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Como o PL do Pai Presente pode beneficiar as empresas?

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Como o PL do Pai Presente pode beneficiar as empresas?

Estudos apontam que ampliar a licença-paternidade reduz desigualdade de gênero, melhora desenvolvimento infantil e traz vantagens corporativas


4 de junho de 2025 - 9h33

(Crédito: Shutterstock)

Atualmente, os homens têm apenas 5 dias de licença-paternidade determinados por lei, enquanto as mulheres usufruem de 120 dias. Na legislação, entretanto, o tema sempre esteve “em aberto”. A Constituição de 1988 estabeleceu a licença-maternidade em 120 dias e a licença-paternidade em apenas 5 dias, ambas “passíveis de regulamentação própria”. Mesmo assim, desde 1988, o texto referente à licença dos pais nunca foi modificado. Enquanto a licença-maternidade é regimentada, a paterna ainda não.

“Quando a mulher tira sua licença-maternidade, no eSocial vai constar que ela usufruiu de 120 ou 180 dias, dependendo da empresa. Já para os homens, mesmo que eles tirem os 5 dias estabelecidos, no sistema constará apenas como falta abonada. A gente nem sabe se ele estava em licença-paternidade ou de atestado médico. Isso significa que, desde 1988, não temos nenhum registro oficial de quantos homens tiraram licença-paternidade”, afirma Leandro Ziotto, fundador da 4Daddy e cofundador da Coalizão Licença Paternidade, a CoPai, que defende a regulamentação da licença-paternidade estendida, remunerada e obrigatória no Brasil.

Leandro Ziotto, cofundador da 4Daddy e da CoPai (Crédito: Divulgação)

A regulamentação do tema, entretanto, nunca foi “palatável” para as câmaras legislativas, afirma Ziotto. Agora, o jogo parece ter mudado e, desde 2023, o contexto está mais favorável para que a mudança ocorra. Primeiro, porque a sociedade evoluiu culturalmente no entendimento do papel dos pais na criação dos filhos. Uma pesquisa da CoPai, em 2024, revelou que 92% da população apoia o aumento da licença-paternidade, e 63% apoiaria uma licença de 30 dias.

Além disso, as próprias empresas já estão estendendo o benefício por iniciativa própria. Como, por exemplo, o Grupo Boticário, que estendeu para 120 dias a licença para os pais, cis e trans, homoafetivos e não consanguíneos. Já a Diageo, por sua vez, oferece 180 dias para ambos cuidadores, incluindo pais adotivos e casais homoafetivos.

O terceiro ponto é que, em 2023, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 20) sobre a falta de regulamentação da licença-paternidade. Desse modo, o Supremo Tribunal Federal determinou que o Congresso Nacional tem 18 meses para legislar sobre o tema, e o prazo está prestes a acabar, em junho de 2025.

PL do Pai Presente

Atualmente, existem dois projetos de lei que regulamentam a licença: o PL6216/2023 da Câmara e o PL3773/2023 do Senado. Os textos, que têm o mesmo teor, estão correndo nas casas legislativas neste momento e propõem a modernização da licença-paternidade.

O primeiro ponto do texto determina a ampliação do tempo de licença-paternidade de forma paulatina. “Esse projeto propõe o aumento progressivo da licença-paternidade em até 60 dias. Começaria com 30 dias, depois passaria para 45 e, no quinto ano, chegaria aos 60. É o que chamamos de uma proposta factível, que vai adaptando tanto a sociedade quanto os aspectos orçamentários ao longo do tempo, de forma gradual”, explica Camila Bruzzi, presidente e cofundadora da CoPai.

O texto também inclui a criação do salário-paternidade, para garantir o sustento da família durante a licença, e o estabelecimento do custeio pelo Estado, como acontece na licença-maternidade, de modo a não onerar o empregador. Além disso, os textos incluem a licença parcelada, para que o pai possa optar por tirar uma parte para estar presente nos primeiros cuidados e em outro momento, após o retorno da mãe ao trabalho.

Benefícios para os homens

O que está em questão neste projeto de lei não é apenas o direito do pai, e, sim, da criança, como afirma Leandro. O Artigo 227 da Constituição defende a proteção integral à criança e ao adolescente como um dever de todos, incluindo a família, a sociedade e o Estado, além de assegurar o direito à convivência familiar e comunitária. Entretanto, existem, hoje, mais de 5,5 milhões de crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento.

Além disso, pesquisas destacadas pela CoPai apontam que a presença ativa do pai contribui para o desenvolvimento cognitivo e socioemocional da criança, ajuda na construção da identidade, no desempenho escolar e está associada a menores índices de violência e envolvimento com drogas na adolescência. E os benefícios não são apenas para a criança, mas também para os homens.

A começar pela instrumentalização do cuidado. Estudos indicam que os homens vivem sete anos a menos que as mulheres simplesmente porque não têm o hábito do autocuidado. “Uma de nossas pesquisas revelou que homens que participaram do cuidado desde o nascimento dos filhos tinham indicadores melhores de saúde do que os solteiros ou daqueles que não participaram do cuidado”, afirma Leandro.

