Eduardo Tracanella
6 de novembro de 2013 - 10h45
Desde o nascimento de Maria eu tenho desavisadamente me questionado sobre um monte de coisas. Talvez seja um processo natural de quem se torna pai depois de anos de reflexões autocentradas e de decisões cujo maior impacto se dava em torno do próprio umbigo.
E acho que isso acaba acontecendo cedo ou tarde com todo mundo. Seja pelo motivo que for, para cada um é diferente.
Para mim, o grande questionamento, claro, gira em torno de Maria. Em torno do pai que quero ser, do mundo que quero para ela. E de como posso preparar o meu mundo, que não é mais só meu, para recebê-la. Receber a Maria e sua metamorfose ambulante, quase andante, diária.
E a conversa aqui não é funcional, é estrutural. E não é sobre dinheiro, é sobre valor. Qual o valor do que faço? Para mim e para ela?
Por que, em vez de ficar deliciosamente com a Maria, eu saio de casa todos os dias para fazer o que faço?
E, embora seja assunto da moda, como a ideia, claro, não é fazer minha autobiografia autorizada, estendo a reflexão.
Fazer publicidade é só um trabalho – e não tem nada de errado nisso – ou é algo mais para você?
Claro, não estou aqui querendo dar uma relevância maior, mais nobre, nobelística ao que fazemos. Pelo contrário. Mas fazer publicidade pode ser algo mais do que um meio pagador de contas? Ou é apenas mais um negócio?
A verdade é que historicamente empresas e pessoas que possuem um propósito no que fazem são mais bem-sucedidas. As empresas comparativamente alcançam, no longo prazo, um valor maior de mercado e as pessoas são as que invariavelmente se destacam no que fazem. E essa conversa, por mais que pareça retórica e filosófica, é prática.
Qual o seu propósito? Qual a sua marca? Se o quanto você custa e o que você entrega fosse commoditie, por que se contrataria você?
E qual o propósito do lugar onde você trabalha? Por que ele existe? Se, por exemplo, ele oferecesse o mesmo desafio e exatamente o mesmo salário que todos os concorrentes, por que você trabalharia lá?
Outro dia estive no Grupo de Atendimento e conversamos um pouco sobre isso. Primeiro, por que se resolve ser publicitário? E depois, por que se resolve ser atendimento? Enfim, por que não ganhar dinheiro fazendo outra coisa?
Um dos grandes desafios de qualquer empresa, em qualquer segmento, é atrair e reter talentos. E o dito turn-over, cada vez mais, não é motivado somente pela questão financeira. Ela é o grande motivo para sair, mas por que não se encontra outro motivo tão importante quanto para ficar. E não adianta se lamentar, reclamar da falta de fidelidade, lembrar de todas as oportunidades que se deu. A questão é de propósito, de cultura e não de RH.
E falando nisso, sim, claro, nosso mercado também precisa de gente bem formada e com currículo extenso, como qualquer outro. Mas, diferente de quase todos, ele é essencialmente capital humano e para se manter competitivo precisa de algo mais. Precisa, por exemplo, de gente que de fato ame o que faz e com propósito de fazer algo maior, mais relevante.
Aqui, ainda acho que só resgatando a paixão pela publicidade, conseguiremos resgatar a capacidade de fazer trabalhos tão memoráveis quanto os de uma geração que se foi ou que está indo, de um jeito ou de outro.
Digo isso, porque o tempo passa e a commoditização, cada vez mais morna e consistente, continua nos rondando e nos distraíndo, fantasiada de um copo sempre meio vazio e de uma DR incessante sobre processo, pesquisa, mesa de compras, anunciante que não aprova, agência que não cria e vice-versa, etc.
Por que você sai de casa todos os dias para fazer o que você faz?
Quando eu penso no que me levou a escolher essa profissão, para ser sincero, não lembro de nada emocionante – foi quase gravitacional.
Eu achava que me divertiria fazendo propaganda. E que tudo o que eu mais gostava de fazer no meu tempo livre acabaria me tornando um profissional melhor. Que essa profissão seria a melhor possibilidade de eu não precisar ser um cara na pessoa jurídica diferente do da pessoa física.
E, quer saber, ainda acho isso.
Hoje sou movido pela possibilidade que temos de, ao nosso jeito, fazer história, mudar comportamento, construir valor do zero e aumentar valor onde não se imaginava ser possível.
Mas, fundamentalmente, lá no fundo, em vez de ficar com a Maria, eu saio de casa todos os dias para fazer publicidade porque isso me diverte. Me faz feliz.
E, nos últimos dez meses, tenho aprendido com a Maria, e seu sorriso semibanguela, que não dá para levar tudo tão a sério.
Aliás, quando a gente faz isso talvez a gente esteja tirando o verdadeiro propósito da publicidade e que vai ao encontro do que as pessoas mais pedem pra gente: me divirta.
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