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Monica Lewinsky e as caçadoras da sororidade perdida

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Opinião

Monica Lewinsky e as caçadoras da sororidade perdida

Os diferentes pesos e medidas usados nessa história pública se repetem no nosso dia a dia. A crucificação sistemática "da outra mulher" e o perdão do marido traidor que Hillary viveu publicamente são vividos por muitas mulheres na vida privada.


3 de outubro de 2022 - 9h02

Atriz Beanie Feldstein é Monica Lewinsky em Impeachment: American Crime Story, que tem como tema o impeachment e casos extraconjugais de Bill Clinton (Crédito: FX/Reprodução)

Terminei meu último artigo aqui usando uma citação de Madeleine Albright, ex-secretária de estado americana. E, descobri, enquanto pensava no texto que você está lendo agora, que o melhor jeito de começá-lo seria novamente por ela. Então, eu a repito: “existe um lugar especial no inferno para as mulheres que não ajudam outras mulheres”.

Por que a escolha pelo repeteco? Porque o meu assunto por aqui continua sendo a importância da sororidade, e os impactos (ruins) que a falta dela trazem.

O exemplo que vou usar nesta coluna é provavelmente conhecido por você, leitor ou leitora: uma adolescente que se deixou enamorar por um dos homens mais poderosos do mundo e protagonizou o primeiro caso de slut-shaming em escala global.

Sim, falo de Monica Lewinsky, que acaba de produzir uma temporada da série American Crime Story, a terceira, contando sua história e a da votação do impeachment de Bill Clinton, o homem poderoso (e casado) sobre o qual falei ali em cima (alerta de spoilers a seguir).

Eu era jovem quando o caso veio a público e não lembrava dos detalhes dele. Ver a série me fez entender que um dos maiores escândalos globais que conhecemos nasceu exatamente da falta de sororidade. Se Linda Tripp não fosse uma pessoa tão complicada e tão carente, e tivesse guardado o segredo que a amiga pediu que guardasse, e a acolhido naquele momento tão difícil de fato, nada do affair teria sido revelado.

Mas a escolha de Linda foi exatamente o caminho mais reto pro inferno, de acordo com Albright: para ganhar a atenção que tanto desejava, ela expôs a amiga da pior forma possível, tornando públicas questões que ela tinha prometido manter privadas. E, se a série fez um bom trabalho investigativo, o que ela mostra é que o reconhecimento público que Linda Tripp tanto desejava nunca veio. O máximo que ela conseguiu foi escrever um livro com a visão dela dos fatos. Talvez tenha ganhado algum dinheiro, mas faleceu sem a apreciação pública que buscava.

As consequências para Monica foram as mais nefastas possíveis: primeiro, uma crucificação em escala global – como falei antes, o primeiro episódio de slut-shaming e cyberbullying massivos. Isso a prejudicou profissional e pessoalmente: ela nunca se casou, demorou a encontrar um caminho profissional, e arrisco dizer que até hoje arrasta os impactos de ter sido exposta como foi.

Vejam bem: não estou dizendo que o que ela fez é bonito ou correto. Sou casada e não gostaria de passar pela mesma situação que Hillary passou. Mas daí a isso ser discutido na internet e no jornal da TV aberta há uma grande distância, não é mesmo?

E a pior parte vem agora: quando olho para as consequências pro único homem envolvido no escândalo, não vejo nada que seja tão impactante. Vamos combinar que a Monica não teve um caso sozinha, né? E por mais que o casamento dele tenha balançado e ele tenha corrido o risco do impeachment, é fato que ele terminou seu mandato e retomou sua vida pessoal sem grandes consequências públicas.

Os diferentes pesos e medidas usados nessa história pública se repetem no nosso dia a dia. A crucificação sistemática “da outra mulher” e o perdão do marido traidor que Hillary viveu publicamente são vividos por muitas mulheres na vida privada.

É hora de igualarmos, também aqui, os dois lados da balança.

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