ProXXIma
29 de abril de 2020 - 7h40
Por João Carvalho (*)
Estamos em meio à pior das condições de voo para quem está no controle, seja do todo ou de algum departamento, de qualquer empresa, principalmente uma startup ou negócio que ainda não esteja em altitude de voo de cruzeiro, na qual as turbulências tem menor impacto.
Trazendo uma experiência pessoal para o contexto, em meados de 2007, após alguns acidentes aéreos que ocorrem na época, tive um período de medo, ou melhor pavor, de voar. Lembro que na época fazia de tudo para não entrar num avião; evitar viagens, inventar desculpas, ir de carro etc.
Hoje em dia é o oposto, adoro voar e aproveitar o tempo no avião para ler e colocar ideias em ordem.
O que me fez perder o medo? Fui pesquisar e entender melhor algumas coisas. Todos sempre falam das estatísticas e probabilidades de qualquer problema em voo vs diversos outros riscos, sendo que no primeiro caso os riscos são sempre menores.
Como a estatística por vezes pode refletir apenas o acaso, e quem já leu Freakonomics sabe o que digo, quis na época entender o porque das estatísticas e probabilidades serem tão baixas, e cheguei ao ponto que gostaria de trazer aqui; todos os pilotos são treinados, a exaustão, para reagir à grande parte das adversidades que podem acontecer em voo, ou pelo menos, as que já foram registradas no passado.
Com isso, qualquer problema em voo, pela teoria, seria apenas um procedimento pelo qual o piloto já foi treinado, já executou antes, já foi avaliado, passou no teste e sabe como lidar.
Voar sem uma turbina? Ficar sem combustível? Perder o trem de pouso? Despressurização da cabine? Sim, situações gravíssimas que ninguém gostaria de passar. Mas para um piloto, nada mais do que uma situação que já foi pensada, treinada e executada. E se assim não fosse, com certeza sua capacidade de reação e ação seria bem reduzida.
Em resumo, são treinados, e avaliados, em como lidar com situações adversas.
Uma vez um colaborador que passou pela Hands, e tinha sido piloto antes, me ensinou algo que incorporei no meu dia a dia, e faz todo sentido nesse contexto: voa, navega e comunica.
O que seria?
Imagine você, não sendo um piloto treinado, numa situação de emergência grave em voo. Provavelmente você teria o seguinte racional; (1) comunicar – a base ou torre sobre seu problema, perdendo alguns segundos, ou minutos importantes, tentando explicar o que estaria acontecendo para saber como agir, (2) navegar – escolhendo aonde tentaria pousar o avião, definido se faria num aeroporto alternativo mais próximo, ou mesmo num local adverso e (3) voar – ou seja, fazer os ajustes necessários para se manter voando até chegar no local que imaginou pousar.
Esse fluxo parece fazer sentido, até você perceber que ficou por último o mais importante, manter o avião voando.
Ou seja, a ordem que deveria ser seguida é exatamente inversa. Para quem assistiu o filme Sully, sobre o Piloto que consegue pousar o avião no Rio Hudson em Nova Iorque, isso fica bem claro quando ele primeiro segura o avião voando – voa, depois, com base no entendimento da razão de queda, ele escolhe o local que conseguiria pousar, o rio, ou seja – navega, e só então avisa a torre sobre o que vai fazer, por fim – comunica.
Trazendo isso para o dia a dia das empresas, e principalmente neste momento que estamos passando, diversas empresas e empreendedores estão passando por algo que nunca foram preparados, treinados e testados. E o pior, com vários desafios ao mesmo tempo.
É como se um Piloto, que não tivesse sido treinado, tivesse mais de um problema acontecendo ao mesmo tempo; sem turbina, sem combustível e sem o trem de pouso.
E o que acontece? As empresas podem correr o risco de deixar de voar.
É obvio que na aeronáutica existe um risco de vida muito maior no caso de algum erro, e por isso as práticas, os protocolos e treinamentos são feitos em excesso.
Porém, o percentual de empresas que vão à falência no Brasil, e no mundo, mesmo em condições normais da economia, já são infinitamente maiores do que problemas aéreos, sendo que muitos dos motivos que causam esses problemas já são conhecidos, catalogados e até monitorados em estudos e estatísticas. Porém, não são revertidos em treinamentos específicos. Simuladores de turbulências empresariais.
Voltando ao começo do texto, quem sabe não possa surgir agora, nos cursos voltados à Gestão e Negócios, matérias práticas e treinamentos em cenários adversos de negócios. Como lidar com uma crise global? Como manter seu time engajado e motivado mesmo sendo realista com cenários incertos? Como reinventar canais de distribuição? Como operar sem caixa? Etc etc.
Desta forma, faremos com que o momento atual não desperte o medo por empreender, por se arriscar, ou o medo de trabalhar em uma empresa menor, buscando voar alto nesse mundo turbulento das startups.