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Comunicação

Coffee Break: Talento sem prazo de validade

A ?razão da idade? versus a ?idade da razão?


2 de fevereiro de 2015 - 3h26

Por Marcos Caetano (*)

Dois episódios recentes me deixaram desconcertado, para dizer o mínimo. Tudo começou no final do ano passado, quando minha mulher, Alê, e eu fomos jantar com Lisete e Andrés Bukowinski. O papo não poderia ter sido mais agradável — e girou em torno de Andrés, uma vida em mais de três mil filmes, biografia recém-lançada pela jornalista polonesa Aleksandra Pluta que narra a extraordinária trajetória do maior diretor de cena da história da propaganda brasileira. Andrés tem nada menos do que 25 Leões de Cannes no currículo, dentre os quais o primeiro Leão de Ouro da história argentina, o primeiro da história brasileira e uma coleção de obras-primas como o Hitler da Folha, o menino que sorri lentamente no clássico filme da Seagram, incontáveis trabalhos para Itaú e Bamerindus, sem falar na célebre campanha de Bombril, que figura no Guiness Book. E tudo isso ainda é pouco diante da incrível vida do menino que nasceu em Varsóvia e fugiu do regime nazista rumo a Londres, onde seu pai era piloto da Royal Air Force, e de lá partiu para Rosário, Buenos Aires e, finalmente, São Paulo.

O fato de a vida de Andrés não ter virado filme escancara o quanto nosso cinema precisa aprender a descobrir boas histórias. Isso é absurdo. Mas absurda mesmo foi a resposta que ouvi do amigo ao final do jantar, quando perguntei como ia o trabalho: “Ando trabalhando pouco em São Paulo. Tenho feito mais coisas em outras capitais e até na Polônia.” Como assim? Como pode ser que a capital da publicidade no País não esteja entupindo o mailbox da produtora de Andrés com pedidos semanais de campanhas? Será que alguém perde a mão depois de ter feito mais de três mil filmes? Duvido muito. Será que ele perdeu a vontade? Nem por um segundo. Os olhos de Andrés brilham intensamente quando o assunto é cinema publicitário. Será que falta disposição? Bem, digo apenas que todo ano Andrés se descamba para o Canadá, onde pratica um esporte no qual poucos garotões se atrevem: o heli-ski, modalidade de esqui na qual os atletas saltam de helicópteros para descer montanhas com neve profunda e sem marcações de pista. É o único esquiador da AL que superou os cinco milhões de pés na modalidade.

Se Andrés continua um guri aos 75 anos, o que dizer de Washington Olivetto, que tem 64? Washington, cuja carreira se cruzou inúmeras vezes com a do amigo Andy— é assim que ele chama Andrés —, publicou um anúncio no qual deixava claro que, apesar de ter recebido premiações que nenhum outro publicitário brasileiro jamais havia conquistado, como o Clio
Lifetime Achievement Award e o The One Clube Creative Hall of Fame, isso não deveria significar, de forma alguma, que ele estivesse pensando em se aposentar. É claro que entendi a ironia e o senso de oportunidade de Washington ao publicar o anúncio, mas o simples fato de ler a palavra aposentadoria ao lado do nome do maior publicitário brasileiro de todos os tempos, na flor de sua “sessentice”, me causou arrepios. Escrevi o melhor publicitário brasileiro de todos os tempos, certo? Certíssimo. Perguntem a qualquer criativo do mercado, mesmo os de ego mais inflado, se alguém fez mais pela propaganda brasileira do que Washington. Ele é o publicitário que abriu as portas do mundo para o Brasil, que fez minha mãe, lá em Madureira, saber o que é um publicitário. É um prodígio de ideias que ganhou centenas de prêmios em festivais sem jamais apelar para fantasmas. Aliás, foi ele que cunhou o termo “fantasma”.

O que faz um jovem diretor de criação pagar pau para roqueiros septuagenários em suas turnês mundiais e não pensar no genial Andrés como um possível diretor para a próxima campanha? O que faz um promissor diretor de marketing que sofreu com a aposentadoria do escritor oitentão Philip Roth deixar de cogitar o gigante Washington numa concorrência? No Brasil, em algum momento e por alguma estranha lógica, talento passou a ser algo com prazo de validade. Isso é algo desesperadoramente triste — e que destrói valor. Essa questão da “razão da idade” versus a “idade da razão”, como ponderava Nelson Rodrigues, é um falso dilema. Há espaço para todos. Jovens diretores de cena aprenderão muito se tiverem de disputar mercado com o Andrés (ou com o Julinho Ribeiro, entre outros craques veteranos). Jovens gestores de marketing têm muito a aprender com a usina de ideias chamada Washington. E os dois “coroas”, podem apostar, aprenderão muito no convívio com a garotada. Promover esse encontro — ou reencontro — foi a ambição deste texto. Espero que a ponte que este quase cinquentão procurou erguer entre trintões e setentões possa ter bom tráfego.

* Marcos Caetano é diretor global de comunicação corporativa da BRF 

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