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A carta da caça aos caçadores

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Ponto de vista

A carta da caça aos caçadores

A galera do cinema publicitário resolveu dar um basta à extorsão anual que é a produção gratuita de filmes fantasmas para Cannes. Por Rodrigo Leão(*)


18 de fevereiro de 2014 - 9h14

Acasp, Astim, Abele, Apro, Siaesp, Sindcine, Sated e UDF-SP. Confesso que quando vejo tantas siglas assim sinto até um arrepio. Talvez porque siglas provoquem em mim um sentimento negativo de antecipação — a antecipação de que vou ter mais um boleto para pagar. Mas qual não foi minha surpresa ao receber das siglas acima uma importante lição de profissionalismo na forma de uma cartinha enviada a todos seus associados, líderes de agências e RTVs do mercado.

Sabendo que você é ocupado (a), vou resumir a cartinha: a galera do cinema publicitário (locadoras de equipamento, fotógrafos, assistentes de câmera, iluminadores, sindicatos, produtoras, etc.) se juntou e resolveu dar um basta à extorsão anual que é a produção gratuita de filmes fantasmas para o Festival de Cannes. É, de fato, uma carta de alforria, anunciando o fim dessa escravidão. Elencam seus motivos apenas por educação, pois qualquer oligofrênico enxerga o desperdício de empreendimento humano que é (a) fazer filmes de mentira de graça para (b) clientes com fins lucrativos que (c) não precisam dessa comunicação (d) de modo a fazer propaganda da criatividade de agências que não conseguem ser criativas no dia a dia (e) ou para arrumar um aumento para duplas criativas.

Como a epístola de um apóstolo, trazendo as boas novas do profeta, a cartinha sinaliza uma chance de salvação para todos nós. Veja bem: quem aqui não está cansado de ler artigos reclamando das concorrências predatórias, do jogo sujo na remuneração, da indignidade na negociação com as mesas de compras dos anunciantes? Eu mesmo já gastei o jato de tinta da impressora e a saliva em simpósios, como o Hot Popcorn, mediado pelo queridíssimo Alexandre Lemos, deste Meio & Mensagem, no ano passado.

Não canso de me repetir ao utilizar a expressão que aprendi com meu amigo João Grigolin, que dizia, em sotaque de caipira “Quem é bão na profissão sabe dizer não.” Essa lição, o mercado publicitário, sanduichado entre verdadeiros profissionais, vai ter de aprender na marra.

Por cima, os anunciantes: gabaritados, organizados, inteligentes e hábeis em negociar suas posições — vencedores num mercado francamente hostil como o brasileiro. Perseguem implacavelmente a margem de lucro. Se podem pagar a agência em 120 dias e não em 30, vão tentar fazer isso. Se podem fazer uma concorrência entre trocentas agências e tem neguinho que topa participar, devem fazê-lo. Não é questão moral, é prática comercial.

Embaixo, os profissionais terceirizados, que botam a mão na massa para produzir as peças e estratégias criadas pelas agências, se organizando como sindicalistas para defender seu território e a possibilidade de realizar seu trabalho com qualidade e dignidade mínimas; superando mesquinharias e diferenças individuais¬ para agir como corpo coletivo e estabelecer práticas comerciais defensivas.

No papel de queijo e presunto, as agências de propaganda, como um bando de dançarinas burlescas obesas, rebolando e distribuindo cotoveladas umas nas outras, enquanto sorriem para as câmeras, anunciam com festas seus últimos prêmios. São como representantes da dança moderna num concorrido campeonato de MMA achando que vão ganhar.

A óbvia solução apresentada pelas amadas siglas lá do início é a mesma que pode mudar o nosso mercado: agir com profissionalismo e cooperação. Mas não espere isso dos megaconglomerados internacionais que comandam a festinha. Sua união inevitavelmente levaria a uma cartelização ainda maior do negócio, o esmagamento da remuneração dos trabalhadores e o fim absoluto das pequenas e médias agências.

É, amigão… parece que essa batata quente vai ter de virar baked potato nas mãos dos indivíduos¬ que dão vida às agências. O Clube de Criação, o Grupo de Mídia e o Grupo de Planejamento bem que poderiam começar a se organizar para defender os interesses de vida de seus afiliados. De madrugada, longe dos filhos, comendo pizza fria e fazendo uma concorrência inútil ou criando uma peça fantasma, quem paga esse boleto é você.

(*) Rodrigo Leão é sócio-diretor de criação da Casa Darwin e professor dos MBA de Marketing, MBA Executivo Internacional e International MBA da FIA. Uma vez por mês ele escreve como colaborador para Meio & Mensagem. Este artigo foi publicado na edição 1597, de 17 de janeiro.
 

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