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Opinião

Mais que um trabalhador, seja você o trabalho

Atitude empreendedora, hoje, vai muito além de fundar uma companhia do zero


6 de setembro de 2021 - 11h44

(Crédito: Pixabay)

No mundo todo, o empreendedorismo está mais em alta do que nunca. Para além de necessidade, tornou-se convicção. Hoje, a chamada atitude empreendedora extrapola fundar uma companhia do zero e ajuda a solidificar novos ossos do ofício.

No 3º trimestre de 2020 despontaram mais de 1,5 milhão de novas empresas nos EUA — dobro do registrado no mesmo período do ano anterior. O Reino Unido teve 30% mais novos negócios. E na França, recorde histórico: só em outubro, 84 mil novos empreendimentos — alta de 20% ante o mesmo mês de 2019.

O Brasil não fica atrás: o Global Entrepreneurship Monitor (GEM) nos destaca ante 55 países que estuda há mais de 20 anos. Somávamos 53,4 milhões de empreendedores em 2019. De lá pra cá, foram abertas 3,3 milhões de novas empresas. Decerto a pandemia contribuiu para essa aceleração, mas o movimento sobrepuja eventos temporais e inesperados.

E os números refletem mudanças socioculturais dentro e fora das firmas. Aprimora-se o conceito de “sociedade do desempenho”, mas vem se naturalizando um vocabulário mais humanizado na vida profissional, com termos como autonomia, criatividade, cooperação e sentido — capazes de desconstruir os limites da produtividade e redefinir a ideia de “empreendedor”.

Até o século 18, o trabalho, delegado a servos e escravos, não tinha valor social. É com o capitalismo que ele ganha poder de “dignificar o ser humano”, a atestar a importância social de cada um, tornar-se vital à subsistência.

A “sociedade disciplinar” passou a camelar sob rígidas regras de horário e escopo. Ninguém podia se dar ao luxo de se preocupar se seu emprego trazia bem-estar ou mudaria o planeta. Ainda que cringe, os Millennials quebraram esse paradigma. Levantaram a bandeira do propósito, do “trabalhar para viver, e não viver para trabalhar”, da gig economy, que preza pela independência e controle do próprio tempo. Mas a outra face da moeda revelou um caráter nada cool: a precarização do vínculo trabalhista travestida de microempreendedorismo individual. As motivações eram legítimas, mas mais que ser empreendedor, seria preciso agir como tal; cultivar um cuidado empresarial consigo próprio, suas aspirações e inventividades.

A ideia não é se vender de corpo e alma à corporação. Mas ser seu próprio trabalho, bem como colocar seu talento a serviço dos job descriptions, deadlines e outras burocracias. Ser um capital fixo, “que exige ser continuamente reproduzido, modernizado, alargado, valorizado”, como diz o filósofo austro-francês André Gorz.

Quando vi gente xingando no Twitter, sobre ser “pressionado” a, além de bons funcionários, brilhar nas redes, em dancinhas no TikTok, me deu certo desapontamento com essa nova geração. Não se desperdiça tanto potencial: a união de acesso à informação e recursos tecnológicos ímpares nunca foi tão democrática. É um combo que lapida saídas criativas, ideias mirabolantes, novas formas de ver — para dar uma de tiktoker, lançar uma inovação sem precedentes ou lidar engenhosamente com a simples demanda diária.

Essa potência produtiva também é força para novos negócios: segundo o GEM, no País, 65,6% dos empreendedores o são a fim de fazer a diferença no mundo — principal razão depois da garantia da sobrevivência e antes da ambição de ser rico.

Convido vocês a incorporarem tal meta para além das novas empreitadas de negócios. Que tal mirar a transformação, por meio de suas próprias habilidades e experiências, como um mantra pessoal? Seja você seu maior empreendimento. Sorte de quem puder acompanhá-lo nessa jornada.

*Crédito da foto no topo: Oleg Magni/Pexels

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