Opinião: Lições de Victor Navasky
Jornalista critica a atividade de relações públicas, acusando-a de adotar qualquer atitude que possa favorecer o cliente, inclusive a distorção da verdade. Por Carlos Eduardo Lins da Silva
Jornalista critica a atividade de relações públicas, acusando-a de adotar qualquer atitude que possa favorecer o cliente, inclusive a distorção da verdade. Por Carlos Eduardo Lins da Silva
Meio & Mensagem
11 de julho de 2012 - 4h20
Na condição de um dos editores da Revista ESPM de Jornalismo, que tem os direitos de reprodução no Brasil da consagrada Columbia Journalism Review, a mais importante publicação de crítica de mídia no mundo, tive a magnífica oportunidade de acompanhar um dos mais importantes jornalistas americanos do século 20, Victor Navasky, publisher da CJR, em sua visita ao Brasil no mês de junho deste ano para o lançamento da nova publicação.
Em plena forma às vésperas do octagésimo aniversário, Navasky cumpriu uma verdadeira maratona de compromissos em quatro dias em São Paulo: uma entrevista ao programa Roda Viva da TV Cultura, três conferências a professores e alunos de graduação e pós na ESPM, uma conversa com jornalistas da Editora Abril, além de cerimônias e refeições em que foi solicitado a falar sobre suas experiências ao longo de seis décadas na profissão.
Ele trabalhou em publicações escolares, numa do Exército dos EUA (aos 18 anos, quando o serviço militar era obrigatório nos EUA e o país¬ estava envolvido na guerra da Coreia, a cujo front ele felizmente não chegou a ser enviado), em um pequeno jornal do Alasca, na revista do New York Times, no semanário The Nation e, agora, na CJR.
Seu período mais longo e mais famoso foi em The Nation, a mais antiga publicação jornalística periódica em circulação ininterrupta nos EUA (desde 1865) e um dos mais famosos porta-vozes da esquerda nos EUA. Navasky foi editor e publisher da Nation por mais de duas décadas.
Apesar de sua associação com esse título poder sugerir que Navasky seja uma pessoa de ideo-logia radical, suas palavras em público e em privado durante os dias em que esteve no Brasil em nada indicaram essa possibilidade. Ao contrário, ele sempre fez ponderações moderadas, razoáveis, conciliatórias sobre temas muito polêmicos sobre o jornalismo e seu futuro.
Por exemplo, o papel dos blogs e das mídias virtuais. Navasky acha que no curto prazo ele poder ser nocivo ao jornalismo por estimular demais a pressa na apuração de informações, o relaxamento nos procedimentos tradicionais de checagem de fatos, a veiculação de opiniões pouco embasadas e muitas vezes com retórica tão extremada que chega frequentemente ao nível da calúnia e da difamação.
Mas no longo prazo, crê ele, esses novos meios poderão passar por processos de aperfeiçoamento que atenuem esses problemas e cumprir uma importante função de democratização do jornalismo, com a inclusão de pontos de vista e vozes relevantes que sem eles ficariam de fora do debate público devido ao alto custo financeiro exigido para o estabelecimento das mídias tradicionais e praticamente inexistentes para as mídias virtuais.
Outro ponto que costuma causar divergências: controle privado dos veículos jornalísticos. Navasky citou o caso do Washington Post, que resistiu a pressões pesadas do governo federal americano sob o comando de Richard Nixon na década de 1970 durante o caso Watergate, que incluíam a ameaça de não renovação de concessões de lucrativas emissoras de TV, que — caso tivessem ocorrido — poderiam ter causado sérios prejuízos à empresa.
Para ele, uma das razões que permitiram ao Post essa atitude de defender valores essenciais para a atividade do jornalismo foi o fato de ele pertencer inteiramente a uma família, que não devia satisfações a acionistas e tinha poder abso¬luto para colocar todo o seu patrimônio em risco em nome desses princípios se assim quisesse proceder.
Mas Navasky não acha que a condição da propriedade particular seja suficiente para garantir a adesão de um veículo jornalístico a normas de conduta e níveis de qualidade exemplares. Claro que muito depende de quem seja o dono. A News Corporation é uma empresa controlada por uma família, mas alguns de seus títulos, como ficou claro com o caso do The News of the World, se comportam como se a única regra a ser obedecida fosse a do lucro imediato e de grande porte.
Um dos poucos momentos em que Nasvasky se pronunciou de modo mais beligerante foi ao fazer a distinção entre jornalista e relações públicas. Para ele, toda profissão tem um núcleo central de crenças que dá sentido ético a ela.
No caso do jornalismo, segundo sua opinião, é o apego à verdade; no de relações públicas é a adoção de qualquer atitude que possa favorecer seu cliente, inclusive, se for o caso, a distorção da verdade. Por isso, defende Navasky, as duas¬ atividades não podem ser equiparadas nem consideradas como parte de um mesmo gênero profissional.
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é editor da revista Política Externa e diretor do Espaço Educacional Educare. Uma vez por mês ele escreve artigos para Meio & Mensagem. Este texto foi publicado na edição 1517, de 9 de julho.
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