
SANTA CLARA
É uma empresa com nome de santa que está te dizendo: ambição não é pecado. Querer crescer é bom e, adivinhe, faz crescer. Somos um negócio para pessoas e marcas que também querem – e precisam – crescer. Temos produtos proprietários, um jeito Santa Clara de analisar, planejar, criar e executar, e uma ambição: ser uma consultoria de comunicação em que cada querer seja o molde para um jeito de pensar. Onde inteligência antecipa resultado. Traga sua ambição. Vamos querer juntos.
Entre o like e o linchamento: a linha tênue da reputação de marca
Publicado em 18/06/2025 (28 dias atrás)
As brasileiras Osklen e Cacau Show, além da americana Rhode Cosmetics, recém encabeçaram eventos emblemáticos na seara da gestão e reputação de marcas – seja para o bem ou para o mal. E nos deram a certeza de que gerir marcas, hoje, é tão volátil quanto o líquido de álcool 70º.
Décadas de construção estruturada de marca e reputação podem literalmente desmoronar em questão de minutos diante de decisões impopulares, equivocadas ou insensatas. Especialmente quando afetam ou desafiam a estabilidade social e emocional de seus públicos.
Ainda assim, se fossem apenas as variáveis intrínsecas ao negócio que tivessem o poder de destruir – ou reconstruir – equity, o controle dos gestores sobre a marca seria maior. Mas fato é que os fatores extrínsecos que habitam as redes, como a má fé de um usuário blasfemando sobre um serviço ou maldizendo um produto ou ainda um influenciador digital com força midiática de massa, também são capazes de cortar ao meio o valor de uma marca consolidada.
Por outro lado, capturar oportunidades com estratégias agregadoras, mexe o ponteiro do negócio — e da reputação — para o extremo oposto.
Num cenário onde a estética faz parte da ética nos negócios e tem papel estratégico, o branding passou a ser assunto dos conselhos diretivos das empresas. Enquanto há cerca de dez anos os solavancos de faturamento anual das empresas vinham da descontinuidade de produto ou matéria prima, distribuição capenga ou greve de funcionários, não é incomum que hoje elas venham principalmente de boicotes disseminados por usuários nas mídias sociais.
Sem ser professoral, vale lembrar o que é de fato o branding. Muito além de ser o que a marca comunica ou representa por meio de seus símbolos e signos, trata-se fundamentalmente do que ela faz e do impacto que gera na comunidade. Por sua vez, a reputação é o resultado direto das decisões e atitudes da marca – via de regra, implementadas por seus gestores e stakeholders da cadeia de valor.
Quando essas decisões são acertadas, a reputação se fortalece e o valor percebido aumenta. Quando falham, a reputação sofre. Por isso, costumo simplificar o conceito de branding.
O branding pode ser visto como uma espécie de jogo de somar e subtrair valor ao longo da vida de uma marca
As marcas que citei no início desta coluna são provas recentes e inequívocas disso. Osklen e Cacau Show ilustram como escolhas equivocadas podem prejudicar irreversivelmente uma marca. Sim, irreversivelmente porque deixam cicatrizes. Já o caso da americana Rhode demonstra o potencial positivo de decisões estratégicas assertivas.
Osklen: falta de atenção a fez reforçar o erro de terceiros
A marca Osklen viu sua reputação ameaçada após protagonizar uma polêmica envolvendo o rapper Oruam, filho do traficante carioca Marcinho VP. Oruam estampou a capa da revista inglesa Dazed usando roupas da marca, o que resultou num desconforto significativo com o público brasileiro.
Embora o editorial tenha sido produzido de forma independente, a Osklen agravou a situação ao reproduzir a imagem em suas redes sociais. Isso gerou imediatamente uma percepção negativa da marca, ao vinculá-la a uma figura evidentemente controversa — não apenas por sua hereditariedade, mas também pela apologia ao crime presente em suas músicas.
Sem dúvida, um episódio que evidencia a fragilidade da reputação diante de decisões equivocadas ou desatentas, especialmente no contexto digital, onde as informações são consumidas superficialmente. A brasilidade internacionalmente reconhecida da marca, que é sucesso inconteste em Nova Iorque e no mundo, não fez nem cócegas para proteger seu equity. Com o episódio, parte de sua reputação foi instantaneamente jogada no lixo, manchando sua história e subtraindo valor.
