo com os publicitários de criação que estão vendo os filmes”, acusa.
Silvestre, que não irá a Cannes neste ano, diz não querer parecer saudosista, mas ressalta que sente falta do tempo em que se podia ver todas os filmes premiados com Ouro, Prata e Bronze. E no qual as palestras chamavam as atenções por outros fatores que não a presença da celebridade em si. “Tem palestras todos os dias e o dia inteiro. Naturalmente, vai ter muita apresentação que não vai acrescentar nada. Eu enxergo o risco de Cannes virar um evento de auto-ajuda. Alain de Boton, por exemplo, é auto-ajuda. E o que o Bill Clinton terá para nos dizer? Se for para virar um TED, prefiro ver de longe, pela internet”, esbraveja.
A organização do Festival de Cannes reforça o discurso de que o festival não é mais apenas de publicidade, mas discorda sobre uma possível desvalorização dos profissionais de criação. “O Cannes Lions oferece escolhas. Delegados de agências de publicidade podem não somente assistir seminaries no Debussy, mas também frequentar workshops, fóruns e master classes. Há sempre alguma coisa para todo mundo”, afirma Philip Thomas, CEO do Festival. “E não vamos nos esquecer dos grandes nomes do mercado que irão se apresentar no palco do Debussy neste ano, como John Hegarty, Dan Wieden, Jeff Goodby e Bob Greenberg”, reforça.
De acordo com Thomas, a ideia de um festival de criatividade que celebre todas as formas de comunicação é inspirar pessoas do mercado. “A diversidade é grande, com grandes palestrantes de segmentos diferentes, como cinema, política, música, esportes e publicidade que podem ser inspiradoras de maneiras muito diferentes”, analisa. Muita gente no mercado defende essa visão. Inclusive John Hegarty, que faturou no ano passado o Leão de São Marcos, que reconhece a carreira e a importância do profissional para o desenvolvimento do mercado. “O modelo antigo não me atraía muito, justamente por ser restrito. Acho que a inclusão de novas categorias e o enriquecimento da programação de seminários tornou o ambiente do festival muito mais atrativo para todo o mercado de comunicação”, atestou Hegarty, em entrevista ao Meio&Mensagem condecida durante o festival em 2011. Elea firma que passou a frequentar mais Cannes por conta das novidades.
Com quantidade de delegados provavelmente batendo em 10 mil neste ano, de acordo com uma fonte da organização do Festival de Cannes, a estratégia de trazer celebridades de diversas áreas se consagra como um sucesso comercial. A simples observação de filas e do burburinho no Palais demonstra que as palestras envolvendo músicos, atores e pensadores atraem mais gente do que as palestras de agências. Tudo isso começou em 2007, quando Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos, apresentou seu discurso sobre mudanças climáticas em Cannes. No ano seguinte, o cantor Tony Bennett superlotou o seminário da Grey sobre música e publicidade e provou que uma celebridade atria muito mais gente para uma palestra do que publicitários. Entre 2009 e 2011 a quantidade de “sapos de fora” foi muito maior. Mas nada se compara à quantidade e diversidade de fauna criativa de 2012.
Em termos de quantidade, nunca se viu tanta gente de fora do mercado no evento (confira linha do tempo abaixo e compare). Em termos de variedade, algumas observações são necessárias. A primeira é que algumas “categorias” de palestrantes começam a se tornar cativas em Cannes. A começar pela presença de politicos. Se em 2007 o festival teve Al Gore, ex-vice presidente dos Estados Unidos e, em 2009, Kofi Annan, ex-secretário geral da ONU, 2012 também terá sua porção política, com Bill Clinton, uma atração que será levada pelo Grupo ABC (confira matéria ao lado sobre a presença brasileira nos seminários de Cannes) A categoria de pensadores, que teve o físico Edward de Bono no ano passado, contará com o escritor e filósofo Alain de Botton em 2012. Sucesso de público costumeiro, as palestras envolvendo músicos, que foram inauguradas em 2008 com a presença de Tony Bennett na Riviera, terão reforço neste ano, com Debbie Harry (Blondie) e Smokey Robinson.
O que chama bastante as atenções neste ano, também, são os casos de palestrantes exóticos. Quem esquecer a programação de palestras no hotel e, desavisadamente, ir parar no Debussy para ver o que está acontecendo, corre o risco de se deparar frente a frente com um dos melhores lutadores de artes marciais mistas (MMA) do mundo: o canadense Georges St-Pierre, sempre citado como protagonista da “luta dos sonhos” contra o brasileiro Anderson Silva. Antes de perguntar o que ele está fazendo ali, vale uma lida na descrição da apresentação do especialista em jiu-jistu e caratê, que está sendo patrocinada pela editora canadense The Globe and Mail: “Junte-se a nós para entender como construir e manter um perfil nas redes sociais com o máximo de impacto e o mínimo de perdas”. Na prática, uma aula sobre um tema bastante atual no mercado, que é o gerenciamento de imagem nas redes sociais.
Outro caso é do grupo sul-coreano de Rhythm and Blues 2NE1, que tem como seu maior sucesso a música “I Don´t Care, Go Away”, cantada por quatro garotas que misturam coreano e inglês. A palestra patrocinada pela Cheil mostrará como o pop coreano se utiliza de mídias digitais para se propagar pelo mundo.
Já no seminário “Inspire me for the Future”, do bureau de mídia Starcom MediaVest e do TED, serão quatro participantes que pretender inspirar a plateia para o futuro: a química Rachel Armstrong, apresentada como pioneira em biologia sintética (atividade descrita como engenharia racional de sistemas vivos), o músico Usman Riaz, que experimenta diversos instrumentos musicais distintos e acredita que as pessoas podem conseguir tudo o que querem se colocarem seus objetivos na mente, o designer gráfico E Roon Kang, especializado em instalações interativas e que critica sistemas complexos e a falta de eficiência em projetos do gênero e, por fim, o cientista de complexidade Eric Berlow, que é também ecologista e se diz “especializado em não se especializar”. Será que politicos, músicos e outros profissionais serão suficientes para tirar os criativos das salas de exibição?
Confira os famosos de cada edição em Cannes:
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