Assédio e limites: o desafio de regulamentar o metaverso

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Assédio e limites: o desafio de regulamentar o metaverso

Após caso de abuso no Horizon Worlds, da Meta, advogados alertam sobre importância de adiantar políticas de uso para os novos ambientes virtuais


10 de fevereiro de 2022 - 6h03

 

Servidor Cidade Alta, comandado pela Outplay, tem sistemas de seleção de usuários e regras sobre assédio (Crédito: Divulgação/Outplay)

Ao longo da história da internet, conflitos e abusos entre usuários fizeram com que o ambiente de interação virtual tivesse de ser monitorado para evitar potenciais crimes. Assim, foram criados, por exemplo, o Marco Civil da Internet, a lei que criminaliza a prática do stalking, a LGPD e tantas outras. Tais legislações foram originadas conforme a frequência desses conflitos foram marcando presença nas plataformas. Diante de uma terra inexplorada, como é o metaverso, todas as regras e vigilâncias demandam ser repensadas.

Em novembro de 2021, uma usuária alegou que foi apalpada por um outro usuário no Horizon Worlds, plataforma de realidade virtual do Facebook, enquanto demais incentivavam o assédio. “Dentro de 60 segundos depois de entrar, eu fui assediada verbal e sexualmente por três ou quatro avatares masculinos, com vozes masculinas, essencialmente, mas praticamente estupraram meu avatar e tirei fotos. Enquanto eu tentava fugir eles gritaram: ‘não finja que você não amou’ e ‘vá se esfregar na foto’”, escreveu Nina Jane Patel, 43, em uma publicação em blog.

A partir disso, a Meta anunciou na semana passada que vai estabelecer uma distancia mínima de um metro entre os usuários. Apesar de considerar o evento infeliz, a empresa disse que a usuária não usou os recursos de segurança para bloquear interações. Vivek Sharma, vice-presidente da plataforma Horizon, anunciou que a empresa irá tornar os recursos mais localizáveis e vai explorar a possibilidade de acrescentar novos controles no futuro.

(Crédito: Divulgação/Meta)

Conforme o metaverso se propõe a trazer mais camadas de realidade na dinâmica da internet, seja ela a partir da conexão com blockchain, gameficação e atributos tridimensionais, os conflitos potenciais nesse universo se tornam passíveis de ganhar maior escala do que os encontrados nos demais modos de interações virtuais, como plataformas sociais e de mensageria.

O próprio fato de que o metaverso ideal seria a conexão flúida entre diferentes metaversos torna o conceito descentralizado, o que desafia a implementação de uma política só, como fazem as big techs sobre seus produtos. O Twitter, por exemplo, tem suas políticas de uso, mas o usuário não transita entre ele e o Instagram como se eles estivessem conectados. Portanto cada uma dessas redes tem suas regras de segurança. No metaverso, “essa discussão de soberania, territorialidade e lei a ser aplicada é um dos grandes desafios que nós temos”, afirma Patrícia Peck, sócia do Peck Advogados e membro titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais (CNPD).

Para Leonardo Britto, advogado especialista em crimes virtuais e cibernéticos, além de agressões, esse novo território a ser explorado pode vir acompanhado de crimes contra a honra (injúria, calúnia, difamação), crimes financeiros (a partir de uma invasão praticada por hackers dentro da plataforma, como já ocorre no WhatsApp e Instagram) e falsificação ideológica (a partir da utilização de um dado adquirido indevidamente para criar um perfil como se fosse outro usuário). “Considerando que essa nova modalidade de inovação tecnológica irá multiplicar o nível de interação dos usuários, é bem verdade que os conflitos também passarão a ser mais intensos, de modo que diversos problemas originados no metaverso serão remetidos ao Poder Judiciário”, alerta.

