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Os punhos flamejantes do livre mercado

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Comunicação

Os punhos flamejantes do livre mercado

A boa criação publicitária precisa do desafiante no mercado, tanto quanto o capitalismo precisa de competição. Quanto menos competição real existe no mercado, mais chata é a propaganda


5 de fevereiro de 2013 - 9h02

*Por Rodrigo Leão

Do mesmo jeito que uma avó descreve seu netinho para uma amiga como “mais moreno” e “mais fortinho”, usando eufemismos pra dizer que é um mulato gordinho, revelando assim o próprio preconceito, o mercado usa o eufemismo “setor consolidado” para se referir a segmentos oligopolizados da economia. Como as prostitutas de luxo do Berlusconi, os oligopólios são uma indiscrição recorrente na vida dos donos do poder em todos os países capitalistas modernos (nos países divergentes, como Rússia e China, o monopólio é o modelo de negócio preferido, afinal, eles não precisam fingir que são capitalistas). Mas como as damas de moral distraída, os oligopólios são um assunto tabu nos salões da grande mídia.

Por dois motivos: a grande mídia é controlada por uns poucos grupos — dãh! E porque junto com a concentração do poder econômico vem a concentração do poder de anunciar. Como a mídia vive de vender espaço, certos assuntos são melhor esquecidos do que comentados. Por isso, o eufemismo “consolidado” passou a ser usado sem vergonha por jornalistas idem. Afinal, “consolidado” soa sólido, bonito e organizado. O lucro é consolidado. Vitórias são consolidadas. Bons relacionamentos são consolidados. Se a mídia usasse o termo correto que é “concentrado” para falar dos segmentos onde cinco participantes ou menos controlam mais de 90% de um setor da economia, ia dar o maior merdoléu, com o perdão do uso do meu carioquês coloquial. Porque rapidamente o grande público ia perceber que são estes os setores que pior tratam os consumidores na nossa economia.

E se você acredita que o Cade vai nos salvar, bem, aproveite e peça um pônei também porque você está sonhando. Governos, por definição, são formados por gente que acha normal pegar o dinheiro dos outros sem trabalhar. A coleta de impostos concentrada nos oligopólios somada às normas de governança mínimas, as quais as bolsas de valores modernas impõem às empresas com ações negociadas, fazem desses grandes negócios as vacas leiteiras do erário em muitos países.

A essa altura, esse texto já está lembrando você de uma fascinante reunião de condomínio numa noite fria. Afinal, por que o colunista de criação está falando de oligopólios e não de criação? Porque a criatividade é o punho flamejante do negócio desafiante, não a chibata senhorial do oligopolista. A boa criação publicitária precisa do desafiante no mercado, tanto quanto o capitalismo precisa de competição. Quanto menos competição real existe no mercado, mais chata é a propaganda. A boa publicidade é um termômetro importante da efervescência de um mercado dinâmico. Competidores reais estão melhorando seus produtos e serviços permanentemente em busca da sobrevivência.

Junto com eles prolifera a propaganda criativa. Já os setores concentrados tipicamente perdem a mão porque as marcas não estão de fato competindo. De fato, elas não estão nem aí pra você, bobão. Basta ver a falta de escrúpulos de uma empresa como a Net, cujos operadores mentem ao vender planos que ela simplesmente não entrega depois (aconteceu comigo essa semana!), e que tem a cara de pau de dizer por aí que “O mundo é dos nets.” Ou então a promoção da Gol (que eu também recebi esta semana), anunciando passagens São Paulo-Rio a partir de R$ 98 durante o carnaval. Eu entrei no site: era para ir na segunda e voltar na terça, e não era R$ 98 — a mais barata estava o dobro disso. Mentir descaradamente para o consumidor pode, Arnaldo? Para quem tem oligopólio pode.

É esse o ponto: para ser criativa a propaganda precisa de um mercado também criativo, ativo e competitivo. A natureza dos oligopólios é tentar aniquilar a concorrência, controlar a distribuição e sangrar fornecedores e consumidores até o último centavo. Não é esse o comércio que constrói vínculos, fomenta a sociedade e gera negócios sustentáveis que contribuem para o empreendimento humano. Cabe a nós acender nossos punhos flamejantes e entrar na luta por um mercado mais livre, competitivo e criativo.

*Rodrigo Leão é sócio-diretor de criação da Casa Darwin e professor dos MBA de Marketing, MBA Executivo Internacional e International MBA da FIA. Este texto foi publicado na edição 1545 do Meio & Mensagem, de 04 de fevereiro. 

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