“O segundo ponto é que cuidar de uma criança ensina o homem a exercer uma masculinidade mais saudável. E isso se reflete diretamente na forma como ele lidera. Também fizemos uma pesquisa que mostrou que o homem que é pai tende a ser um líder mais acolhedor e ético nas relações humanas, principalmente com mulheres”, continua.

Avanços para países e empresas

Investir no cuidado das crianças logo na primeira infância também impacta no crescimento econômico de um país. Segundo o economista James Heckman, vencedor do Prêmio Nobel, para cada US$ 1 investido na primeira infância, o retorno pode chegar a US$ 7 na vida adulta. Já a OCDE (2025) estima que políticas de apoio às famílias podem elevar o PIB per capita em até 20% no longo prazo. Olhando para o lado das empresas, outro estudo também apontou que políticas parentais podem elevar em 93% as chances de desempenho financeiro acima da média.

O aumento da licença-paternidade traz uma série de benefícios significativos para as organizações, impactando positivamente na retenção de talentos, produtividade, no engajamento dos funcionários e na reputação da marca. O relatório “State of the World’s Fathers 2023” aponta que 45% dos homens pais mudariam de emprego para ter mais tempo de licença-paternidade. Entretanto, a pesquisa reconhece que há barreiras que impedem os homens de aproveitar integralmente a licença, como a falta de remuneração suficiente, medo de perder o emprego, falta de apoio da liderança e receio de ser julgado.

Outra pesquisa, de 2017, da EY, com mais de 1.500 empregadores nos Estados Unidos, revelou que aqueles com políticas de licença parental remunerada reportaram efeitos positivos na moral dos funcionários (82%), rotatividade (71%), lucratividade (61%) e produtividade (71%).

“As pessoas querem equilíbrio entre suas funções ocupacionais e parentais. Querem poder cuidar dos filhos, das companheiras ou dos companheiros, seja qual for a configuração familiar”, reflete Leandro. “Então, sim, isso fortalece a marca empregadora, aumenta o comprometimento dos funcionários e a produtividade. Além disso, o gasto em termos financeiros é muito pequeno diante do retorno econômico que essa empresa pode ter”, complementa.

Promoção da equidade de gênero

O tempo adicional que o pai dedica aos cuidados iniciais das crianças reduz a probabilidade de dissolução da união durante a infância dos filhos e fortalece a estabilidade familiar, segundo um estudo de 2015. O que também ajuda a aliviar a sobrecarga com o trabalho de cuidado que recai sobre as mulheres. Logo, existem benefícios também para as mães.

“Para começar, ter o parceiro em casa nesse início, no puerpério, é muito importante. A gente já tem pesquisas que mostram que a presença do pai impacta diretamente na amamentação, tanto na chance de dar certo quanto na chance de ser interrompida precocemente se ele estiver ausente”, afirma Camila. Além disso, outras pesquisas mostram como a presença e o suporte paterno reduzem os riscos de depressão pós-parto.

“Os estudos mostram que quando o homem tem a oportunidade de tirar uma licença-paternidade estendida, de pelo menos 30 dias, ele fortalece o vínculo com o bebê, cria novos hábitos e passa pelo processo de aprendizado. Isso aumenta muito a chance de ele continuar participando do cuidado da criança e da família ao longo da vida”, continua a presidente. Ou seja, a redução da sobrecarga para a mulher não acontece apenas no período da licença, mas se estende por toda a jornada da família.

“Nunca vamos alcançar uma verdadeira equidade de gênero enquanto carregarmos sozinhas a responsabilidade pelo cuidado. E os homens, quando viram pais, também precisam sair mais cedo para buscar o filho doente na escola, levar ao pediatra, sair da reunião porque a escola ligou. Tudo isso precisa ser compartilhado”, destaca Bruzzi.

Camila Bruzzi, presidente e cofundadora da CoPai (Crédito: Divulgação)

Para a executiva, o papel das empresas neste momento é se mostrarem aliadas da pauta e impulsionarem o debate público. “Já existem empresas que oferecem a licença estendida, mas o que faz diferença é quando a companhia realmente estimula isso: quando a liderança tira a licença e dá o exemplo, quando há treinamento para a gerência média saber lidar com a situação em seus times. Então, é essencial que haja incentivo e, principalmente, a compreensão de que isso é algo positivo para o funcionário, para os colegas de trabalho e para a empresa”, defende.

Para os especialistas que defendem a ampliação da licença-paternidade para 30 dias, o apoio das empresas é fundamental neste momento que antecede a possível aprovação da lei. Experiências já implementadas voluntariamente, como nos casos do Boticário e Diageo, mostram que os benefícios são significativos: profissionais mais engajados, saudáveis e preparados para liderar equipes com mais empatia.

Além da mobilização nas redes e do diálogo com o poder público, uma das iniciativas da CoPai é uma carta aberta que reúne assinaturas de líderes empresariais e busca demonstrar que há respaldo do mercado para a proposta. Diante de uma taxa de natalidade em queda e do aumento nos afastamentos por doenças mentais, eles argumentam que a medida não só é viável, como necessária. “Estamos falando de um período de 30 dias, que é o mesmo de férias. Ou seja, não é um bicho de sete cabeças”, resume Camila.

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