No Cidade Alta, servidor do GTA comandado pela Outplay, há regras que proíbem preconceito, com sujeito a banimento e remoção do servidor, e sistemas através do qual o jogador tem que solicitar permissão para o outro caso queira abraçar ou beijar para evitar qualquer tipo de assédio. Como se trata de um servidor privado, o Cidade Alta ainda zela pela curadoria da comunidade. A empresa faz entrevistas para aceitar a participação de jogadores para limitar o que é permitido ou não no ambiente, principalmente atitudes inadmissíveis no mundo físico.

“Assim como na vida real, o metaverso é onde as pessoas têm relação umas com as outras e estão lá para buscar uma experiência diferente. E quando falamos de pessoas, sociedade, a regulamentação é essencial para o bom convívio. O metaverso, para ser um ambiente saudável, precisa caminhar da mesma forma que a vida real: bom senso, leis, regras e consequências para atitudes que fujam do que é estabelecido para aquele determinado lugar”, explica Paulo Benetti, CEO da Outplay.

Já as marcas devem ficar atentas aos chamados “grileiros digitais”, diz Patrícia. A grilagem é a prática delituosa de lotear, desmembrar ou fazer propostas sobre terras públicas, sem autorização do órgão competente e em desacordo com a legislação. No digital, ela é feita com títulos digitais. “A partir do momento que você passa a ter um espaço, dentro dos metaversos, você tanto pode ter novamente um movimento de grileiros digitais, querendo capturar ali, algo que seria de proteção de marcas já reconhecidas. Então já há uma preocupação das marcas, nesse sentido, como aconteceu, anteriormente nos registros de domínio e depois, nos registros de perfil e fanpage de mídia social. Essa questão da proteção da marca com os indivíduos é a proteção de imagem, reputação”, explica.

A pretensão da AMG, fabricante e detentora dos direitos dos veículos táticos de defesa “Humvee”, foi relacionada à eventual violação de marca registrada, proposta contra a Activision Blizzard, Inc. e Activision Publishing, Inc., por ter sua marca e veículos representados em diversos momentos no jogo Call of Duty.

Enquanto ambos o desenvolvimento do metaverso e de uma política de uso são pensados, o melhor caminho a seguir é o da auto-regulação à exemplos do que já foi aprendido na era da Web 1.0 e Web 2.0, opina Peck, com um Código de Ética e de regras aplicáveis a esse ambiente e a todos os seus usuários, um Tratado Internacional, de um código de conduta do ponto de vista de comércio, das tratativas das relações, do uso da moeda, das trocas relacionadas aos bens e comportamento.

Ao Meio & Mensagem, Maren Lau, VP regional da Meta na América Latina, explicou que a empresa investiu US$ 50 milhões em para trabalhar com parceiros, organizações de direitos civis e criadores pelos próximos dois anos sobre segurança e privacidade no metaverso, e têm o intuito de usar o que aprendeu ao longo dos anos de internet para aplicar no novo produto. “A Meta enquanto companhia foi criada quando a internet já estava criada, então não houve um aprendizado do que a internet ia se tornar. Agora, temos os aprendizados de como a internet evoluiu. Estamos muito atentos”, afirmou.

De acordo com Benetti, os maiores desafios em instituir regras de regulação em um metaverso são contratar desenvolvedores capacitados para criar as regras e proteções e ter os regulamentos de fácil acesso e entendimento para que os usuários estejam preparadas ao acessar a realidade.

Para Britto, é certo que algumas diretrizes serão aplicadas, como o Direito do Consumidor (caso ocorra falha na prestação de serviço por parte dos fornecedores e vendedores de produtos dentro do metaverso) e também no Direito Penal (na prática de crimes contra a honra, na hipótese de um usuário/avatar atentar contra a dignidade de outrem). “São pequenos exemplos, mas é certo que a partir da implantação, teremos que nos atualizar intensamente para atender as novas e diversas práticas indevidas”, adianta Britto.

**Crédito da imagem no topo: Lucky Step/Shutterstock

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