Meio & Mensagem
17 de dezembro de 2014 - 10h20
Por Gian Martinez (*)
Quando pequeno tive a sorte de conviver sempre perto dessas duas palavras: crianças criativas. Esse era o nome do projeto que meus pais tentavam implementar em território brasileiro no meio da década de 1980.
A visão de mundo deles era simples e de impacto profundo: se nossa sociedade se focar em desenvolver o potencial criativo das nossas crianças teremos gerações mais bem preparadas para encontrar soluções criativas para os problemas do mundo. Resumindo, viveríamos em um mundo melhor para todos.
Porém tentar emplacar naquele contexto de Brasil um programa de Educação Não-Formal (fora do currículo escolar) era uma tarefa quase impossível. Ainda hoje estamos muito longe de tratar o assunto com a prioridade devida. Mas podemos afirmar que os ventos definitivamente mudaram de direção.
No mundo de hoje, não vence o maior, não vence o mais forte, não vence o mais rico, não vence o menor… vence o mais criativo. Estamos sendo carregados por uma forte onda global que caminha em uma única direção: da ascensão da sociedade criativa.
Além das histórias fantásticas da Avó Feiticeira Strega Nona, da Onça que Ganhou Suas Pintas, do Haroldo e Seu Lápis de Cor, do João e do Pé de Feijão, entre muitos outros, os materiais de crianças criativas tinham algo especial: ensinavam um método criativo. Um processo de estímulos que poderia ser replicado em larga escala com o objetivo de incentivar a criatividade das crianças. Naquela pouca idade, o simples fato de conhecer o conceito de “método” já era de pirar o cabeção.
Foi, então, que passei a entender que para toda arte existe uma ciência. Todos os “mestres criativos” da humanidade conseguiram ao longo da sua vida desenvolver trabalhados absolutamente geniais de forma consistente e constante porque desenvolveram uma metodologia para sua arte. Da Vinci, Beethoven, Kubrick, Jobs, entre muitos outros, eram “mestres” pois dominavam com fluidez o balé entre a arte e sua ciência e entre a ciência e sua arte.
A boa notícia é que mais e mais pessoas entendem que desenvolver e executar boas ideias é um processo consciente e trabalhoso. Vejo um mundo mais instrumentalizado para dar bases sólidas à formação de uma geração de criativos mais cientistas e de cientistas mais criativos. Das estatísticas dos jogos de futebol à escolha de quando postar uma foto, estamos sempre cobertos de informação para tomar a melhor ou a pior decisão de forma como nunca tínhamos visto antes.
Arte e ciência, que sempre caminharam de mãos dadas, parecem agora andar abraçadas. Essa nova realidade já está impactando profundamente a indústria do entretenimento e do marketing. Netflix, Buzzfeed, native advertising, entre outras palavras da moda estão aí para comprovar que essa realidade chegou para ficar.
Particularmente, acho isso maravilhoso por um simples fato: a robotização de alguns aspectos da vida vai proporcionar espaço para o homem ter mais foco em fazer aquilo que sabe fazer de melhor, que é pensar, criar. Estamos vendo um processo sistêmico de fomento à criatividade global impulsionado por informação precisa e em tempo real.
Esse novo mundo me faz retomar o sonho nutrido pelos meus pais: precisamos preparar nossas próximas gerações para serem, acima de tudo, crianças criativas.
* Gian Martinez é cofundador da Coca-Cola Accelerator e escreve para o Meio & Mensagem mensalmente. Este artigo está publicado na edição 1640, de 15 de dezembro de 2014, de Meio & Mensagem, disponível nas versões impressa ou para tablets Apple e Android.