E aqui vale um parêntese: estima-se que mais de 80% dos usuários de mídias sociais veem apenas títulos, primeiras imagens publicadas e legendas no Instagram, formando opiniões rápidas definitivas e muitas vezes equivocadas sobre qualquer assunto.
Mesmo com a rápida correção do erro pela Osklen, o estrago já havia sido feito. A percepção da marca foi negativamente afetada.
Cacau Show: indícios de marca transformada em seita
Esse caso é muito mais complexo e revelador sobre a fragilidade da reputação corporativa. E, surpreendentemente, gerado dentro do próprio negócio.
Fundada por Alexandre Tadeu da Costa, a marca cresceu de modo exponencial e se tornou a maior rede de franquias do Brasil. Contudo, a excentricidade do fundador parece estar extrapolando os limites sensatos entre liderança carismática e práticas de culto corporativo, transformando a cultura organizacional em algo próximo de uma seita.
Denúncias envolvendo rituais coercitivos, tatuagens obrigatórias e cânticos ritualísticos abalaram profundamente a credibilidade da marca. Esta situação ilustra como uma gestão excessivamente centralizada e personalista pode destruir rápido a reputação construída ao longo de anos. Uma prova inequívoca de que, quanto antes as marcas se deslocarem de seus fundadores e criarem vida própria (equity), melhor.
O erro mais significativo aqui foi o silêncio institucional e a falta de mecanismos internos capazes de controlar ou orientar a liderança. Onde estava o conselho diretivo?
Este caso expõe, ainda, a complexidade psicológica por trás da adesão de indivíduos a líderes carismáticos. Um fenômeno analisado por estudiosos — de Freud aos mais contemporâneos, como Gustave Le Bon — que destacam o poder quase hipnótico que esse tipo de liderança pode exercer sobre as massas.
Rhode: estratégia assertiva e sucesso desproporcional
Em contraste com os casos anteriores, a Rhode, fundada por Hailey Bieber, demonstra como decisões estratégicas assertivas, especialmente no ambiente digital, podem levar uma marca ao sucesso extraordinário em tempo recorde.
Em apenas dois anos de vida, a empresa recebeu um investimento bilionário da E.L.F. Beauty, em grande parte graças à habilidade da fundadora de cultivar uma comunidade altamente engajada nas redes sociais. Isso é, na prática, somar valor à equação da marca.
Pouco antes desse marco, a Rhode já alcançava receitas de US$ 200 milhões e tinha se valorizado cerca de cinco vezes, um movimento contundente em um curtíssimo espaço de tempo.
Mais do que pelos seus produtos, a reputação e o valor da Rhode são fruto de uma construção inteligente de marca e de comunidade digital — focada na geração alpha, em detrimento da geração Z e dos millennials. Isso demonstra como decisões alinhadas às expectativas do público geram resultados exponenciais e evidenciam que a força da marca reside não só nos itens que oferece, mas no poder de influência, no branding consistente e nos valores que conectam suas usuárias à Rhode.
O que fica como aprendizado
O acrônimo BANI (em tradução livre, frágil, ansioso, não linear e incompreensível), que define o mundo atual, é uma realidade tão patente que chega a incomodar. O marketing parece pedir para que a gente durma com um olho fechado e outro aberto.
Antever desastres de imagem (lembre-se do recente caso de reposicionamento da marca Jaguar), capturar oportunidades de negócio — como é o caso da Rhode —, engajar-se com o público certo – sem ter medo de desagradar outras gerações – e, pior, aceitar a velocidade da adoção de hábitos e maneirismos da sociedade são algumas das decisões de risco que o marketing está tendo que tomar. Tornaram-se tarefas inexoráveis aos profissionais responsáveis pelo branding nas companhias.
Se eu tivesse que fazer uma recomendação, seria esta: o marketing deste primeiro quarto de século exige equipes diversas, formadas por pessoas que funcionem como verdadeiras “antenas” da cultura. Não se trata de ideologia, mas de uma necessidade real para quem busca construir um brand equity contemporâneo e relevante, capaz de alavancar o valor da empresa. Essa recomendação também envolve apetite ao risco e agilidade na tomada de decisões.
Ou você ainda tem alguma dúvida de que coragem é seguramente um dos atributos mais demandados para construir uma marca contemporânea?
Ulisses Zamboni – Chairman & Sócio